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Entrevista da Semana Sábado, 29 de Março de 2025, 15:30 - A | A

Sábado, 29 de Março de 2025, 15h:30 - A | A

PL DO VENENO

Aprovação do PL coloca o Estado em rota contrária às tendências globais, alerta pesquisadora

Medida pode aumentar a exposição a agrotóxicos e metais pesados, contrariando movimentos internacionais

Arielly Barth/VGN

A professora Dra. Márcia Montanari, nutricionista e sanitarista, que atua como docente no curso de Saúde Coletiva da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e como pesquisadora do Núcleo de Estudos em Ambiente, Saúde e Trabalho (NEAST) e do Grupo Temático Saúde e Ambiente da ABRASCO, destaca que a aprovação do Projeto de Lei nº 1.833/2023, pela Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT), no último dia 19, traz riscos à saúde e ao meio ambiente.

O referido projeto propõe alterações na Lei nº 8.588/2006, que regula o uso de agrotóxicos no estado de Mato Grosso, passando também a denominar esses produtos como “defensivos agrícolas”. O texto estabelece distâncias mínimas para a aplicação desses produtos, variando conforme o tamanho das propriedades rurais: para médias propriedades, a distância mínima é de 25 metros; para pequenas propriedades (até quatro módulos fiscais), a aplicação é permitida sem restrição de distância; e, para grandes propriedades (acima de 15 módulos fiscais), a distância mínima é de 90 metros em relação a áreas protegidas, como cidades, mananciais e nascentes.

VGN - O Projeto de Lei nº 1.833/2023 pode representar um retrocesso para a promoção da saúde ambiental no Brasil, especialmente no que se refere ao impacto dos agrotóxicos e metais pesados.

Dra. Márcia Montanari - Acredito que isso abre precedentes, sabe? Pode levar outros estados a também reavaliarem suas legislações e, possivelmente, reduzirem ainda mais as áreas de restrição para pulverização terrestre. Isso representa um risco significativo.

VGN -Quais são os possíveis impactos para a saúde e o meio ambiente em Mato Grosso com a aprovação do PL 1.833/2023, especialmente para as populações rurais e para a qualidade das águas?

Dra. Márcia Montanari - Esse projeto representa riscos à saúde e ao meio ambiente, pois, além de ampliar o volume de agrotóxicos potencialmente aplicados no estado, também aumenta a exposição das populações — principalmente das que vivem em áreas rurais — incluindo os trabalhadores e as trabalhadoras do campo. Há, ainda, o agravante da contaminação das águas, o que pode ampliar significativamente a exposição a agrotóxicos e metais pesados. Como consequência, pode haver um aumento nos casos de adoecimentos agudos e crônicos, sobretudo entre as populações rurais.

VGN - Essa aprovação coloca o Estado em desacordo com as tendências globais de redução no uso desses produtos. Qual é a sua avaliação sobre esse movimento, considerando os impactos para a saúde pública e o meio ambiente?

Dra. Márcia Montanari - Consideramos que essa medida está em desacordo tanto com a legislação federal quanto com as tendências globais de redução no uso de agrotóxicos. Diversos países estão atualmente revisando suas legislações, discutindo limites máximos de resíduos permitidos em alimentos e em recursos hídricos. A própria indústria química tem investido em pesquisas voltadas ao desenvolvimento de novas moléculas, com o objetivo de substituir aquelas atualmente utilizadas no mercado. Ou seja, o cenário global aponta para uma transição: há um fortalecimento do debate sobre modelos de produção orgânicos e agroecológicos.

VGN - Como as pesquisas sobre contaminação por agrotóxicos e metais pesados em Mato Grosso podem contribuir para a compreensão dos riscos associados à implementação do Projeto de Lei nº 1.833/2023?

Dra. Márcia Montanari -Já existem diversas evidências indicando que, no Estado de Mato Grosso, os índices de aborto, malformações fetais e câncer infantojuvenil são superiores às médias nacionais. Estudos apontam que a tendência de adoecimento em regiões com forte presença do agronegócio é mais acentuada em determinados municípios.

Em termos de exposição per capita, estimativas indicam que cada habitante de Mato Grosso está potencialmente exposto a cerca de 60 litros de agrotóxicos por ano, considerando o total de produtos comercializados e utilizados no estado. Há também evidências consistentes de contaminação de diversos meios e produtos: água potável (de rios, poços artesianos e chuva), alimentos de origem vegetal, commodities agrícolas, carnes, peixes e até leite materno.

VGN - Como poderia se configurar uma resistência eficaz contra projetos como o PL nº 1.833/2023? De que maneira a sociedade pode se organizar para enfrentar essa questão de forma coordenada?

Dra. Márcia Montanari - É fundamental que fiquem evidentes os riscos à saúde, ao meio ambiente e também os impactos econômicos associados. A aprovação desse tipo de projeto não implica, necessariamente, em aumento da produção ou em benefícios econômicos para as comunidades afetadas. Pelo contrário, há possibilidade concreta de agravamento de problemas sociais, ambientais e sanitários.

Considero essencial a construção de uma estratégia de comunicação eficaz sobre esses riscos, que permita um debate amplo e qualificado, com perspectiva global. É necessário refletir sobre como alcançar uma legislação que esteja em conformidade com o princípio da precaução, que respeite os cuidados sanitários e ambientais, e que esteja alinhada com os dispositivos da legislação ambiental federal.

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