Ameaçado de implosão pelos desdobramentos da Operação Lava jato, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) decidiu dobrar a aposta. Ele sinaliza para os seus aliados que está estocando dinamite. “Eu vou explodir o governo”, declara em privado o presidente da Câmara. Terceira autoridade na linha de sucessão, Cunha imaginava-se portador de um destino. Começa a perceber que virou uma fatalidade. E não parece disposto a ruir sozinho.
Alvejado pelo depoimento do delator Júlio Camargo, um consultor que o acusa de ter cobrado propina de US$ 5 milhões num contrato de navios-sonda da Petrobras, Cunha ergueu um universo paralelo para lhe servir de refúgio. Nesse universo particular, Cunha é vítima de um complô urdido pelo governo e pela Procuradoria da República para fazer de um deputado modelo um político desonesto.
Dias atrás, em conversa com o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça), Cunha acusou-o de tramar com o procurador-geral da República Rodrigo Janot para prejudicá-lo. Alheio às negativas do interlocutor, Cunha ameaçou converter a rotina do governo na Câmara num inferno. Noutro encontro, tratou do impeachment de Dilma com o deputado Arthur Lira (PP-AL), presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ).
Também investigado na Lava Jato, o deputado Lira queria saber se um pedido de impeachment de Dilma passaria pela comissão que dirige. Cunha explicou que o rito de tramitação de um processo de afastamento de presidente da República não passa pela CCJ. E revelou como planeja agir: em vez de tomar decisões solitárias, submeterá a encrenca à deliberação do plenário da Câmara.
Ao inquirir Júlio Camargo em Curitiba, o juiz Sérgio Moro quis saber por que ele não mencionara antes o enredo que envolve Eduardo Cunha. O delator explicou que, ao depor para a força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, fora informado de que acusados com foro privilegiado não deveriam ser citados senão em Brasília. Esclareceu que, convocado pelo Ministério Público Federal, na Capital, contou sobre a propina de Cunha. Disse, de resto, que silenciara antes por receio de que Cunha prejudicasse seus familiares.
Noutro trecho do depoimento, o advogado Nélio Machado, a serviço de Cunha, insinuou que Júlio Camargo mentia. E perguntou se ele havia citado o deputado nos depoimentos prestados em Brasília. O delator refutou a pecha de mentiroso e respondeu afirmativamente. Disse que levara Cunha ao ventilador em dois depoimentos à Procuradoria-Geral da República —o primeiro deles há cerca de três meses.
Cunha arma emboscadas para Dilma na volta das férias do Legislativo, em agosto. Age em combinação com o presidente do Senado, Renan Calheiros, outro investigado da Lava Jato que busca refúgio atrás da tese do sítio do Planalto e da Procuradoria ao Congresso. A dupla trama inaugurar CPIs sobre Fundos de Pensão e BNDES nas duas Casas. As comissões do Senado já foram encaminhadas.
Com a bússola quebrada, o Planalto avaliara que o avanço da Lava Jato sobre os investigados com mandato levaria a um recuo de Cunha e Renan. Deu-se, porém, o oposto. Na definição de um cacique do PMDB, os presidentes da Câmara e do Senado comportam-se como “camicases” —uma referência aos pilotos da força aérea japonesa que realizavam ataques suicidas contra armadas inimigas.
Suprema ironia: com o mandato sob questionamento, Dilma tem como principais opositores dois expoentes do PMDB do vice-presidente Michel Temer. A oposição, por ora, joga parada, observando o canibalismo da coligação governista.
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