O procurador-geral da República (PGR), Augusto Aras, manifestou contrário ao pedido liminar da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) e outras entidades de saúde coletiva, que pedem junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) para suspender a cartilha do Ministério da Saúde que define todo aborto como ilegal no Brasil.
As entidades entraram com Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo alegando que a cartilha do Ministério da Saúde, publicada no último dia 15 de junho, com base em suposto critério metodológico científico, estabelece que o procedimento de abortamento só poderá ser realizado até a 22ª semana gestacional e, após isso, deve-se realizar parto prematuro, afirmando que não cabe amparo legal de abortamento “do produto concepção nos casos de violência sexual”.
Na ação, as entidades pedem a concessão de liminar para impedir que órgãos públicos restrinjam a realização de aborto nos casos previstos nas leis brasileiras, com base em qualquer critério de idade gestacional ou norma administrativa com parâmetros não previstos na legislação. No mérito, pede a declaração de inconstitucionalidade de qualquer ação ou omissão do Estado que implique em barreiras para o aborto legal.
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Em seu parecer, Augusto Aras afirmou que a ação envolve questão constitucional relevante, que demanda atenção especial do Judiciário: “tem-se, no ponto, discussão da máxima relevância social, envolvendo, de um lado, a proteção e o direito de meninas e mulheres vítimas de violência sexual e, de outro, o feto como sujeito de direitos. Entram no debate, aqui, os direitos à vida, à saúde e à dignidade humana, entrelaçando-se questões dos campos jurídico e médico”.
Porém, o procurador-geral apontou que o pedido é “excessivamente genérico”, pois questiona de forma ampla ação e omissão do Estado, sem pontuar ato específico. Ainda segundo ele, uma eventual decisão do STF sobre o tema, demandaria a coleta de provas, medida incompatível com a via da ADPF, e a abertura de diálogo com os agentes e órgãos públicos da área de saúde, providência que não se coaduna com o exame superficial (perfunctória) das medidas cautelares.
“Não há indicação de ato específico do poder público alegadamente lesivo a preceitos fundamentais, o que inviabiliza ou, ao menos, dificulta o exame de validade constitucional pretendido, muito especialmente em sede de medida cautelar”, diz trecho extraído do parecer.
Em relação à nota técnica do Ministério da Saúde que trata da idade gestacional máxima para a realização do aborto em casos de estupro, Aras disse que a análise de constitucionalidade do ato precisaria abranger todo o complexo normativo que sustenta a norma, sob pena de eventual declaração de inconstitucionalidade da Suprema Corte não ter efetividade prática.
"Fica claro que a invalidação do ato atual do Ministério da Saúde não terá o efeito pretendido pelas requerentes, porquanto subsistiriam no mundo jurídico as notas técnicas precedentes da pasta, com igual conteúdo normativo e passíveis de embasar as condutas alegadamente lesivas a preceitos fundamentais, não impugnadas nesta arguição”, sic parecer.
Ao final, o procurador-geral destacou que a discussão sobre o tema merece análise futura pelo STF, desde que sanados os problemas técnicos da ação.
“Faz-se uma última consideração, a conter, de algum modo, o alegado periculum in mora: o adiamento da discussão na via da jurisdição constitucional abstrata, se for esse o caso, não impedirá que meninas e mulheres gestantes que hajam sido vítimas de violência sexual busquem amparo do Judiciário de modo individualizado, se assim desejarem ou se mostrar necessário. Em face do exposto, opina o PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA pelo indeferimento da cautelar”, finaliza parecer.
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