Com o nome citado em delações premiadas, inclusive de ex-apoiadores, como Alan Malouf e Permínio Pinto, o governador Pedro Taques (PSDB), em entrevista concedida ao jornalista José Marques da Folha de São Paulo, defendeu o instrumento da delação, mas alertou que “em determinado momento começa a surgir a indústria das delações”.
Segundo ele, o fato do delator “citar um político e jogar o nome de alguém pode ser um benefício”.
Ao ser questionado sobre o que teria motivado os delatores a delatarem seu nome, Taques respondeu que eles querem tirar a responsabilidade deles e jogarem para o outro. “Objetivamente isso. Eu nunca conversei mais com eles. É tirar o deles e colocar o meu na reta”.
Confira na íntegra a entrevista de Pedro Taques concedida à Folha de São Paulo:
O sr. saiu de uma condição de defensor do combate à corrupção e agora foi citado em delações e está sendo investigado...
Não estou sendo investigado.
Na questão do grampo, não em relação à corrupção.
Tem uma sindicância no STJ (Superior Tribunal de Justiça) que eu pedi.
Uma sindicância é uma investigação.
No regimento interno do STJ, não. Mas tudo bem.
É uma apuração.
É, uma apuração. Eu pedi isso justamente porque aqui estava circulando a respeito desse fato.
Como é ser citado em casos que o sr. combatia?
E combato. Veja que Mato Grosso é o segundo Estado do Brasil que mais aplicou a lei anticorrupção. Quando eu deixei o Ministério Público e entrei na política eu tinha a absoluta certeza de que eu podia ser acusado, investigado de qualquer coisa, porque isso faz parte do mundo político, mas isso não significa que eu tenha cometido alguma coisa ilícita. Ou o político é ladrão ou é outra coisa, então eu avisei à minha família e estou absolutamente tranquilo diante do que eu fiz.
No caso das delações, o [ex-governador] Silval Barbosa me citou. Disse que eu como governador eleito eu teria tido uma reunião com ele. Eu fiz uma reunião com ele, nunca pedi nada ilícito para ele e ele nunca me ofereceu nada ilícito.
Ele diz que teria oferecido dinheiro ao sr. em troca de evitar investigações sobre o governo dele.
Mas tudo o que ele foi investigado [sobre ele] eu que mandei. O nosso governo foi conhecido no primeiro ano como um governo que fez auditorias. Se você pegar todas as empresas citadas por ele na delação dele, todas nós investigamos e mandamos para o Ministério Público. Portanto, não fiz nenhum acordo.
E por que ele citou o nome do senhor?
Porque nós éramos, somos e seremos adversários políticos. Quero falar da delação. Não há instrumento melhor para combater crime organizado. Defendo o instrumento da delação, só que em determinado momento —não estou citando caso concreto— começa a surgir a indústria das delações. O fato de você citar um político e jogar o nome de alguém pode ser um benefício.
Não que o Ministério Público esteja fazendo nada errado. Eu defendo a atuação do Ministério Público, tenho orgulho de ter sido do Ministério Público, mas nós temos que levar em conta que na delação, no momento da homologação, ocorre um princípio: na dúvida, homologue. É mais ou menos como recebimento da denúncia, não se faz juízo aprofundado.
O senhor atribui a essas citações o seu desempenho eleitoral desse ano?
Amigo, eu digo a você que eu ainda não fiz uma avaliação política da derrota. Entendo que o governador eleito Mauro Mendes ganhou a eleição e a democracia serve para isso, não é para que os bons possam se perpetuar. É para que alguns não possam permanecer o resto da vida. Marcamos de sentar ano que vem para, com espírito desarmado, debatermos quais foram os erros dos governos.
Mas não pergunto do governo, mas de citação em casos de suposta corrupção.
Isso pode ter refletido na campanha, mas não gosto de falar se não tenho dados comprovados. Não tenho convicção disso.
O que o senhor acha que motivou essas pessoas, inclusive uma que estava em seu governo [o ex-secretário de Educação Permínio Pinto], a delatarem o senhor?
Amigo, querem tirar a responsabilidade delas e jogarem para o outro. Objetivamente isso. Eu nunca conversei mais com eles. É tirar o deles e colocar o meu na reta.
Querem um nome político para incriminarem?
Eu sou político e hoje em dia no Brasil todos os políticos estão na mesma vala. Você fala que é político e já entra devendo, no sentido de ter que demonstrar. E você colocando [na delação] alguém que está num cargo público, chama mais atenção para ter os benefícios da lei.
O STF homologou duas delações. O Supremo errou?
Não. Conforme está na lei. A homologação na dúvida é pró sociedade, não é pró delator. Homologou porque tem o mesmo raciocínio de um recebimento de denúncia.
Mas num recebimento de denúncia há indícios mínimos que ela seja aceita.
Sim, mas se uma pessoa fala que eu cometi um crime, não é? Aí homologa, tecnicamente é isso que ocorre.
O senhor diz que houve acusações injustas contra o senhor. Acha que deve haver mudança em relação à lei de delações?
Eu estou pensando e estudando sobre a lei de delações. Eu não tenho essa conclusão ainda.
O senhor faz alguma autocrítica ou reconhece algum erro no combate à corrupção no seu governo?
Sim, reconheço isso, de que o Estado brasileiro ainda precisa aprimorar os mecanismos de combate à corrupção. Por isso, na nossa administração, Mato Grosso foi o segundo Estado do Brasil que mais aplicou a lei anticorrupção.
Aliás, eu que regulamentei a lei anticorrupção, criei um gabinete de transparência para receber denúncias, só que a estrutura do Estado é muito grande e não tem como você controlar —fazer um BBB em 70.000 servidores.
Mas dava para ter aprimorado algo na sua gestão?
Tudo o que eu podia fazer [,fiz]... Fortalecimento da Controladoria. Nós chamamos mais servidores, equipamos mais a Controladoria, chamamos mais procuradores para que tenha um em cada secretaria para fazer a prevenção. Mas existem casos de corrupção? Existem, infelizmente.
A respeito da questão dos grampos. Qual o grau de conhecimento que o senhor tinha disso?
Eu recebi uma denúncia de um promotor de Justiça que era secretário de Segurança [Mauro Zaque]. Eu disse: tome as providências. Ele fez uma representação aqui, mandou para o Gaeco e o Gaeco arquivou. Aí no dia que o Maurício Ferraz [repórter do Fantástico] veio aqui, mostrou outra [representação sobre o caso dos grampos]... e isso nunca chegou a mim.
Aí eu determinei auditoria porque que o relatório foi fraudado e nunca chegou a mim. Eu que determinei. Nunca vi o grosso da denúncia.
O ex-secretário Mauro Zaque disse que o senhor tinha conhecimento e não tomou providências.
Mauro Zaque sempre trabalhou comigo. Ele sempre chegava para mim e dizia: fulano de tal está cometendo crime. Eu dizia: ponha no papel, amigão. Se eu for levar em conta fofoca que eu ouço o dia inteiro...
Mas se tem 70 mil pessoas grampeadas [segundo a OAB] não é fofoca, governador...
Não é isso. Ele falou que tinha um sistema fazendo grampo, mas não sabia quantas pessoas estavam grampeadas. Eu falei: 'põe no papel' e ele pôs. Eu peguei e mandei para o Gaeco. Eles arquivaram.
Aí um belo dia vem o Maurício Ferraz e diz que o promotor Mauro Zaque fez uma representação e não foi tomado providência. Eu disse 'está aqui a providência'. Ele disse: 'não, é outra representação'. Essa outra alargava os fatos. Mas não falava em 70 mil. 70 mil alguém falou depois. Essa [segunda representação] nunca chegou à minha mão.
Foi aberta alguma investigação interna, pelo Estado, a esse respeito? Em relação ao grampo?
Sim.
Qual a conclusão?
Não terminou. Está em andamento. Eu que mandei.
O Estado de Mato Grosso, nos últimos quatro anos, foi alvo de diversas operações policiais, tanto no Executivo quanto no Legislativo, que envolveram muitas figuras políticas no Estado. Ao que o senhor atribui os problemas que o Estado vem enfrentando?
Com todo respeito, quando você falou do Executivo, é do meu governo, quais operações?
Principalmente a Ararath [que prendeu o ex-governador Silval Barbosa].
Mas aí não é no meu governo.
O senhor não faz uma avaliação política disso?
Mas quero que fique bem claro que não é no meu governo.
Houve questões relativas ao seu governo, como a gente está conversando aqui.
Existem, mas eu já citei.
Mas e a Ararath, a questão do Riva [ex-presidente da Assembleia, conhecido como 'maior ficha suja do Brasil]...
Isso é um misto de tristeza e alegria. Tristeza porque teve corrupção, mas ao menos está sendo investigado. Alegria porque as instituições estão funcionando.
A situação de Mato Grosso em relação a desvendar corrupção foi maior que o resto do Brasil?
Em absoluto. Se você levantar outros Estados da federação, Mato Grosso foi bem menos.
Bem menos?
Pode olhar. Eu tive o trabalho de fazer isso.
O senhor levantou?
Levantei.
O que o senhor acha da Lava Jato, como ex-procurador?
Eu entendo que todo combate à corrupção é importante para melhorar a sociedade, mas não tenho elementos técnicos para as decisões porque não vi o processo. Não há melhor detergente que a luz do sol.
Mas pergunto não do processo. Como cidadão?
Entendo que é importante para que o Brasil possa melhorar. Se as decisões são justas ou não? Não vi o processo. Eu acredito na justiça brasileira.
O que o senhor acha da indicação de Sergio Moro ao Ministério da Justiça?
Imagina o seguinte: eu fui procurador da República por 15 anos. Fiquei em Mato Grosso até outubro de 2004. Aí eu fiquei em São Paulo, longe daqui, até 2009. Cinco anos. Voltei em 25 de março de 2010 para ser candidato.
O Moro foi convidado, ele tem todo direito de se exonerar... eu não me aposentei nem me exonerei, assinei um documento e fiquei sem salário. A história vai dizer.
O senhor acha que essa transição rápida pôs em xeque a imparcialidade dele?
Eu não tenho elementos para falar isso.
Qual o rumo que o senhor acha que o PSDB deve tomar agora nesse mandato Bolsonaro?
Eu vejo assim: numa eleição, o cidadão coloca no poder quem ele quer. E quem ele quer na oposição. O cidadão entende que o PSDB deve ser oposição. Você tem que atender o cidadão. Isso não significa que o PSDB não possa votar a pauta do PSDB, a agenda do PSDB, que o Bolsonaro entender como correta.
Por exemplo, o PSDB sempre defendeu uma social-democracia, um Estado com menos braços e pernas e mais estratégico. Foi o PSDB com Fernando Henrique que criou as agências reguladoras e fez a privatização da telefonia. O PSDB sempre defendeu a reforma da Previdência. O PSDB tem que votar favoravelmente a essa sua pauta.
Se o Bolsonaro fizer a reforma da Previdência, na minha opinião, mantida a independência dos parlamentares, entendo que o PSDB do Congresso tenha que votar favorável. Mas não significa que tenha ir para o governo.
Não entra na base, então?
Não, o cidadão nos colocou na oposição, nem quer que nós sejamos governo.
O que o senhor achou do desempenho do ex-governador Geraldo Alckmin na eleição?
O presidente do nosso partido, Geraldo Alckmin, fez quatro mandatos em São Paulo e os indicadores são os melhores do Brasil em quase todas as áreas —até porque São Paulo é uma potência econômica. Mas nesta eleição de 2018 os próprios estudiosos, cientistas políticos, ainda não chegaram uma conclusão do que ocorreu no Brasil.
Eu entendo que a eleição do presidente eleito Bolsonaro foi absolutamente legítima, mas isso ainda precisa ser estudado. Por isso o desempenho dele [Alckmin] foi aquém, como o meu aqui.
O senhor acha que a eleição nacional interferiu na sua reeleição?
Não. Acho que a minha não vitória aqui é porque o cidadão entendeu que o outro era melhor. A democracia não serve para que os bons fiquem o resto da vida.
O senhor pretende continuar no partido?
Sim, mas a partir do ano que vem vou tirar minha carteira da ordem, para ver se eu advogo, dar aula. Tratar um pouco de mim.
Pensa em tentar se eleger a algo no futuro?
Por ora estou pensando em fazer a minha defesa e cuidar da minha vida. Mas sou um agente político e não posso abandonar os debates políticos.
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