O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) aprovou recomendação para o uso de câmeras corporais pelas polícias em todo o país. A medida não é obrigatória e será remetida ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Conforme a recomendação, o uso dos equipamentos é uma forma de reforçar a transparência e legitimidade das ações dos agentes de segurança pública; respaldar a atuação do profissional de segurança pública, proteger-lhe a integridade física e moral; assegurar o uso diferenciado da força; garantir a preservação dos direitos fundamentais dos cidadãos; promover a obtenção de elementos informativos e de elementos de prova com maior qualidade epistêmica; e permitir a verificação da preservação da cadeia de custódia probatória, assim como aprimorar o serviço de segurança pública prestado.
O texto aprovado estabelece que os órgãos de segurança pública deverão utilizar sistemas de câmeras que funcionam com acionamento automático. A gravação deverá ser feita durante todo o turno de serviço e armazenada pelo período mínimo de três meses.
As gravações deverão ser realizadas em prisões em flagrante, no cumprimento de mandados de prisão e em inspeções de atividades prisionais.
A recomendação prevê que interessados poderão pedir acesso às imagens, como pessoas que sofreram abordagens policiais inadequadas e agentes que forem acusados de abuso de autoridade e que queiram comprovar a legalidade de sua atuação.
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RECOMENDAÇÃO Nº 1, DE 19 DE JANEIRO DE 2024
Recomenda o uso de câmeras corporais nas atividades dos agentes de segurança pública e de segurança e vigilância privada.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, no uso de suas atribuições legais e regimentais, e
CONSIDERANDO o artigo 64, incisos I e II da Lei 7210/1984, que estabelece a atribuição do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária para propor diretrizes voltadas à prevenção do delito, administração da Justiça Criminal e elaboração de planos nacionais de desenvolvimento, metas e prioridades da política criminal;
CONSIDERANDO a Portaria CNPCP/MJSP nº 45, de 20 de julho de 2023, que cria o Grupo de Trabalho para estudo e análise sobre instalação de câmeras corporais em agentes de segurança pública;
CONSIDERANDO a necessidade de uniformização/padronização do uso de câmeras corporais por agentes de segurança pública e de segurança e vigilância privada em âmbito nacional, bem como a necessidade de disciplinar a gravação, o armazenamento, tratamento e disponibilização das imagens, assegurar a cadeia de custódia probatória, entre outras aplicações da solução;
CONSIDERANDO que o uso de câmera corporal traz maior transparência e aprimora a atividade de segurança pública, ampliando e fortalecendo os vínculos de confiança do agente de segurança com a sociedade;
CONSIDERANDO que o uso de câmera corporal contribuirá para a apuração de fatos potencialmente criminosos ocorridos em contexto em que exista exercício de atividades de segurança e vigilância privadas, notadamente em estabelecimentos de uso coletivo, públicos ou privados, nos quais haja interação com o público em geral, nos termos Portaria DG/PF nº 18.045, de 17 de abril de 2023;
CONSIDERANDO que as gravações por meio das câmeras corporais funcionam como meio para obtenção de provas, sendo necessário assegurar a cadeia de custódia das imagens e áudios captados;
CONSIDERANDO que estudos e análises de dados empíricos indicam associação entre o uso da câmera corporal e significativa redução do nível do uso de força policial, bem como redução da interação negativa entre agentes de segurança pública e os demais cidadãos ;
CONSIDERANDO a necessidade de dotar o Ministério Público de meios que contribuam para o efetivo exercício do controle externo da atividade policial, previsto no artigo 129, VII, da Constituição Federal;
CONSIDERANDO o interesse de outros órgãos públicos e da sociedade civil na avaliação e no aprimoramento da prestação dos serviços de segurança pública e privada, resolve:
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 1º - Recomendar a instalação e o uso de câmeras corporais para gravação ambiental de vídeos com imagens e sons nos uniformes dos agentes de segurança pública, visando a alcançar os seguintes objetivos:
I - reforçar a transparência e legitimidade das ações dos agentes de segurança pública;
II - respaldar a atuação do profissional de segurança pública, e proteger-lhe a integridade física e moral;
III - assegurar o uso diferenciado da força;
IV - garantir a preservação dos direitos fundamentais dos cidadãos;
V - promover a obtenção de elementos informativos e de elementos de prova com maior qualidade epistêmica;
VI - permitir a verificação da preservação da cadeia de custódia probatória;
VII - auxiliar o exercício do controle externo da atividade policial;
VIII - subsidiar a avaliação e o aprimoramento do serviço de segurança pública prestado.
Art. 2º - Para garantir o cumprimento dos objetivos previstos no artigo anterior, as unidades federativas criarão Comitê Intersetorial para desenvolvimento dos protocolos de implementação das diretrizes fixadas nesta Recomendação.
Art. 3º - Para os fins desta Recomendação, considera-se agentes de segurança pública: policiais militares, policiais civis, policiais federais, policiais rodoviários federais, policiais penais distritais, estaduais e federais e guarda municipal, conforme artigo 144 da Constituição Federal, bem como policiais legislativos e policiais judiciais.
Parágrafo único. Para fins desta Recomendação, as atividades de segurança privada são aquelas disciplinadas na Portaria DG/PF nº 18.045, de 17 de abril de 2023.
CAPÍTULO II
DA GRAVAÇÃO
Art. 4º - Recomendar que os órgãos de instituições de segurança pública priorizem modelos/sistemas de câmeras corporais que funcionem mediante acionamento automático, em detrimento daqueles de acionamento manual.
Art. 5º - Recomendar que a gravação seja ininterrupta por todo o turno de serviço do usuário, tanto nos modelos/sistemas de acionamento e desligamento automáticos, quanto nos manuais.
Parágrafo único. Se a câmera apresentar mau funcionamento durante o turno de serviço, o fato deverá ser relatado ao superior imediato tão logo seja seguro fazê-lo, para que se providencie a pronta substituição do equipamento.
Art. 6º - Os agentes de inteligência, no exercício da atividade-fim devidamente autorizada pela chefia competente, ficam isentos das obrigações previstas nos artigos 4º e 5º desta Recomendação.
CAPÍTULO III
DO ARMAZENAMENTO E ACESSO ÀS GRAVAÇÕES
Art. 7º - O conteúdo das gravações será armazenado pelo período mínimo de 3 (três) meses, recomendando-se a extensão para 6 (seis) meses.
§ 1º O período mínimo a que se refere o caput será de 1 (um) ano:
I - quando ocorrer prisão em flagrante ou cumprimento de mandado de prisão;
II - quando ocorrer ingresso em domicílio, com ou sem mandado judicial;
III - quando se efetivar busca pessoal ou veicular;
IV - quando houver disparo de armamento letal;
V - quando houver ofensa à integridade física ou à vida;
VI - quando, no âmbito das atividades prisionais, ao realizar inspeções em celas ou quando houver interação com a pessoa privada de liberdade e/ou que com ela possua vínculo de qualquer natureza.
§ 2º Os períodos de armazenamento estabelecidos no caput e § 1º poderão ser estendidos por determinação administrativa, por requisição do Ministério Público ou por decisão judicial.
§ 3º Mediante decisão judicial, o armazenamento pelo órgão gerador das gravações poderá cessar em período inferior ao estabelecido no caput e § 1º.
§ 4º Em qualquer caso, na pendência de pedido de acesso, de procedimento administrativo ou de processo judicial, o conteúdo das gravações permanecerá armazenado até que sobrevenha decisão judicial transitada em julgado desobrigando o armazenamento.
Art. 8º - Recomendar que o órgão do Ministério Público incumbido do controle externo da atividade policial tenha acesso imediato ao conteúdo das gravações e à eventual transmissão ao vivo (live streaming).
§ 1º Nos casos de prisão em flagrante ou cumprimento de mandado de prisão, quando não for anexado ao APFD ou ao Boletim de Ocorrência, o conteúdo das gravações será disponibilizado ao juízo competente para a realização da audiência de custódia, com o fim de subsidiar o ato.
§ 2º Nos casos de procedimentos disciplinares instaurados contra pessoas privadas do direito de liberdade, o conteúdo das gravações deverá ser anexado.
§3º As corregedorias dos órgãos da segurança pública terão acesso ao conteúdo das câmeras, sempre que solicitado.
Art. 9º - Aquele que demonstrar interesse poderá requerer, fundamentadamente, o acesso ao conteúdo das gravações diretamente ao órgão gerador ou ao Ministério Público no controle externo da atividade policial.
§ 1º Os órgãos de segurança pública devem estabelecer prazos para resposta às solicitações, e eventuais negativas de acesso devem ser respondidas de forma fundamentada.
§ 2º Os órgãos de segurança pública deverão conter em seus meios de comunicação oficial orientação para que interessados possam apresentar seus pedidos de informações e/ou acesso aos conteúdos audiovisuais, com protocolo e procedimentos objetivos.
Art. 10 - O agente público só poderá usar o sistema de câmeras corporais aprovado pelo respectivo órgão de segurança pública, sendo vedado seu uso sub-reptício.
§ 1º É vedado ao agente de segurança pública realizar gravação por meio de dispositivos pessoais para os fins de transmissão, disponibilização, distribuição, publicação ou divulgação, por qualquer meio, inclusive em quaisquer das modalidades das redes sociais da rede mundial de computadores.
§ 2º A divulgação do conteúdo das gravações, ainda que no âmbito institucional, deverá observar as regras e princípios previstos na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais e Lei de Acesso à Informação.
CAPÍTULO IV
DO COMITÊ INTERSETORIAL
Art. 11 - Nos termos do artigo 2º desta Recomendação, recomendar que as unidades federativas instituam Comitês Intersetoriais para regulamentar as medidas para instalação, protocolos de serviços e uso adequado de câmeras corporais para gravação ambiental de vídeos com imagens e sons nos uniformes dos agentes de segurança pública.
Art. 12 - O Comitê Intersetorial será integrado por representantes de órgãos e entidades públicas, contemplando:
I - Representante da Secretaria de Estado da Segurança Pública;
II - Representante da Polícia Militar;
III - Representante da Polícia Civil;
IV - Representante da Polícia Penal;
V - Representante do Corpo de Bombeiros;
VI - Representante do Departamento de Trânsito Estadual e Distrital;
VII - Representante do órgão responsável pela gestão do Sistema Prisional;
VIII - Representante do Ministério Público Estadual e Distrital, responsável pelo controle externo da atividade Policial;
XI - Representante do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário, vinculado ao Tribunal de Justiça.
Parágrafo único. Outras representações da área da segurança pública, bem como entidades da sociedade civil, poderão integrar o Comitê Intersetorial.
Art. 13 - Os órgãos de segurança pública deverão estabelecer programas de treinamento continuado para os seus agentes, que tratem da temática operacional de utilização das câmeras corporais.
CAPÍTULO V
DAS DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 14 - O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), em conjunto com a Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP) e a Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN), poderá desenvolver estudo experimental com os dispositivos, para formação da Política Nacional de Combate a Letalidade das Forças de Segurança Pública e outras medidas, apurando:
I - Opinião dos órgãos de segurança;
II - Opinião da sociedade civil e/ou órgão ou mecanismos de controle das atividades policiais;
III - Estudo estatístico;
IV - Estudo sobre as tecnologias de gravação disponíveis, despesas de aquisição e manutenção dos dispositivos;
V - Estudo sobre a preservação dos direitos fundamentais, especialmente da vida privada, e as proteções cabíveis;
VI - Dados, evidências e experiências dos usuários;
Parágrafo único. Para a consecução da política, poderão ser promovidas sessões e audiências públicas ou outros meios de participação, inclusive por intermédio de cooperações técnicas.
Art. 15 - As disposições desta Recomendação, no que couber, aplicam-se aos setores de segurança e vigilância privada, que desenvolvem atividades de risco e que realizam funções de interação com o público em geral, em estabelecimentos de uso coletivo, privado ou público, disciplinadas pela Portaria DG/PF nº 18.045, de 17 de abril de 2023.
Art. 16 - Recomendar à Polícia Federal que discipline a implementação das diretrizes desta Recomendação às atividades de segurança e vigilância privadas.
Art. 17 - Esta Recomendação se submete à disciplina da Lei Geral de Proteção de Dados, da Lei de Acesso à Informação e do Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil.
Art. 18 - Esta Recomendação entrará em vigor na data de sua publicação.
CINTIA RANGEL ASSUMPÇÃO
Relatora
BRUNO CÉSAR GONÇALVES DA SILVA
Presidente do Grupo de Trabalho
DOUGLAS DE MELO MARTINS
Presidente do Conselho