A infeliz combinação de impunidade, temor, machismo e uma legislação frouxa, tem produzido números cada vez mais crescentes de mortes de mulheres, cujos autores, em esmagadora maioria, são maridos, ex-maridos, namorados e ex, ficantes, paqueras, e os que se dizem apaixonados e não correspondidos. Esses crimes ganharam a nomenclatura de ‘feminicídio’ dada à escalada de casos – Brasil adentro.
Mato Grosso, que em 2020, em plena pandemia, teve registro de 57% de aumento de ocorrências, repetiu o feito no ano passado, 49 casos, e caminha para uma nova estatística em crescente neste ano. Os casos em análise referem-se, é bom lembrar, só a casos com mortes – o feminicídio propriamente dito. Estão fora espancamento com graves hematomas, agressões morais e ameaças, que vão para o registro das prisões pela lei Maria da Penha.
No balanço do semestre fornecido pela Sesp – Secretaria de Segurança Pública, até junho, já são 21 casos neste ano, contra 22 no ano 2021. É um número elevado, levando-se em conta que pode se multiplicar por dois ou três até dezembro.
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Ângela Rocha Pereira, 22 anos, encontrada em um lixão, no município de Colniza, esfaqueada e queimada em abril deste ano, foi morta por um suposto companheiro e por problemas relacionados a tráfico de drogas.
O apurou que ela já havia prestado queixas contra o autor das facadas, mas terminou morrendo. Dezenas de mulheres passam por ameaças, espancamentos e estupros a todo momento. Umas denunciam, outras se calam, resignadas.
Medidas protetivas de pouco valem, embora seja um procedimento adequado e a única coisa a fazer em determinadas situações. "O denunciado é chamado, presta depoimento e é liberado após assinar termos e sair com a cópia da medida de proteção. No caminho de volta, ele lê, amassa o documento e joga no lixo", diz Maria L.M.S, recentemente espancada por admirador a quem não deu bola, mas ela deu parte numa delegacia.
Casos alarmantes de machismo e crueldade: mais da metade dos denunciados termina seu intento, ou espanca ou mata a mulher depois.
Arquivo pessoal
Delegada da Mulher, dra. Jannira Laranjeira Campos: "De início é uma questão machista e cultural".
A delegada, Jannira Laranjeira Siqueira Campos, 10 anos de profissão, e coordenadora do Plantão de Atendimento da Delegacia Especializada de Defesa da Mulher, que cuida de casos de vítimas de violência doméstica e sexual de Cuiabá, lembra que “a violência de uma forma geral, seja feminicídio, agessões domésticas e abusos sexuais são extratos culturais e que a própria legislação, em passado recente, punia as mulheres por se queixarem”, diz ela, acrescentando no rol a cultura machista que perdura até hoje, embora tenha havido alguns pequenos avanços na lei.
O feminicídio é uma tragédia anunciada, conforme relatos de diversas autoridades e pesquisadores.
O feminicídio é uma violência que já vem de algum tempo no seio do lar, seja por opressão, agressões psicológicas, violência sexual, material e física”, diz a delegada
Segundo se apurou, dos últimos casos de feminicídio no Estado, poucos autores estão presos. Não há dados precisos, pois, a Sesp não forneceu os números. Com uma legislação condescendente para quem comete crimes, o condenado dificilmente cumpre integralmente uma sentença. Na maioria das vezes. uma pena de 10 anos, por exemplo, é reduzida para um quinto – fica valendo dois - , sem contar que o apenado pode, a depender do empenho do advogado, ficar menos que 1,6 ano, ganhando as ruas ou com monitoramento eletrônico [a tornozeleira] ou beneficiado pelo regime semiaberto por “bom comportamento”.
Segundo o Ministério da Justiça, em 2020 houve 1.309 em apenas um ano. Muito mais da metade dos sentenciados ou saiu ou está perto de ficar livre para, quem sabe, cometer o mesmo crime. No caso de espancamento, o castigo imposto pela justiça é semelhante ao que o aluno primário recebe na escola por mau comportamento: um pito, conselhos, uma cadeia rápida e nada mais.
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