O juiz Corregedor Penitenciário de Mato Grosso, Geraldo Fernandes Fidelis Neto, determinou que o Governo e a Secretaria de Segurança Pública do Estado, promovam a reabertura do Centro de Custódia de Cuiabá – CCC, desativada em janeiro deste ano, em 48 h. A decisão do magistrado dessa sexta-feira (17.02) atende ao pedido da Comissão de Direito Penal e Processo Penal da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB/MT).
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Mais de 400 reeducandos do Centro de Ressocialização de Cuiabá (CRC), antigo Carumbé, e do Centro de Custódia da Capital (CCC), foram transferidos em 5 de janeiro deste ano, para o Complexo Penitenciário Ahmenon Lemos Dantas, em Várzea Grande, para desativação do CCC.
Na decisão, o juiz argumentou que, conforme citou o presidente da Comissão de Direito Penal e Processo Penal, Leonardo Luis Nunes Bernazzolli, Mato Grosso avançou muito, principalmente nos últimos três anos, a ponto de praticamente zerar o déficit de vagas no sistema prisional e na readequação da carreira dos policiais penais de Mato Grosso, por isso não tem como retroceder.
Segundo Fidelis, nessa sexta-feira (17.02), acompanhado do advogado Leonardo Bernazzolli, fez uma inspeção extraordinária no raio 08, da Penitenciária Central do Estado, provocada a partir de reclamações apresentadas em Juízo por familiares e advogados de privados de liberdade com direito a cela especial, que, após o fechamento do Centro de Custódia da Capital – CCC - foram transferidos, sem qualquer orientação prévia ou aviso, para o raio 08, da PCE.
O local destinado a eles viola os direitos concedidos a todos os privados de liberdade, entre os quais: o banho de sol é regrado a períodos de no máximo duas horas; as visitas são realizadas quinzenalmente e de maneira coletiva, o que não permite a realização de visita íntima; não foram concedidas oportunidades de trabalho ou estudo; sendo impedidos de socializar com os demais penitentes de mesma natureza.
Ainda, segundo o juiz, foram apresentadas denúncias informando a ocorrência de pressões psicológicas e emprego de gás de pimenta nos distribuidores de ar, além de que, ao participarem de audiências nos espaços específicos para o ato ser realizado virtualmente, misturam-se com os custodiados definitivos da unidade, esgarçando o isolamento garantido em lei.
"O Estado tem o dever constitucional, pelo menos, de fornecer o "mínimo existencial" à proteção dos reeducandos, com condições adequadas para o bom funcionamento da unidade prisional – que não se restringem às instalações físicas, em harmonia com o princípio da dignidade da pessoa humana, assegurando-lhes o direito à vida, saúde e integridade física e moral, assistência religiosa, exercício do trabalho e direito às visitas. Não se pode invocar a teoria da reserva do possível, importada do Direito alemão, como escudo para o Estado se escusar do cumprimento de suas obrigações prioritárias", diz trecho da decisão.
Geraldo Fidelis argumentou, ainda, que o fechamento do Centro de Custódia de Cuiabá – sem qualquer motivação aparente - configura evidente retrocesso social, não apenas dos apenados que estão atualmente recolhidos no raio 08, mas também de toda a sociedade, já que a garantia de políticas de reinserção possui reflexos na segurança pública, com índices imediatos na diminuição da reincidência.
E, ainda, diz ele, não se pode invocar a existência da cláusula contratual, firmada no Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) 01/2020, que autorizou o Estado de Mato Grosso transferir, conforme a evolução da construção dos raios 1, 2, 3, 4 e 5, os reeducandos do Centro de Ressocialização de Cuiabá – CRC e do Centro de Custódia da Capital – CCC para as novas instalações da PCE, em Cuiabá, e do Complexo Penitenciário Ahmenon Lemos Dantas, em Várzea Grande, por três fundados motivos.
Conforme o juiz, transferência autorizada não importa em uma “carta em branco” para a supressão de direitos. Oras, o local de destino dos reeducandos oriundos do CCC e do CRC na Penitenciária Central do Estado deve assegurar, no mínimo, o usufruto de todos os direitos e prerrogativas outrora desfrutados. Nenhum direito a menos.
Ele destacou que não ficou autorizado, nem implicitamente, que essa transferência fosse realizada de maneira açodada, no apagar das luzes, sem nenhum cronograma ou estudo prévio sobre a aptidão das novas instalações para acolhimento dos penitentes que, friso, em sua esmagadora maioria, são de mínima ou, quiçá inexpressiva, periculosidade.
E, ainda, conforme ele, para o fechamento daquela unidade de custódia (CCC), que realizava a segregação de um público com direito diferenciado, previsto em lei, pressupunha a construção de outro local adequado para tal finalidade, o que de modo algum ocorreu, pois a solução escolhida foi a mais inadequada possível, ao realizar a prisão provisória num espaço voltado a um público de alta ou extrema periculosidade e, por isso, com as regras de cautelas inerentes a uma maior segurança. O Termo de Ajustamento de Conduta não poderia sequer ser interpretado diferente.
"O princípio da proibição do retrocesso, ou efeito catraca, decorrente da Teoria dos Direitos Fundamentais, assegura a máxima proteção dos Direitos da Pessoa Humana contra qualquer medida normativa ou política de supressão, ou enfraquecimento dos direitos alcançados".
"Pelo exposto, a partir das informações coligidas ao presente relatório, determino:
I) A autuação do presente como incidente no SEEU, no meio “Corregedoria dos Presídios”;
II) A intimação do Governador do Estado e do Secretário de Segurança Pública, a fim de que, no prazo de 48h, promovam a reabertura do Centro de Custódia de Cuiabá - CCC, com retorno dos privados de liberdade, corpo técnico e policiais penais;
III) Ciência do presente relatório e decisão ao Secretário Adjunto de Administração Penitenciária e à direção da Penitenciária Central do Estado, para providências quanto aos procedimentos de transferências e realocação de servidores;
IV) Ciência à Corregedoria Geral da Justiça, ao GMF, Ministério Público e Defensoria Pública que atuam perante o Núcleo de Execuções Penais, OAB/MT, FECCOMAT e CONCEP de Cuiabá;
V) Intime-se ainda na presente data, pelos meios mais céleres possíveis ou, na impossibilidade, comunique-se o PLANTÃO, que atuará no feriado, para promover a referida intimação, POIS SE TRATA DE QUESTÃO RELATIVA À VIOLAÇÃO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. Às providências, com a máxima urgência".
"CUMPRA-SE, AINDA QUE EM PLANTÃO".
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