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VGNJUR Segunda-feira, 04 de Novembro de 2024, 09:01 - A | A

Segunda-feira, 04 de Novembro de 2024, 09h:01 - A | A

resolução

Governo Lula pede que Supremo anule lei do marco temporal

Governo argumenta que STF já afirmou que a tese é incompatível com proteção constitucional aos indígenas

Lucione Nazareth/VGNJur

O Ministério dos Povos Indígenas publicou nesta segunda-feira (04.11) resolução solicitando que o Supremo Tribunal Federal (STF) declare imediatamente a inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023 – que estabelece marco temporal para terras indígenas. No pedido, é citada uma decisão de 2023 do próprio Supremo que considerou a medida inconstitucional.

O processo citado pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é do ano de 2016, quando o Governo de Santa Catarina entrou com recurso no STF solicitando a reintegração de posse de uma parte da Reserva Biológica do Sassafrás, declarada pela Funai como de tradicional ocupação indígena. O argumento utilizado foi o marco temporal, apontando que os indígenas não ocupavam aquela área em outubro de 1988.

A análise do processo foi concluída em setembro de 2023, quando os ministros negaram o recurso e derrubaram a tese do marco temporal. Segundo o STF, a data da promulgação da Constituição não poderia ser usada como critério de demarcação, e sim a comprovação da ocupação tradicional de determinada área. Conforme a decisão, esse deveria ser o parâmetro para o julgamento de 226 casos semelhantes, que estavam suspensos à espera dessa definição, e de todos os demais pedidos de demarcação que venham a ser feitos.

Em maio de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou projeto de lei que instituiu o marco temporal. Em setembro, esse projeto foi aprovado pelo Senado e enviado para sanção presidencial. O projeto foi sancionado e transformado na Lei 14.701, mas sem o marco temporal, que foi vetado por Lula, alegando que a norma “usurpa direitos originários”, além de ferir decisão do Supremo Tribunal Federal, tomada pouco antes.

Em dezembro de 2023, o Congresso Nacional derrubou o veto presidencial, incluindo a regra na Lei 1.4701.

Leia Mais - Marco Temporal das Terras Indígenas é promulgada

Em abril de 2024, o STF determinou a suspensão, em todo o país, dos processos judiciais que discutem a constitucionalidade da Lei do Marco Temporal até que o tribunal se manifeste definitivamente sobre o tema.

Outras Recomendações

O Ministério dos Povos Indígenas recomendou ainda a continuidade da demarcação para a devida regularização das terras indígenas que estão sem empecilho jurídico; adotar maior comprometimento com a defesa intransigente do direito territorial originário dos povos indígenas no âmbito dos poderes legislativo e judiciário; e instituir uma política específica, estruturante e permanente de fiscalização, proteção e segurança para os povos e territórios indígenas.

RESOLUÇÃO CNPI Nº 1, DE 25 DE OUTUBRO DE 2024

Dispõe sobre as violências cometidas contra povos indígenas, e dá outras providências.

A PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA INDIGENISTA - CNPI, no uso das atribuições que lhe foram conferidas no inciso II e XI do art. 2º do Decreto Nº 11.509, de 28 de abril de 2023, do Presidente da República, que o instituiu no âmbito do Ministério dos Povos Indígenas, relacionadas ao acompanhamento da implementação das políticas públicas destinadas aos povos indígenas, bem como ao monitoramento e encaminhamento aos órgãos competentes de denúncias de ameaça ou violação dos direitos de comunidades ou povos indígenas, incluindo a recomendação de medidas cabíveis, resolve;

Considerando, a gravidade do crescente e generalizado cenário de violações aos direitos fundamentais dos povos indígenas em distintos âmbitos dos poderes do Estado, e nos próprios territórios indígenas, sob a égide de setores vinculados a empreendimentos econômicos agropecuários, minerários e madeireiros, entre outros, aos quais somam-se organizações criminosas envolvidas com a grilagem de terras, o garimpo, a pesca ilegal e outros ilícitos;

Considerando, que a tese do marco temporal, desde a discussão e apresentação do então Projeto de Lei nº 490/2007, posteriormente convertido na Lei 14.701/2023, vem sendo utilizada por empresários e associações do agronegócio, como na iniciativa denominada "Invasão Zero", como justificativa para agirem com extrema violência, em verdadeiras operações de guerra e reais organizações paramilitares, à margem e em contraposição e afronta ao Estado Democrático de Direito. Utilizando para isso, impunemente, armas letais contra povos e comunidades indígenas que resistem em áreas de retomadas e/ou na proteção de seus territórios de ocupação tradicional, como tem acontecido recentemente no extremo sul da Bahia contra o povo Pataxó e Pataxó Hã-Hã-Hãe e, nos últimos dias, contra o povo Guarani Kaiowá em Mato Grosso do Sul e o Povo Avá Guarani no oeste do Paraná, e em outros estados da Federação como Rio Grande do Sul, Rondônia, Pará e Maranhão;

Considerando, que a não ratificação da declaração de inconstitucionalidade da tese do marco temporal contida na Lei nº 14.701/2023 e a persistência da bancada ruralista na tentativa de aprovar a PEC 48/2023, pioram ainda mais o cenário de violências aqui apontado, com dimensões inadmissíveis de genocídio;

Considerando, que os direitos fundamentais dos povos indígenas constituem cláusulas pétreas e que as terras que ocupam tradicionalmente são inalienáveis e indisponíveis, tal como os direitos sobre elas existentes, imprescritíveis;

Considerando, que a insegurança jurídica, social e a crescente violência contra os povos e comunidades indígenas decorre, na maioria dos casos, da não demarcação e devida proteção das terras e territórios indígenas;

Considerando, a situação de crescente criminalização, prisão arbitrária e assassinatos de lideranças de povos indígenas em função da luta por suas terras e territórios tradicionais e a impunidade dos seus assassinos;

Art. 1º Recomendar ao Ministério dos Povos Indígenas, à Fundação Nacional dos Povos Indígenas e, sobretudo, ao Ministério da Justiça e Segurança Pública que adotem medidas emergenciais para conter, desarmar e desmobilizar agrupações de fazendeiros e agromilicianos que atentam contra o Estado de Direito e a vida de povos, comunidades e lideranças indígenas, sobretudo do povo Guarani Kaiowá no Mato Grosso do Sul e contra comunidades do povo Avá Guarani no Paraná, bem como em todos os estados da Federação. E que a Força Nacional exerça efetivamente o seu papel de garantir a segurança das comunidades alvo dos ilegais ataques de fazendeiros e seus agrupamentos armados.

Art. 2º Recomendar ao Governo Federal:

I- prosseguir com a demarcação para a devida regularização das terras indígenas que estão sem empecilho jurídico;

II- adotar maior comprometimento com a defesa intransigente do direito territorial originário dos povos indígenas no âmbito dos poderes legislativo e judiciário, e;

III- instituir uma política específica, estruturante e permanente de fiscalização, proteção e segurança para os povos e territórios indígenas.

Art. 3º Recomendar ao Supremo Tribunal Federal que declare imediatamente a inconstitucionalidade da Lei 14.701/2023 com base na Constituição Federal e em sua própria decisão tomada em setembro de 2023 por ocasião do julgamento do RE 1.017.365 (Tema 1031) com caráter de Repercussão Geral.

Art. 4 º Recomendar aos Parlamentares brasileiros, Deputados Federais e Senadores da República, que paralisem o ataque aos direitos sagrados e constitucionais dos Povos Indígenas do Brasil e avancem na aprovação de proposições legislativas que contribuam para a efetivação dos direitos fundamentais desses povos.

Art. 5º Recomendar ao Poder Judiciário brasileiro que se abstenha de aprisionar e condenar lideranças indígenas em função da luta de seus povos por seus direitos coletivos e avance na responsabilização criminal dos assassinos de lideranças indígenas no Brasil.

Art. 6º Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação.

SONIA GUAJAJARA

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