O Ministério Público do Estado de Mato Grosso (MPMT) é o órgão que atua em representação aos interesses da sociedade, exercendo a função de defender o regime democrático, a ordem jurídica e os interesses individuais indisponíveis, buscando a justiça social e o pleno exercício da cidadania no Estado.
Em entrevista exclusiva ao , o procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, Deosdete Cruz, destacou a atuação do Ministério Público do Estado em duas frentes: na missão constitucional e na administração pública para viabilizar sua missão. Um dos focos cruciais é o combate ao desmatamento ilegal, um problema grave no Estado.
Mato Grosso, com mais de 53% do território no bioma Amazônico, enfrenta desafios significativos na proteção ambiental. O MP investiga mais de 750 mil hectares de desmatamento ilegal, o que equivale a mais de 750 campos de futebol, com mais de 3.500 investigações em andamento nos últimos anos.
O MPMT está intensificando seus esforços para responsabilizar civil e penalmente aqueles envolvidos em crimes ambientais, incluindo o desmatamento em áreas não autorizadas. Para combater o crime organizado na área ambiental, o Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (GAECO) foi fortalecido. O GAECO trabalha para identificar financiadores e facilitadores de grandes ilícitos ambientais e desvendou fraudes na autorização de desmatamentos em até 35% do imóvel.
Conforme o procurador, os crimes ambientais que envolvem desmatamento ilegal e degradação ambiental movimentam cifras bilionárias no Estado. Segundo ele, o MP de Mato Grosso está empenhado em proteger o meio ambiente e promover a responsabilização daqueles que desrespeitam a lei ambiental, contribuindo para a preservação da Amazônia e a justiça social no Estado.
Confira a entrevista na integra
1.Como o Ministério Público de Mato Grosso tem trabalhado para garantir a transparência e a prestação de contas à população?
Deosdete Cruz: O Ministério Público atua de dois modos como instituição, uma na atividade fim, que é a missão do Ministério Público e está relacionada à defesa dos direitos sociais, individuais indisponíveis, da ordem jurídica e do regime democrático, por exemplo, com a atuação do órgão na realização de acordos; propositura de ações judiciais a atuação como fiscal da lei. Por outro lado, o Ministério Público desempenha atividades de administração pública para viabilizar o exercício de sua missão constitucional. É o que denominamos de atividade meio. No primeiro caso a transparência ocorre através da publicidade dos atos, do planejamento estratégico construído com a participação da população, e dos mecanismos internos e externos de controle da atividade do promotor de justiça. Por exemplo o indeferimento de instauração de inquérito civil que ocorre quando o MP se recusa a acatar uma representação, ou a promoção de arquivamento do inquérito civil serão submetidas à revisão do CSMP. Da mesma forma o arquivamento de um inquérito policial que se submete ao controle judicial e da chefia institucional. Em relação às ações propostas pelo MP serão sempre controladas pelo Poder Judiciário, sendo a regra que esses processos não sejam sigilosos. Em relação aos acordos não é diferente, cabendo ao CSMP a análise dos acordos que resultam em término do IC, e ao judiciário a homologação quando já existe ação em curso. Na atividade meio o MP se sujeita ao controle como todo e qualquer órgão da ADM Pública, pelo TCE e com o controle adicional realizado pelo CNMP.
2. Quais são os principais desafios enfrentados pelo MPMT na promoção da justiça e do combate à corrupção?
Deosdete Cruz: São vários os desafios, mas seguramente o maior entrave é a demora na detecção do ilícito, pois quanto maior for a demora, menores as chances de reversão do dano ao erário e mesmo da adequada responsabilização dos envolvidos. Por isso, é essencial que se some ao trabalho de controle do MP e do TCE o controle social, que é a participação da população através de denúncias e da fiscalização do uso do dinheiro público. Para isso é essencial o engajamento da população para conhecer e participar dos atos da vida pública, não deixando para exercer a cidadania apenas no período das eleições.
3. Como o MPMT tem lidado com casos de corrupção e irregularidades no estado, e quais resultados têm sido obtidos
Deosdete Cruz: Os casos de corrupção e irregularidades no estado são confiados à atribuição dos promotores de justiça da mesma forma que os fatos envolvendo os entes municipais, a única diferença de atribuição é que se houver necessidade de investigação do governador do Estado na esfera cível, a atribuição será do PGJ e não dos promotores. Temos investigações em andamento sobre situações envolvendo o estado, algumas correm em sigilo. Apenas para ilustrar com um caso recente, o GAECO acaba de deflagrar uma operação visando combater corrupção no âmbito da SEMA-MT.
4. Quais são as estratégias adotadas pelo MPMT para fortalecer a proteção dos direitos humanos e garantir a igualdade de acesso à justiça?
Deosdete Cruz: O MPMT atua de maneira difusa através de seus 267 membros que possuem independência funcional e um regime de garantias que lhes permite a defesa e proteção dos direitos humanos através da atuação preventiva e repressiva. O acesso à justiça através do MP se dá quando o órgão ingressa com ações judiciais em defesa dos interesses difusos, coletivos ou individuais homogêneos e individuais indisponíveis. Toda vez que o MP atua em juízo age em nome de terceiros, ampliando o acesso da população à justiça sobretudo através de ações civis públicas, mas o faz também através de ações individuais em proteção da pessoa idosa, das pessoas com deficiência, e das crianças e adolescentes.
5. De que forma o Ministério Público tem colaborado com outros órgãos e entidades para enfrentar questões complexas, como crimes ambientais e tráfico de drogas?
Deosdete Cruz: O MPMT atua em plena colaboração com outros órgãos policiais e de fiscalização, pois sendo o destinatário da investigação caberá ao MP propor as ações de responsabilização. Então é comum e rotineiro o trabalho com a SEMA e com as instituições policiais para a repressão aos crimes ambientais e de tráfico, respectivamente. O GAECO e o CIRA são grandes exemplos de atuação conjunta das instituições.
6. Como o MPMT tem atuado para promover a efetivação da Lei de Acesso à Informação e garantir a transparência nos órgãos públicos?
Deosdete Cruz: Além de darmos o exemplo e disponibilizarmos em nosso site as informações do próprio MPMT, nossos membros tem o dever de cobrar das respectivas administrações públicas perante as quais atuem o dever de cumprirem a lei de acesso à informação.
7. Quais são os planos do Ministério Público para aprimorar a prevenção e o combate à violência doméstica e familiar no estado?
Deosdete Cruz: Estamos vivenciando índices muito graves de violência doméstica e familiar, sobretudo contra as mulheres, por isso o MPMT apoia campanhas dos membros que trabalhem a prevenção e repressão a estes graves crimes, e também atuamos de forma prioritária na estruturação para darmos conta dos milhares de inquéritos acerca de crimes desta espécie. A título de exemplo, no início de nossa gestão instalamos mais uma promotoria de violência doméstica na capital e desde o ano passado já são duas promotorias de violência doméstica, em Várzea Grande.
8. O MPMT tem adotado medidas para promover a participação da sociedade na definição de prioridades e estratégias de atuação? Quais são essas medidas?
Deosdete Cruz: Uma vez que o MP tem por missão precípua a defesa dos interesses sociais é fundamental que a sociedade seja ouvida para que suas maiores necessidades sejam captadas e permitam uma atuação qualificada visando principalmente o aprimoramento de políticas públicas fundamentais. Assim, na construção do novo plano estratégico 2024-2031 foi dada voz a sociedade, por meio de escuta social externa, sendo disponibilizado questionário dirigido a toda população e que coletou mais de 5 mil respostas distribuídas na quase totalidade dos municípios mato-grossenses e que contribuíram e direcionaram, a priorização da atuação nas áreas especializadas: cidadania, Infância e adolescência, criminal, meio ambiente e patrimônio público. Além dessa espontânea no site, soma-se também a escuta qualificada realizada pelos membros através de diversos instrumentos: escuta social, audiência pública, reunião virtual, presencial.
9. Quais são as ações do MPMT para assegurar que os recursos públicos sejam utilizados de forma adequada e transparente?
Deosdete Cruz: o MP é órgão de controle, cabendo-lhe a análise da legalidade sobre o uso dos recursos públicos. A escolha sobre a alocação dos recursos é uma atividade política e administrativa, orientada por critérios de conveniência e oportunidade dos gestores públicos que foram eleitos, por isso, via de regra não cabe ao MP se insurgir quanto às escolhas dos gestores, mas apenas combate-las se forem ilícitas.
10. Quais são os esforços do MPMT para garantir a proteção do meio ambiente e combater o desmatamento ilegal e outras atividades prejudiciais?
Deosdete Cruz: No estado de Mato Grosso existe uma articulação interinstitucional, criada a partir de uma proposta do MPMT e prontamente acatada pelo Governador Mauro Mendes, para realização de ações articuladas, entre todos os órgãos com alguma forma de atribuição na defesa do meio ambiente. Trata-se do CEDIF (Comitê Estratégico para o Combate ao Desmatamento Ilegal, a Exploração Florestal Ilegal e aos Incêndios Florestais). Neste ambiente democrático, formado por instituições públicas, o MPMT participa do planejamento de todas as ações ambientais realizadas pela SEMA, Polícias Militar, Ambiental e Judiciária Civil, IBAMA, Corpo de Bombeiros e MPF, dentre outros.
O MPMT fortaleceu nos últimos anos estruturas internas para promover a responsabilização civil e penal pela prática de ilícitos envolvendo desmatamentos em áreas não autorizadas. Assim, temos uma equipe própria que cruza de forma automatizada os polígonos de desmatamentos identificados pelo INPE com as bases de dados oficiais da SEMA e IBAMA. Com isso identificamos, por imagens de satélites, em quais propriedades ocorreram os desmatamentos, nome do proprietário, área desmatada, se já houve atuação da SEMA ou IBAMA, se o desmatamento ocorreu em área ambientalmente protegida, como Reservas Legais ou Áreas de Preservação Permanente etc. Também temos em nossas bases de dados as áreas de manejo florestal, áreas autorizadas para desmatamentos ou outras formas de exploração, áreas com autorização para queima controlada etc. Com o cruzamento de todos os dados temos segurança para responsabilizar somente os casos de desmatamentos e queimadas rurais em locais não autorizados. Estamos investigando mais de 750 mil hectares de desmatamentos ilegais (que corresponde a uma área superior a 750 campos de futebol). São mais de 3.500 investigações abertas no MPMT nos últimos anos.
Combate ao crime organizado na área ambiental: Nos últimos anos houve o fortalecimento do GAECO, em especial para atuação contra o crime organizado ambiental, buscando encontrar quem financia e quem facilita de dentro do órgão ambiental que os grandes ilícitos continuem a ocorrer. São fraudes nos planos de manejo, no Cadastro Ambiental Rural, nos laudos de tipologia florestal que são objeto de investigações. Para se ter uma ideia, na região de floresta amazônica, que inclui mais de 53% do território de Mato Grosso, a área destinada a reserva legal, que não pode ser desmatada, é de 80%. Com a fraude na tipologia os criminosos conseguiam autoriza na SEMA desmatamentos em 35% do imóvel. A estrutura do GAECO conseguiu identificar esses casos de crimes ambientais e promove a responsabilização. Para se ter uma ideia, nos últimos dois ou três anos, foram ajuizadas mais de 20 ações penais contra organizações criminosas que atuam nos crimes ambientais, promovendo desmatamentos e outras formas de degradação de forma ilegal. Esses crimes movimentam cifras bilionárias, sendo até agora contabilizados mais de 3 bilhões de reais. Importante ressaltar que a SEMA tem auxiliado profundamente nas investigações criminais e na responsabilização.
Estamos em fase de mutirão de conciliação ambiental, sendo destacado um Promotor de Justiça com equipe para participar, com a Polícia Judiciária Civil e SEMA de tentativa de conciliação em mais de 3 mil procedimentos de autuações administrativa. O objetivo é trazer para a legalidade quem praticou ilícito ambiental, promovendo a recuperação das degradações e pagamento das multas. Estimulam-se os acordos com a concessão de descontos que podem chegar até 60% do valor da multa, desde que o aceite do acordo seja imediato. Com isso, um procedimento administrativo ou inquérito civil que poderia levar anos para ser finalizado, pode ser resolvido em poucos meses.
11.De que forma o Ministério Público tem trabalhado para coibir práticas de nepotismo e garantir a integridade da administração pública?
Deosdete Cruz: Prevê a Lei de improbidade administrativa, através do artigo 11, XI, que a prática do nepotismo sujeita o responsável às sanções da referida lei, e deste modo o MP atua sobretudo através do recebimento de denúncias ou quando toma conhecimento sobre situações que caracterizam hipótese de nepotismo.
12.Como o Ministério Público tem acompanhado a implementação da Lei Anticorrupção e buscado responsabilizar empresas envolvidas em atos ilícitos?
Deosdete Cruz: As promotorias de justiça do patrimônio público tem adotado medidas para implementação da referida lei, muitos inclusive cumulam os pedidos da Lei de Improbidade Administrativa com a Lei Anticorrupção.
13. Como o Ministério Público tem garantido a independência e imparcialidade de sua atuação, evitando interferências políticas indevidas?
Deosdete Cruz: Os membros do MP possuem independência funcional e possuem as garantias da inamovibilidade e da vitaliciedade para que não sofram interferência política indevida, de forma que na sua atuação final o membro do MP não tem chefe ou superior hierárquico, devendo atuar segundo as leis, a constituição e sua convicção sobre os fatos.
14.Quais são os principais objetivos e metas do MPMT para os próximos anos, visando a melhoria contínua da atuação em prol da justiça e da sociedade?
Deosdete Cruz: Ampliarmos o acesso da população aos nossos serviços, com a disponibilização de acesso virtual nos municípios que não são sede de promotorias de justiça; ampliarmos o uso dos métodos autocompositivos, substituindo-se sempre que possível as ações judiciais por acordos extrajudiciais ou transações nos autos dos processos; ampliação do combate às organizações criminosas com o fortalecimento do GAECO.
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