O governo endureceu as negociações com os parlamentares e deu um basta a novas concessões na reforma da Previdência, rejeitando, assim, o lobby pesado de algumas categorias do serviço público, sobretudo aquelas com altos salários, que querem continuar se aposentando mais cedo com integralidade (último salário da carreira) e paridade (reajustes salarias iguais ao do pessoal da ativa). Diante do risco de que a proposta fosse desidratada com o aumento das pressões no Congresso, o presidente Michel Temer convocou os líderes da base aliada e ministros para uma reunião na sua residência, no fim da tarde de ontem — quando o martelo foi batido. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles antecipou o retorno de Washington, onde estava para a reunião anual do Fundo Monetário Internacional (FMI), e participou do encontro.
A missão agora é enfrentar as resistências no voto e aprovar o texto negociado com o relator, deputado Arthur Maia (PPS-BA). Na última quarta-feira, Maia surpreendeu o governo ao anunciar que iria flexibilizar a regra para os servidores públicos. Ele estava sendo pressionado diretamente por entidades representativas de juízes e procuradores, que querem uma regra de transição para continuar fazendo jus à paridade e à integralidade.
Pelo relatório fechado com o governo, quem ingressou no serviço público até 2003 terá de ficar mais tempo em atividade, até completar 65 anos (homem) e 62 anos (mulher) para receber esses dois benefícios. A obrigatoriedade valerá já a partir da aprovação da reforma.
Segundo o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Moreira Franco, a reunião foi detalhada, o governo refez as contas e viu que não há mais espaço para novas concessões.
— A reforma tem que ser aprovada para evitar que a União, o Brasil, se transformem em um novo Rio de Janeiro — afirmou o ministro ao GLOBO após a reunião, fazendo referência à situação fiscal do estado, com aposentados e pensionistas enfrentam dificuldade para receber seus benefícios.
O TEXTO DEVE SER VOTADO EM 2 DE MAIO
Moreira Franco destacou, ainda, que a reforma preserva os direitos de quase 70% da população, que ganha até um salário mínimo:
— Esse mecanismo de pressão vem de uma minoria, que ganha salários elevados.
Com o aumento do lobby das categorias nos últimos dias, além de Maia, outros parlamentares, inclusive da base aliada começaram a defender uma flexibilização na regra de transição dos servidores públicos. Os técnicos da área econômica vinham resistindo às investidas e tinham como aliado o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Ele afirmou que “não há mais espaço para novas concessões”.
— Era preciso dar um basta. As pressões já estavam passando do limite — disse um interlocutor do Planalto.
Depois da reunião, o líder do governo no Congresso, André Moura (PSC-SE), reforçou o argumento do governo.
— Não cabe mais espaço para nenhuma mudança — observou Moura, acrescentando que, na reunião, Temer pediu empenho para votar a reforma trabalhista e o projeto de socorro financeiro aos estados.
Já está certo que a reforma trabalhista será votada na comissão especial na terça-feira, sendo enviada, logo a seguir, para o plenário da Câmara.
Os técnicos, no entanto, sabem que precisam ficar de prontidão para evitar que a reforma da Previdência seja desfigurada durante o trâmite no Congresso, porque as pressões vão continuar. O relatório de Arthur Maia começará a ser discutido amanhã na comissão especial que debate o tema, com previsão de ser votado no dia 2 de maio.
Por trás do lobby estão auditores da Receita Federal, juízes, procuradores e até consultores legislativos — que assessoram o próprio relator da reforma da Previdência. Nos últimos dias, essas categorias intensificaram a pressão sob os parlamentares para continuar se aposentando mais cedo e com direito à integralidade e à paridade, sem ter de esperar a idade de 65 anos (homem) e 62 anos (mulher).
Essa exigência foi sugerida pela área econômica e acatada inicialmente pelo relator para quem ingressou no serviço público até 2003 (quem entrou depois desta data não tem mais direito à integralidade e paridade). Segundo os técnicos envolvidos nas negociações, é a medida com maior potencial para compensar as perdas decorrentes das concessões do governo em relação à proposta enviada ao Congresso. O efeito, é sobretudo, a curto prazo, com redução de despesas com pagamento de benefícios, pelo fato de os servidores adiarem um pouco mais a aposentadoria para receber um benefício maior.
Arthur Maia vem sendo pressionado desde que apresentou o texto, na última quarta-feira. Num manifesto entregue a ele por entidades representativas de juízes e procuradores, a classe alega que todos os trabalhadores tiveram direito a uma transição. Em apoio, a Unafisco diz em seu site que a classe “envidará todos os esforços para que essa medida abusiva e desproporcional não prospere no Congresso”.
O movimento tem o apoio da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), que tem feito propaganda contra a reforma, com o argumento, contestado pelo governo, de que a seguridade social é superavitária.
A reforma proposta ainda permite que o servidor se aposente antes de cumprir a idade mínima. Neste caso, o valor do benefício é calculado com base no montante de contribuições realizadas. Ainda assim, esses servidores poderão continuar com aposentadorias altas — até o teto do salário do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que é de R$ 33,7 mil.
Segundo os técnicos da área econômica, a integralidade é um benefício especialmente oneroso para União e estados. Tome-se o exemplo de um juiz. Ele contribui por dez anos como advogado para o teto do INSS (R$ 5.531); mais dez anos como técnico do Judiciário, para ter direito a uma aposentadoria de R$ 10 mil; e depois mais 15 anos, como juiz. Neste caso, ele poderá receber uma aposentadoria no valor de R$ 30 mil. Caso fosse levada em consideração a efetiva contribuição dele, o benefício seria de R$ 15 mil.
— A regra da transição para o servidor público já é mais benevolente — disse um técnico.
TEMER SE REÚNE COM MINISTROS HOJE
O governo trabalha com a possibilidade de aprovar a reforma no Congresso ainda no segundo semestre. Mas, já admite que o cronograma pode atrasar, porque será preciso fazer todo um trabalho de convencimento junto às bancadas, com o envolvimento de ministros e de todas as lideranças partidárias, inclusive executivas nacionais. Apesar de todos os recuos em relação à proposta enviada ao Congresso, há ainda muita resistência por parte dos parlamentares, que estão “morrendo de medo de perder a eleição em 2018 e ficar sem foro” (com o desfecho da Lava-Jato), resumiu um integrante da base de apoio.
Temer fará uma reunião com os ministros hoje, para determinar prioridade à reforma da Previdência. Os ministros serão orientados a continuar recebendo parlamentares, mas fora dos horários de discussão e votação da proposta. Os líderes da base também intensificarão, nas próximas semanas, um corpo a corpo com as bancadas para explicar que o texto final da reforma atende a todos os principais pleitos e, por isso, não é mais a proposta dura enviada inicialmente. Segundo interlocutores do Planalto, a ideia é trabalhar para construir o fechamento de questão pelos partidos, no momento que que reforma for à votação no plenário da Câmara e do Senado. Em primeiro turno no plenário da Câmara, isso deve ocorrer entre 10 e 20 de maio.
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