O Ministério Público do Estado ingressou com ação civil pública para anular a aposentadoria por invalidez do ex-prefeito de Tesouro (a 386 km de Cuaibá), servidor da Secretaria de Fazenda de Mato Grosso, Antônio Leite Barbosa (MDB). Ele chegou a disputar a reeleição em 2020, mas não obteve exito nas urnas.
O MPE cita “eventual ocorrência de ato de improbidade administrativa decorrente da possível fraude nos motivos que levaram à aposentadoria por invalidez do servidor público estadual, lotado na SEFAZ/MT no cargo de agente de Administração Fazendária”. Na ação, o MPE pede a perda do cargo do Antônio Leite Barbosa, mediante aplicação da pena de demissão, uma vez que sua reintegração ao serviço público se demonstra impraticável diante da violação dos deveres de moralidade e ética, conforme demonstrado no escopo probatório.
Consta dos autos que o servidor apresentou à junta da perícia médica estadual, laudo expedido em 05 de abril de 2017 pela médica Thais Zibarth de Melo Lima, a qual descreve que o paciente: “(...) possui sequelas nos pés decorrentes de um quadro de Púrpura Trombocitopênica, em 2003, agravado devido a diabetes, alterações que levaram a amputação ao nível dos dedos e quinto raio do pé direito, amputação parcial dos dedos e quinto raio do pé esquerdo, com perda do coxim gorduroso, lesões cicatriciais e calosidades”. Relata a médica ainda, que o servidor apresentaria sequelas permanentes com incapacidade total para realização das suas funções de trabalho.
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Contudo, segundo o MPE, após alegações decorrentes da denúncia de que o servidor teria realizado tais amputações entre o período de 1981 e 1982 no Hospital Samaritano de Mineiros – GO, a Promotoria remeteu o Ofício para o estabelecimento e solicitou o encaminhamento de fichas correspondentes a tratamentos clínicos e/ou cirúrgicos aos quais o servidor teria se submetido. Em resposta, conforme o MPE, o Hospital Samaritano de Mineiros encaminhou as fichas do denunciado em 14 de dezembro de 2018, das quais o órgão constatou que houve a amputação dos dedos de ambos os pés em 22/10/1981 e que em 28/01/1982 precisou ser internado para operar ossos expostos no pé.
“Portanto, as fichas médicas citadas denotam que o Réu já possuía a comorbidade descrita no Laudo Médico emitido pela médica Thais Zibarth de Melo Lima, desde janeiro de 1982. Desta feita, um ponto que chama atenção à situação da aposentadoria é que o servidor assumiu o cargo de agente de Administração Fazendária em 11 de abril de 1994, ou seja, em data na qual já se encontrava com os dedos dos pés amputados, porém omitiu tal informação quando do ingresso no serviço público e veio a trabalhar durante 15 anos e 9 meses com a enfermidade, culminando com seu requerimento de aposentadoria somente no dia 31 de janeiro de 2014” destaca o MPE.
Dentre as atribuições de um agente administrativo da SEFAZ/MT, o MPE cita: realizar os atos e decidir os processos de vistoria prévia para a homologação de inscrição estadual ou alteração cadastral; realizar os atendimentos nas agências fazendárias, executar os atos e decidir os processos e procedimentos de cadastros, de alterações cadastrais, de reativação, de baixas ou de paralisação temporária de inscrições estaduais; exercer a fiscalização do trânsito de mercadorias, com exercício pleno do poder de polícia, inclusive por meio da apreensão e lavratura de termo próprio com a tipificação da infringência pelo sujeito passivo, capitulação legal e base de cálculo do ato ilícito, ressalvada a constituição do crédito tributário; executar regimes ou sistemas especiais de fiscalização e controle da arrecadação, inclusive cautelar, conforme dispuser na legislação estadual, podendo promover averiguação nas bases de informações fazendárias, reter documentos, bens ou mercadorias, a serem utilizados no processo de fiscalização e controle das operações; participar de ações e atividades técnicas tributárias, gerar condições e meios que fortaleçam a difusão do risco fiscal e o cumprimento voluntário das obrigações tributárias pelo contribuinte; e manifestar-se em processos administrativos tributários decorrentes do desempenho de suas atribuições.
Assim, o MPE conclui que o trabalho desempenhado pelo servidor era meramente intelectual, motivo pelo qual sua enfermidade nunca havia sido um empecilho para o desenvolvimento da função até 31/01/2014. “Além disso, mesmo havendo requerido o benefício de aposentadoria por eventual incapacidade laborativa no desempenho de suas funções, o requerido se candidatou e ganhou as eleições municipais de 2016, tornando-se prefeito da cidade de Tesouro” aponta o MPE.
Para o MPE, para ocupar o cargo de prefeito de um município, isto é, de gestor de uma cidade, possui funções análogas ao de Agente Fazendário, do qual se aposentou por invalidez, porque não dizer, muito mais “penosas” que a do agente estadual.
“Assim, restou demonstrado haver incoerências no processo de aposentadoria de Antônio Leite Barbosa, uma vez que o denunciado apresentou laudo médico informando que o motivo da amputação de seus pés se deu por conta de uma doença acometida em 2003, quando na verdade os fatos revelam que as amputações ocorreram entre 1981 e 1982, no Hospital Samaritano de Mineiros. Diante disso, o motivo que deu causa à aposentadoria do Réu Antônio Leite Barbosa, era preexistente ao exercício de suas atribuições na função de agente público estadual, assim tais enfermidades não poderiam ser utilizadas como causa da aposentadoria por invalidez por ele requerida” enfatiza.
Conforme o MPE, apesar de o procedimento de aposentadoria ter sido analisado por uma junta de médicos, estes estão adstritos aos fatos e elementos trazidos no processo administrativo, não cabendo aos peritos responsáveis pela análise a valoração da credibilidade dos documentos que instruíram respectivos procedimentos, já que se presumem verdadeiros. “Todavia, tal premissa não pode ser estendida ao pleiteante do benefício, pois este utilizou-se de subterfúgio para levar a erro a Administração Pública de forma a conceder-lhe privilégio ao qual não teria direito. Tanto é assim que o Réu jamais esteve impossibilitado do exercício de suas funções como Agente Administrativo, já que, tão logo surgiu a oportunidade candidatou-se ao cargo máximo de um município, vindo a exercer o munus publico durante quatro anos” ressalta.
Diante do vício insanável encontrado no ato administrativo que concedeu a aposentadoria ao ex-prefeito, o MPE pede sua anulação.
“Não escusando-se o julgador de ponderar também que referido ato foi motivado por informações fraudulentas intencionalmente fornecidas pelo Réu, o qual, agindo de má fé, vem prejudicando o erário estadual desde o dia em que a benesse lhe foi concedida. Em face ao exposto, de forma a ver expurgada a ilegalidade, a inconstitucionalidade e a imoralidade no caso concreto ora discutido é que o Ministério Público propõe a presente Ação Anulatória de Ato Administrativo, buscando a declaração de nulidade do ato que aposentou por invalidez permanente o Réu ANTÔNIO LEITE BARBOSA”.
Ao final, o MPE salienta que, uma vez anulado o ato administrativo, é como se este jamais houvesse existido, diante disso, Antônio Leite estaria ainda na condição de servidor público ativo, motivo pelo qual, a má-fé perpetrada e a violação dos deveres funcionais intrínsecos à função pública, caracteriza a conduta ímproba prevista no caput do artigo 11º da Lei de Improbidade Administrativa.
"É certo que os motivos fraudulentos que levaram à aposentadoria do Réu, foram fornecidos à Administração Pública enquanto o Réu ainda exercia o munus público, portanto, presentes os requisitos para aplicação da sanção prevista no art. 161 da Lei Complementar nº 04/1990. Cessado o ato administrativo de aposentação do Réu, uma vez que este não se encontra invalidado para desempenho de suas funções, ter-se-á um agente público que, mediante motivos fraudulentos, levou a erro a Administração e, em razão disso, permaneceu sem exercer a função ao qual era obrigado, porém, manteve o recebimento de seus vencimentos, tendo assim causado danos vultosos ao erário estadual. Portanto, tal agente, cometeu falta grave durante o exercício de suas atribuições, pois violou os princípios administrativos basilares do serviço público, tais como legalidade e moralidade, portanto necessário se faz reconhecer a perda do cargo do Sr. Antônio Leite Barbosa, mediante aplicação da pena de demissão, uma vez que sua reintegração ao serviço público se demonstra impraticável diante da violação por parte do réu dos deveres de moralidade e ética, conforme demonstrado no escopo probatório" diz o MPE.
“Além disso, ao desfrutar de uma aposentadoria a qual jamais teve direito, o Réu deixou de exercer o munus público, porém vem recebendo mensalmente seu subsídio o que denota a existência do enriquecimento ilícito (art. 9º, LIA) e dano ao erário Logo além da anulação do ato indigitado, necessária também, a condenação de Antônio Leite Barbosa por atos de improbidade administrativa nos termos dos arts. 9º a 11 da Lei nº 8.429/92 com a consequente perda do cargo público” requer o MPE.
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