15 de Março de 2025
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Entrevista da Semana Sábado, 15 de Março de 2025, 15:00 - A | A

Sábado, 15 de Março de 2025, 15h:00 - A | A

entrevista da semana

Advogado denuncia tratamento desumano para pacientes psiquiátricos na PCE: "Inércia e descaso"

O Hospital Adauto Botelho é a única unidade pública especializada em saúde mental no Estado

Gislaine Morais/VGN

A precariedade da assistência psiquiátrica no sistema prisional de Mato Grosso tem mantido detentos diagnosticados com transtornos mentais graves em situação de abandono. Um dos casos mais recentes é o de J.P.L.S., 25 anos, preso desde dezembro de 2024 após um surto psicótico que resultou em um esfaqueamento em Várzea Grande. Apesar de ter sido diagnosticado com esquizofrenia e possuir determinação judicial para internação hospitalar imediata, ele segue na triagem da Penitenciária Central do Estado (PCE) há três meses, sem o devido tratamento psiquiátrico.

A situação de J.P.L.S. não é isolada. O Hospital Adauto Botelho, única unidade pública especializada em saúde mental no Estado, possui uma capacidade limitada de leitos e não consegue absorver a demanda de internos que necessitam de tratamento adequado. Com isso, presos com transtornos psiquiátricos seguem em unidades prisionais sem estrutura para atendimento, agravando ainda mais seus quadros clínicos.

Em entrevista ao , o advogado Haran Quintiliano, que representa J.P.L.S., expõe a gravidade do caso, as medidas legais adotadas para garantir a internação do cliente e a realidade enfrentada por dezenas de outros presos que aguardam atendimento especializado enquanto permanecem encarcerados.

Confira entrevista na íntegra:

VGN - Há quanto tempo J.P.L.S. está na triagem sem atendimento adequado?

Haran Quintiliano - J.P.L.S. está na triagem da Penitenciária Central do Estado (PCE) desde o dia 19 de dezembro de 2024, sem acesso ao tratamento psiquiátrico adequado e em total descumprimento da ordem judicial que determinou sua internação imediata.

A decisão do juiz foi clara: a medida de segurança e a internação hospitalar deveriam ser cumpridas de imediato, sem qualquer prazo para a efetivação. No entanto, o Estado segue ignorando essa determinação, deixando J. preso em uma unidade sem estrutura para atender sua condição.

VGN - Quais são as condições em que ele se encontra atualmente? Ele está em cela separada ou com outros detentos?

Haran Quintiliano - J.P está na triagem da PCE, um ambiente inadequado e insalubre para qualquer detento, ainda mais para alguém com um quadro psiquiátrico grave. A PCE não possui psiquiatra e conta com apenas dois psicólogos para atender toda a população carcerária, composta por milhares de presos.

Além disso, ele não pode receber visitas, está sem apoio familiar e sem qualquer contato social desde que foi preso, o que agrava ainda mais seu quadro clínico. Manter uma pessoa com transtorno mental grave nessas condições é desumano e ilegal.

VGN - Vocês mencionaram que ele está sem medicações. Qual era o tratamento recomendado para ele e quais as consequências dessa interrupção?

Haran Quintiliano - J. foi diagnosticado com esquizofrenia e transtornos psiquiátricos severos. O laudo pericial oficial determinou que ele necessita de medicação contínua e tratamento especializado em ambiente hospitalar.

Sem acesso à medicação adequada e ao acompanhamento médico, o quadro clínico de J.P. está se deteriorando rapidamente, aumentando os riscos de surtos psicóticos, autoagressão e comprometimento irreversível de sua saúde mental.

A decisão judicial determinou a internação imediata exatamente para evitar esse agravamento, mas o Estado simplesmente ignora a gravidade da situação.

VGN - A defesa já fez algum pedido formal à Secretaria de Segurança Pública (SESP) e à Secretaria de Saúde (SES) para o cumprimento da ordem judicial? Se sim, houve alguma resposta?

Haran Quintiliano - Sim, diversos ofícios e pedidos formais foram encaminhados à SESP e à SES, além de um chamado à Ouvidoria do Estado. No entanto, as respostas foram evasivas ou inexistentes, demonstrando total inércia e descaso com o cumprimento da ordem judicial.

O próprio gabinete do juiz já oficiou as autoridades estaduais exigindo providências, e mesmo assim o Estado segue descumprindo deliberadamente a determinação.

VGN - Além de J.P.L.S., há outros casos semelhantes no Estado de Mato Grosso? Quantas pessoas hoje aguardam internação em hospital psiquiátrico enquanto permanecem presas?

Haran Quintiliano - A situação de J. não é um caso isolado. O Estado de Mato Grosso tem um grave déficit de leitos psiquiátricos, deixando muitas pessoas com transtornos mentais presas ilegalmente em unidades prisionais sem qualquer estrutura para atendimento adequado.

O Hospital Adauto Botelho, única unidade psiquiátrica pública do Estado, tem apenas 10 leitos masculinos e 2 femininos para atender toda a demanda estadual, o que torna a fila de espera imensa. Isso cria um cenário de abandono e perpetua um sistema que descumpre direitos fundamentais.

VGN - Sobre a estrutura do Hospital Adauto Botelho, quais são as principais dificuldades enfrentadas para receber esses internos? Há alguma outra unidade no Estado que poderia receber pacientes psiquiátricos em privação de liberdade?

Haran Quintiliano - O Hospital Adauto Botelho está completamente sobrecarregado e não tem estrutura suficiente para atender a demanda de pacientes com transtornos psiquiátricos que precisam de internação.

Além disso, o Estado não apresentou qualquer alternativa viável para cumprir a ordem judicial e internar J.P. em um local adequado, apesar da existência de estabelecimentos privados que poderiam prestar o atendimento necessário, mas para os quais o Estado se recusa a custear a internação.

Isso reforça a negligência do governo estadual, que, em vez de cumprir a decisão e buscar uma solução para o caso, simplesmente ignora a determinação da Justiça.

VGN - Caso a ordem de internação não seja cumprida, quais medidas legais a defesa pretende tomar contra o Estado? Existe possibilidade de uma ação por descumprimento de ordem judicial?

Haran Quintiliano - Sim, a defesa já está adotando todas as medidas cabíveis para responsabilizar o Estado pelo descumprimento da ordem judicial. Entre as providências estão:

Ação de execução da decisão judicial, com pedido de multa diária contra o Estado pelo descumprimento da ordem de internação;
Denúncia ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre o estado inconstitucional de coisas no sistema prisional e psiquiátrico de Mato Grosso.

Representação por crime de desobediência contra os responsáveis pela Secretaria de Saúde e Segurança Pública, por descumprimento deliberado de decisão judicial.

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