Ao negar o pedido liminar de Habeas Corpus ao ex-governador Silval Barbosa (PMDB), preso desde 17 de setembro por comandar organização criminosa para extorquir e lavar dinheiro por meio de concessões de incentivos fiscais no Estado, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, destacou que o peemedebista era quem comandava o “esquema fraudulento”.
De acordo com Fachin, ao analisar a decisão de primeiro grau, que decretou a prisão preventiva de Silval, constatou diversas passagens probatórias de atos materiais supostamente praticados por Pedro Nadaf e Marcel de Cursi, com a indicação de possível controle de Silval, única pessoa à qual incumbia o poder legal de concessão do benefício tida como irregular.
“Nesse cenário, e considerando os demais indícios colacionados, não vejo como absurda a tese acusatória que atribui ao paciente o controle da ação tida como delituosa. Ainda nessa linha, ao contrário do apontado pelo impetrante, ao que parece, não se trata de mera tentativa de censura penal objetiva ou de utilização de fundamentos aplicáveis tão somente em desfavor de terceiros, visto que se perquire a prática de fatos com suposto conteúdo criminoso e cuja materialização é imputada, direta ou indiretamente, ao ex-governador” argumentou Fachin.
O ministro destacou ainda, a intenção do peemedebista em prejudicar as investigações que culminaram em sua prisão. “Ademais, do que se tem notícia, o paciente, ao contrário de terceiros beneficiados com medida não corporal, prosseguiria tencionando prejudicar à investigação, razão essencial de decidir” diz trecho da decisão.
Barbosa tentava reverter decisão monocrática, proferida no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que indeferiu o pedido de sua liberdade. Silval Barbosa, na então condição de governador de Mato Grosso, é acusado de praticar os crimes de concussão, extorsão, formação de organização criminosa e lavagem de dinheiro.
Em conluio com mais cinco pessoas, alguns deles agentes públicos, teria concedido benefícios fiscais de forma irregular a empresas de propriedade de João Batista Rosa. Em contrapartida, o empresário teria sido constrangido a pagar vantagem indevida destinada ao suprimento de caixa de campanha. Em seguida, o grupo teria empreendido manobras a fim de conferir aparência de licitude aos valores recebidos - simulação de contratos de consultoria e negociações de títulos mediante utilização de factoring.
A defesa de Silval alegou que “inexistem indícios robustos de autoria a sustentar a medida excepcional, visto que as decisões restringem-se a inferir a participação dele a partir de meras ilações, como uma suposta ligação entre o então governador e os demais agentes alvos da apuração”. Argumentou ainda que a presunção de que Silval esteja por trás dos fatos investigados, simplesmente por ter ocupado o cargo de governador, não legitima a drástica prisão processual. Porém, as teses foram combatidas pelo ministro do STF.
Confira decisão na íntegra:
Decido. 1. Cabimento do habeas corpus: 1.1. Inicialmente, destaco que esta Corte tem posição firme pela impossibilidade de admissão de habeas corpus impetrado contra decisão proferida por membro de Tribunal Superior, visto que, a teor do artigo 102, I, “i”, da Constituição da República, sob o prisma da autoridade coatora, a competência originária do Supremo Tribunal Federal somente se perfectibiliza na hipótese em que Tribunal Superior, por meio de órgão colegiado, atue em tal condição. Nessa linha, cito o seguinte precedente: “É certo que a previsão constitucional do habeas corpus no artigo 5º, LXVIII, tem como escopo a proteção da liberdade. Contudo, não se há de vislumbrar antinomia na Constituição Federal, que restringiu a competência desta Corte às hipóteses nas quais o ato imputado tenha sido proferido por Tribunal Superior. Entender de outro modo, para alcançar os atos praticados por membros de Tribunais Superiores, seria atribuir à Corte competência que não lhe foi outorgada pela Constituição. Assim, a pretexto de dar efetividade ao que se contém no inciso LXVIII do artigo 5º da mesma Carta, ter-se-ia, ao fim e ao cabo, o descumprimento do que previsto no artigo 102, I, “i”, da Constituição como regra de competência, estabelecendo antinomia entre normas constitucionais. Ademais, com respaldo no disposto no artigo 34, inciso XVIII, do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, pode o relator negar seguimento a pedido improcedente e incabível, fazendo-o como porta-voz do colegiado. Entretanto, há de ser observado que a competência do Supremo Tribunal Federal apenas exsurge se coator for o Tribunal Superior (CF, artigo 102, inciso I, alínea “i”), e não a autoridade que subscreveu o ato impugnado. Assim, impunha-se a interposição de agravo regimental” (HC 114557 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 12/08/2014, grifei). Nessa perspectiva, tem-se reconhecido o descabimento de habeas corpus dirigido ao combate de decisão monocrática de indeferimento de liminar proferida no âmbito do STJ. Tal entendimento pode ser extraído a partir da leitura da Súmula 691/STF: “Não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar.” 1.2. Ademais, não se inaugura a competência deste Supremo nas hipóteses em que não esgotada a jurisdição antecedente, visto que tal proceder acarretaria indevida supressão de instância, dado o cabimento de agravo regimental. Precedentes: “Há óbice ao conhecimento de habeas corpus impetrado contra decisão monocrática do Superior Tribunal de Justiça, cuja jurisdição, à falta de manejo de agravo regimental ao Colegiado, não se esgotou.” (HC 123926, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 14/04/2015, grifei) “Inexistindo deliberação colegiada do Superior Tribunal de Justiça a respeito da questão de fundo suscitada pelo impetrante, não compete ao Supremo Tribunal Federal analisá-la originariamente, sob pena de indevida supressão de instância.” (HC 124561 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 10/02/2015, grifei) 1.3. Outrossim, o sistema de recursos e meios de impugnação previsto na Constituição Federal, lida enquanto regra de distribuição de competências, tem uma razão de ser. Nessa ótica, não há como se admitir habeas corpus impetrado em substituição a instrumento recursal constitucionalmente previsto, como são os recursos ordinário e extraordinário. Nesse sentido: “A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade do uso da ação de habeas corpus em substituição ao recurso ordinário previsto na Constituição Federal.” (Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, grifei). “A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal consolidou o entendimento no sentido da inadmissibilidade da impetração de habeas corpus em substituição ao recurso extraordinário, previsto no art. 102, III, da Constituição Federal.” (HC 126934 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 28/04/2015, grifei) 1.4. Argumento ainda que a Corte compreende que, ordinariamente, o habeas corpus não se presta a rescindir provimento condenatório acobertado pelo manto da coisa julgada, daí a impossibilidade de figurar como sucedâneo de revisão criminal. Acerca do tema: “O Supremo Tribunal Federal não admite a utilização do habeas corpus em substituição à ação de revisão criminal.” (HC 128693 AgR, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 04/08/2015, grifei) “O habeas corpus não pode ser utilizado como sucedâneo de revisão criminal.” (HC 123430, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 14/10/2014, grifei) “(...) habeas corpus não pode ser utilizado, em regra, como sucedâneo de revisão criminal, a menos que haja manifesta ilegalidade ou abuso no ato praticado pelo tribunal superior.” (HC 86367, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 30/09/2008, grifei) 1.5. Ademais, a Constituição atribui ao Superior Tribunal de Justiça a competência final para empreender juízo de admissibilidade de recurso especial, de modo que tal decisão não é hostilizável via habeas corpus, salvo hipótese de absoluta teratologia. Precedentes: “Compete constitucionalmente ao Superior Tribunal de Justiça o julgamento do recurso especial, cabendo-lhe, enquanto órgão ad quem, o segundo, e definitivo, juízo de admissibilidade positivo ou negativo quanto a tal recurso de fundamentação vinculada. Salvo hipóteses de flagrante ilegalidade ou abuso de poder, inadmissível o reexame dos pressupostos de admissibilidade do recurso especial pelo Supremo Tribunal Federal. Precedentes.” (HC 128110 AgR, Relator(a): Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 30/06/2015, grifei) “O Superior Tribunal de Justiça é a jurisdição final sobre os pressupostos de admissibilidade do recurso especial, motivo pelo qual não pode o Supremo Tribunal Federal reapreciar tais requisitos e o rejulgar do recurso, salvo, por se tratar de habeas corpus, na hipótese de flagrante ilegalidade.” (HC 85.195/RS, 1ª T., Min. Ayres Britto, DJ 07/10/2005, grifei) 1.6. No caso concreto, por contrariar frontalmente a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, o habeas corpus não merece conhecimento por atacar decisão monocrática que indeferiu liminar, circunstância que atrai a incidência da Súmula 691/STF. 2. Possibilidade de concessão da liminar de ofício: Ainda que ausentes hipóteses de conhecimento, a Corte tem admitido, excepcionalmente, a concessão da ordem de ofício. Calha enfatizar que tal providência tem sido tomada tão somente em casos absolutamente aberrantes e teratológicos, em que “a) seja premente a necessidade de concessão do provimento cautelar para evitar flagrante constrangimento ilegal; ou b) a negativa de decisão concessiva de medida liminar pelo tribunal superior importe na caracterização ou na manutenção de situação que seja manifestamente contrária à jurisprudência do STF” (HC 95009, Rel. Min. Eros Grau, Tribunal Pleno, julgado em 06/11/2008, grifei). Devido ao caráter excepcional da superação do verbete sumular, a ilegalidade deve ser cognoscível de plano, sem a necessidade de produção de quaisquer provas ou colheita de informações. Nesse sentido, não pode ser atribuída a pecha de flagrante à ilegalidade cujo reconhecimento demande dispendioso cotejamento dos autos ou, pior, que desafie a complementação do caderno processual por meio da coleta de elementos externos. Como reforço, cumpre assinalar que o Código de Processo Penal, ao permitir que as autoridades judiciárias concedam a ordem de ofício em habeas corpus, apenas o fez quanto aos processos que já lhes são submetidos à apreciação: “Art. 654. (…) (…) § 2o Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.” De tal modo, ao meu sentir, não se admite que o processo tenha como nascedouro, pura e simplesmente, a alegada pretensão de atuação ex officio de Juiz ou Tribunal, mormente quando tal proceder se encontra em desconformidade com as regras de competência delineadas na Constituição da República. Em outras palavras: somente se cogita da expedição da ordem de ofício nas hipóteses em que não se desbordar da competência do órgão, de modo que essa não pode ser a finalidade precípua da impetração. 3. Análise da possibilidade de concessão da medida liminar de ofício no caso concreto: Num juízo de cognição sumária, próprio desta fase processual, não vislumbro ilegalidade flagrante na decisão atacada a justificar a concessão da liminar. Cumpre assinalar, por relevante, que o deferimento da medida liminar, resultante do concreto exercício do poder geral de cautela outorgado aos juízes e tribunais, somente se justifica em face de situações que se ajustem aos seus específicos pressupostos: a existência de plausibilidade jurídica (fumus boni juris), de um lado; e a possibilidade de lesão irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora), de outro. Sem que concorram esses dois requisitos, essenciais e cumulativos, não se legitima a concessão da medida liminar. Quanto à inexistência de indícios mínimos da autoria delitiva, cumpre salientar que, nesta etapa, ainda embrionária, não se exige a presença de provas robustas e aptas a lastrear um édito condenatório. Em verdade, a medida cautelar contenta-se com um substrato mínimo a conferir plausibilidade indiciária à apuração. No caso concreto, noto que o decreto preventivo descreve diversos fundamentos destinados a amparar a viabilidade da medida. Nessa perspectiva, o Juiz da causa, em minuciosa decisão, aponta, em breve síntese, que: a) teria ocorrido inversão cronológica em documentos carreados ao processo administrativo que culminou na concessão de benefício fiscal em favor de JOÃO BATISTA (por exemplo: processo administrativo instaurado em 01.09.2011 e desde logo instruído com contrato social datado de 2012. E ainda, a consulta, que seria o primeiro ato do processo administrativo, também é datado de 12.09.2012), a sugerir a realização de fraude. Também não teria sido realizada vistoria no estabelecimento empresarial, o que teria sido confirmado por despacho de agente público e pelas declarações do empresário colaborador. Tal proceder macularia as normas de concessão do beneplácito fiscal em comento; b) tais irregularidades teriam sido praticadas de modo proposital, a fim de condicionar a manutenção do benefício fiscal irregularmente concedido ao recebimento de quantia a ser paga habitualmente pelo empresário. Ou seja, o suposto grupo criminoso teria se utilizado da precariedade decorrente da concessão irregular do benefício como garantia de recebimento de propina; c) o próprio Governador editou o decreto que confere ao interessado o favor fiscal. O ato administrativo ainda atestava que as empresas de propriedade de JOÃO BATISTA (Tractor Parts, DCP Máquinas e Casa de Engrenagem) haviam sido submetidas a procedimento de vistoria. Contudo, o decreto (utilizado indevidamente, no ponto, como ato enunciativo) não se conforma com as atribuições comuns do cargo de exercido, notadamente associadas a atos de direção. Tal circunstância, no entender do Magistrado, insinuaria eventual motivação específica e espúria da prática do administrativo; d) os valores seriam repassados ao suposto grupo mediante a instrumentalização de terceiros ou diretamente aos investigados. Nesse ponto, a decisão menciona que foram identificadas 56 (cinquenta e seis) pessoas que, em tese, exerciam essa função e guardam vinculação à gestão do ex-governador. Ademais, teria sido objeto de simulação um contrato de consultoria firmado entre JOÃO BATISTA ROSA e a NBC ASSESSORIA (de propriedade do investigado PEDRO NADAF, que ocupava o cargo de Secretário de Indústria, Comércio, Minas e Energia e, em seguida, de Secretário da Casa Civil do Estado do Mato Grosso na gestão do Governador SILVAL DA CUNHA BARBOSA); e) alguns cheques (que somados equivalem ao valor aproximado de quinhentos mil reais) emitidos pelas empresas TRACTOR PARTS e DCP MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS, de propriedade de JOÃO BATISTA ROSA, foram recebidos na empresa de factoring do colaborador FREDERICO MULLER COUTINHO. Na oportunidade, os títulos teriam sido apresentados por FRANCISCO GOMES DE ANDRADE LIMA FILHO (o “Chico Lima”), ex-procurador do Estado do Mato Grosso. Em razão de pendências decorrentes da devolução de cheques, Chico Lima foi questionado, oportunidade em que teria afirmado ao colaborador (sem grifo no original): “Calma que essa resolução você sabe que não é pra mim, você sabe que todas essas operações de cheques não são para mim, que estou resolvendo problema para outras pessoas e você sabe quem é”. Ao ser reinquirido acerca dos fatos, FREDERICO MULLER COUTINHO acrescentou (sem grifo no original): “Chico Lima expressamente disse que: “não posso assinar uma promissória em meu nome, assumindo uma dívida pelo fato de estar aqui representando interesse de Silval Barbosa”. Ou seja, há relato específico associando, pessoalmente, o paciente ao recebimento de vantagens indevidas, supostamente percebidas em razão da função pública então exercida de Governador do Estado de Mato Grosso; f) SILVAL figurava como líder da organização, contando com o auxílio direto de PEDRO NADAF e MARCEL CURSI, que atuavam como emissários e negociavam diretamente com o empresário. Nessa linha, a decisão colaciona diversas passagens probatórias de atos materiais supostamente perpetrados por PEDRO e MARCEL, com a indicação de possível controle de SILVAL, única pessoa à qual incumbia o poder legal de concessão do benefício tida como irregular. Nesse cenário, e considerando os demais indícios colacionados, não vejo como absurda a tese acusatória que atribui ao paciente o controle da ação tida como delituosa. Ainda nessa linha, ao contrário do apontado pelo impetrante, ao que parece, não se trata de mera tentativa de censura penal objetiva ou de utilização de fundamentos aplicáveis tão somente em desfavor de terceiros, visto que se perquire a prática de fatos com suposto conteúdo criminoso e cuja materialização é imputada, direta ou indiretamente, ao ex-governador. Registro que a análise da higidez dos acordos de colaboração premiada revela-se completamente prematura. Ademais, a alegação veio desprovida de comprovação pré-constituída de práticas que imprimam credibilidade à ausência de voluntariedade do meio de obtenção de prova. Diante desse cenário, e considerando que a concessão de liminar em writ impetrado na hipótese da Súmula 691/STF reclama manifesta aberração do ato decisório, reconheço a existência de fundamentação mínima e afasto as teses defensivas “c”, “d”e “e”. No que toca ao periculum in libertatis, ao meu sentir, o decisum ancorou-se em fundamentos de aparente idoneidade, vez que associados ao caso concreto e dirigidos a finalidades legítimas, como a proteção da instrução processual e da ordem pública. Cumpre elencar os seguintes elementos de cautelaridade relatados pelo Juiz singular: a) Os emissários do paciente, notadamente PEDRO JAMIL NADAF e MARCEL SOUZA DE CURSI, teriam tentado intimidar JOÃO BATISTA ROSA, colaborador aparentemente visto como essencial ao sucesso da apuração. Inicialmente, a dupla teria passado a assediá-lo, com o intuito de agendar reuniões, inclusive com a menção da suposta interferência de parlamentares a fim de frustrar os resultados positivos eventualmente gerados pela “CPI da Renúncia e da Sonegação Fiscal”, investigação parlamentar instaurada no âmbito do Estado do Mato Grosso com a finalidade de esclarecer possíveis irregularidades, ocorridas durante a gestão do paciente, voltadas à concessão irregular de benefícios fiscais. Também se relata que MARCEL DE CURSI teria encaminhado mensagens de texto por meio de aplicativo de conversa instantânea ao colaborador reproduzindo notícia em que se reconhece que os incentivos fiscais praticados no Estado de Mato Grosso seriam considerados um “caso de polícia”, insinuando que o empresário poderia acabar responsabilizado. Ademais, a defesa administrativa de JOÃO ficaria a cargo do próprio MARCEL DE CURSI, com o suposto intento de neutralizar potenciais efeitos deletérios da livre insurgência do empresário. Não bastasse, o colaborador informou que estaria sofrendo abordagens de terceiros vinculados à dupla. A esse propósito, em âmbito policial, relatou (sem grifo no original): “O declarante diz ainda que na data de ontem, no período vespertino foi procurado pelo Sr. Paulo Gasparoto, amigo do declarante, onde esse lhe informou que Pedro Nadaf havia lhe procurado para saber se o declarante havia feito uma “delação premiada”, pois Pedro teria tido essa informação. (…) o declarante quer deixar consignado ainda que as procuras incessantes do Pedro Nadaf tem causado problemas de saúde e psicológicos e que existe um temor não só com a integridade física sua como de seus familiares.” Quanto à ciência da delação, segundo o Juiz da causa, “a organização criminosa fez questão de cientificar o colaborador que já sabia que o mesmo estaria entabulando uma delação premiada, na clara intenção de demonstrar seu poder de obter informações sigilosas e intimidar o empresário.” b) Ademais, nos termos da decisão que decretou a custódia preventiva, além das investidas contra o colaborador, a organização estaria envidando esforços, por meio de articulações políticas, a fim de blindar seus integrantes. A esse respeito, o Juiz singular pontuou: “Além disso, o próprio JOÃO BATISTA declara que, quando a CPI da Sonegação citou os nomes de suas empresas, PEDRO JAMIL NADAF teria lhe dito “...fique tranquilo vamos resolver estou indo na casa de Silval para entrar no circuito”. Sendo assim, diante da notícia de possível interferência nos trabalhos de investigação parlamentar, afigura-se razoável que, em apuração policial, se encontrarem estímulos, os investigados poderão fazer uso de práticas tendentes ao prejuízo da persecução. Como se vê, resta sinalizado que os investigados têm se dedicado a dificultar a produção da prova, providência que, aliada aos indícios de controle do paciente quanto à destinação da propina supostamente percebida, ao menos nesta etapa processual, sugerem plausibilidade ao decreto segregatório e recomendam o acautelamento do paciente. Já no que se refere à indispensabilidade da medida, anoto que, além dos entraves à higidez da produção e colheita da prova, a decisão singular indica que “a forma atroz e ardilosa, que possibilitou que o empresário fosse achacado durante anos a fio denota o grau de periculosidade extremado da organização e sua capacidade de articulação”, de modo que há descrição do risco à ordem pública gerado a partir da gravidade concreta da conduta supostamente praticada. Em seguida, aponta, de forma expressa, a prisão preventiva “como único meio capaz de tutelar a livre produção de prova se impedir que os agentes criminosas destruam ou manipulem provas e ameacem testemunhas”, razão pela qual se excluiu “logicamente, a possibilidade da aplicação de quaisquer das medidas do artigo 319 do CPP”. Nessa ótica, a despeito do caráter excepcional e subsidiário da prisão preventiva, a decisão compreendeu que a custódia ante tempus constituía a única garantia idônea aos objetivos traçados, de modo que, ao meu sentir, há sim fundamentação mínima da opção cautelar a ser empregada. Obtempero que as condutas a partir das quais emergem o risco traçado pelo Estado-Juiz teriam sido praticadas, em tese, em momentos posteriores à cessação do mandato eletivo do paciente e/ou desbordando da atuação governamental (vide suposta interferência em CPI e abordagens ostensivas do colaborador). Dito isso, nota-se que não há correspondência necessária entre o efetivo exercício da função pública e os requisitos da custódia preventiva, daí a insuficiência da cautelar de afastamento da função. Não bastasse, as medidas cautelares propostas pelo impetrante apenas reforçam o aparente acerto da decisão. Com efeito, o mero comparecimento periódico em Juízo e a vedação de ingresso em determinadas repartições públicas consubstanciam restrições insuficientes ao risco processual a ser neutralizado, conforme descrito alhures. Outrossim, a concessão de medidas alternativas em favor de outros investigados não configura mácula à isonomia, na medida em que não há comprovação da identidade fática e processual, pois tais medidas foram reservadas a atores de aparente atuação secundária no contexto supostamente criminoso. Ademais, do que se tem notícia, o paciente, ao contrário de terceiros beneficiados com medida não corporal, prosseguiria tencionando prejudicar à investigação, razão essencial de decidir. No que toca à suposta presença de condições subjetivas favoráveis, perfilho do entendimento consolidado da Corte no sentido de que tais circunstâncias não impedem a decretação da prisão preventiva, quando presentes os requisitos previstos no artigo 312 do Código de Processo Penal. Nessa linha, deixo de acolher os argumentos elencados nos itens “f” a “m” da impetração. Destarte, ausente teratologia evidente, e sem prejuízo de ulterior reapreciação da matéria no julgamento final do presente habeas corpus, indefiro a liminar. Colham-se as informações da autoridade apontada como coatora e do Juiz de primeiro grau. Vista à PGR. Publique-se. Intime-se. Brasília, 30 de setembro de 2015. Ministro Edson Fachin Relator Documento assinado digitalmente
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