O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou, nesta segunda-feira (5) em evento em São Paulo, que percebe um avanço de setores conservadores para encerrar o ciclo de governos de esquerda na América Latina e que há tentativa de criminalizar movimentos de esquerda no Brasil e em outros países do mundo.
"Estou vendo que as coisas estão ficando mais delicadas, mais agressões, mais críticas. Há uma tentativa de criminalizar os setores de esquerda em vários países do mundo e aqui no Brasil isso é muito forte", disse Lula.
O petista participou de um debate ao lado do vice-presidente da Bolívia, Álvaro García Linera, que falou sobre a experiência do governo socialista de Evo Morales. O evento foi fechado à participação da imprensa, mas houve transmissão pela internet.
"Estou percebendo que há um avanço dos setores conservadores. Há um avanço, há mais agressividade, mais determinação de tentar fazer que esse ciclo progressista vá deixando de existir. Aqui no Brasil, a última eleição foi muito dura e muito agressiva. No Chile a Michelle Bachelet está passando por momentos difíceis. Você sabe quantas agressões a companheira Cristina sofreu na Argentina", afirmou Lula, dirigindo-se ao vice-presidente boliviano.
Lula disse que o PT falhou na tarefa de articulação com outros partidos de esquerda da América Latina e sugeriu rearticular a esquerda na América Latina para enfrentar o momento de adversidade.
"Eu queria fazer o mea culpa. O PT não soube transformar em grandeza de política internacional aquilo que nós conseguimos fazer aqui no Brasil. Quando eu deixei a presidência eu pensei em tentar criar alguma coisa, juntar todos os partidos de esquerda para a gente começar a discutir a nossa relação com os partidos argentinos, a nossa relação com a Frente Ampla, a nossa relação com a política da Bolívia. Nós não cumprimos aquilo que nós deveríamos cumprir. Acho que não utilizamos bem a nossa passagem pelo governo para transformar o sucesso que nós tivemos aqui no Brasil em sucesso de relação de política internacional", disse Lula.
"Quando a gente não estava no governo, quando a gente era oposição, viajamos mais organizando reuniões com a esquerda da América Latina do que depois que nós ficamos governo. Acho que o PT deve essa à América do Sul. Nós precisamos nos interessar mais e fazer mais para que a gente crie alguma coisa mais sistêmica de organização. Nós ficamos no Foro de São Paulo a cada aparecendo menos gente importante. É preciso a gente hoje começar a trabalhar a possibilidade de a gente criar um instrumento para que agente pudesse juntar as forças de esquerda na América do Sul para a gente ir construindo uma ação política para enfrentar o momento de adversidade que a gente vive", afirmou o ex-presidente.
'Partido de esquerda, quando chega ao poder, fica enfraquecido'
O ex-presidente também disse que "é histórico, que todo partido de esquerda, quando chega ao poder, fica enfraquecido, porque toda a gente quer ir para o governo". "Não adianta você dizer: 'ah, não vou te levar porque você vai ficar no partido'. Não. O cara acha que ele tem que ir para o governo. Ele quer ser ministro, ele quer ser qualquer coisa", disse Lula.
O ex-presidente deu o exemplo de uma sindicalista que ganhou a eleição para o sindicato dela e pensou em deixar o sindicato para se candidatar a deputada estadual. "Eu chamei ela no instituto e falei para ela: companheira, pelo amor de Deus, não perca a noção de grandeza. Ser sindicalista no seu sindicato é dez vezes mais importante do que ser deputada", afirmou.
O vice-presidente boliviano disse, durante o evento, que a esquerda não pode correr o risco de achar que, ao virar governo, acabou a luta. "Se vermos assim as coisas não estaríamos longe de transformar a esquerda em uma mudança de elite, da administração do estado, quando a esquerda deve administrar o Estado, mas também deve revolucionar o estado", afirmou.
O vice-presidente boliviano também alertou para outro risco que ameaça governos: a corrupção. "Companheiros que nunca gerenciaram dinheiro, que nunca tiveram poder de tomar decisão sobre os recursos, podem se sentir tentados, porque é aquela única oportunidade que a vida oferece em toda a sua existência. E tentam converter o público em privado. Usar o bem público para o bem pessoal. É uma doença. É como um câncer", afirmou.
Entre no grupo do VGNotícias no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).