A desembargadora do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ/MT), Maria Erotides, em decisão proferida há pouco, negou pedido de Humberto Bosaipo para anular seu ato de renúncia de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE/MT), e manteve a posse de Guilherme Maluf (PSDB) no cargo.
Bosaipo alegou nos autos que em 2013 vivia um contexto de extrema turbulência emocional que abalou sua saúde física e mental, com sintomas de depressão, ansiedade e desequilíbrio psicológico, a ponto de, em 02/12/2014, internar-se no Hospital Adventista de São Paulo para “desestressamento”, quando passou a fazer uso de diversos medicamentos cujos efeitos colaterais incluem alucinações, delírios e confusão mental.
Argumentou ainda, que quando renunciou ao cargo de conselheiro, em 05 de dezembro de 201, estava internado e sob efeito dos medicamentos, período no qual alternava momentos de aparente lucidez e de evidente confusão mental.
No entanto, a desembargadora entendeu que "as razões do Agravante permeiam apenas o âmbito das alegações, despidas, por hora, de comprovação da relação efetiva do quadro clínico do ex- Conselheiro do TCE/MT e a renúncia, inclusive, porque, entre o ato (2014) e a judicialização da questão (final de 2018), há considerável lapso temporal".
"Forte nessas razões, INDEFIRO o pedido de liminar vindicado por Humberto Antônio Bosaipo. Intime-se o Agravado para contraminutar o Agravo, facultando-lhe a juntada da documentação que entender necessária para o julgamento do Recurso. Comunique-se ao Juízo da causa" diz decisão.
Confira decisão na íntegra, obtida em primeira mão pelo oticias:
Trata-se de Agravo de Instrumento, com pleito liminar, interposto por Humberto Melo Bosaipo, contra a decisão proferida pelo Juízo da Terceira Vara Especializada da Fazenda Pública da Comarca de Cuiabá, nos autos de Pedido Incidental de Tutela Provisória de Urgência em Ação Anulatória de Ato Jurídico nº 1045189-48.2018.8.11.0041, que indeferiu seus requerimentos, consistente na suspensão da eficácia do Ato da Presidência nº 163/2014 e a abstenção em dar posse a indicado para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas.
Alega o Recorrente que, ao contrário da decisão de Primeiro Grau, há o preenchimento dos requisitos concessivos da tutela antecipada, especialmente porque o pedido está fundado em provas que evidenciam a probabilidade do direito, bem como no perigo de dano grave e de difícil reparação.
Argumenta que o deferimento da medida é necessário, pois, embora a Ação Anulatória de Ato Jurídico tenha sido proposta em 2018, em fevereiro deste ano, o Ministro do Supremo Tribunal Federal Edson Fachin, em 06/02/2019, extinguiu, monocraticamente, a ADI 4182, pela perda do objeto, bem como revogou a liminar expedida em 23/12/2014, permitindo, desse modo, que a Assembleia Legislativa de Mato Grosso procedesse à indicação de candidatos à vaga do Agravante para a função de Conselheiro do TCE.
Nessa quadra, o Agravante aduz que, após a indicação de vários candidatos, foi escolhido o Deputado Guilherme Malouf, quem, com a conclusão de todo o procedimento previsto, será empossado.
Posto isso, no entender do Recorrente, em razão da probabilidade de procedência da ação de Primeiro Grau, que o colocará no cargo de Conselheiro do TCE, o perigo de dano grave e de difícil reparação recai na ocupação da vaga por aquele Deputado indicado, o que tornará inútil o eventual resultado positivo da lide.
Feitas essas considerações, pretende o provimento do Agravo ao argumento de que o deferimento da liminar, em seu favor, visa assegurar a efetividade do direito postulado pelo Autor na Ação principal.
Junta documentos pertinentes ao pedido, em especial cópia da convocação dos membros do TCE para a Sessão Especial de Posse do Deputado Guilherme Antônio Maluf, no Cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas.
É o relatório.
Decido.
Conforme consignado no relatório, pretende o Agravante a suspensão dos efeitos do Ato da Presidência nº 163/2014, referente à sua renúncia ao cargo de Conselheiro do TCE, bem como a determinação a este órgão de contas para que não dê posse ao Dep. Guilherme Antônio Maluf, na cerimônia de hoje (01/03/2019), prevista pras 14 horas.
Sabe-se que, no âmbito recursal, para o deferimento do pedido de tutela antecipada, cabe ao relator do agravo de instrumento avaliar se é caso de conceder, liminarmente, a antecipação da tutela da pretensão recursal, consoante a norma procedimental do artigo 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil, e que, nessa medida, o pleito somente será concedido nos casos em que houver probabilidade de provimento do recurso e risco de dano grave, ou de difícil reparação, por aplicação analógica ao artigo 1.012, parágrafo 4o do CPC.
Nessa quadra, argumenta o Recorrente que preenche os mencionados requisitos, ao passo que, ajuizada a Ação Anulatória de Ato Jurídico, com o fim de que seja declarada a nulidade do ato de renúncia com o consequente retorno ao cargo de Conselheiro do TCE/MT, esta vaga não poderá ser ocupada por terceiro, para não tornar inútil possível sentença favorável.
O Juiz de Primeiro Grau, ao apreciar o pedido de liminar, ponderou que, embora haja documentação que comprove o diagnóstico com “estado de stress pós-traumático” (CID 10 F 43.1), “transtornos de adaptação” (CID 10 F43.2) e “transtorno dissociativo (de conversão)” (CID 10 F44), o quadro clínico do Agravante, por enquanto, não demonstra que a renúncia ao cargo de Conselheiro ocorreu em razão da capacidade cognitiva prejudicada.
Dessa forma, entendeu o Magistrado de instância singela a necessidade da produção de provas para então constatar o nexo de causalidade entre o diagnóstico apresentado pelo Agravante à época (2014) e o ato de renúncia, uma vez que a presunção da probabilidade do direito alegado não é suficiente para embasar a concessão do pedido do efeito ativo pretendido.
De igual modo, filio-me à decisão indeferitória, ora recorrida, por entender que ausentes os requisitos processuais exigidos, especialmente porque incerta a probabilidade de provimento do recurso, uma vez que as alegações argumentadas pelo Agravante necessitam de produção probatória.
A propósito transcrevo excerto da decisão a quo :
“[...] Nessa quadra, ponderadas as características que fizeram do autor um dos principais políticos do Estado de Mato Grosso, feito notável que exige invejável tenacidade e grande resiliência mental e emocional, e diante da ausência de prova idônea que permita desde logo afirmar a existência de vício capaz de macular a higidez da manifestação de vontade, não se antevê suficiente relevância na causa de pedir que sustenta a inicial, não havendo justificativa razoável para a tutela de urgência invocada. [...]” (id nº 18234266 – processo originário).
Posto isso, na medida que a concessão da tutela de urgência está condicionada à comprovação de fatos constitutivos do direito arguido, quando ausentes, não é admitido o deferimento de efeito suspensivo/ativo apenas por presunção, como neste caso.
A decisão ora recorrida encontra respaldo na jurisprudência dos Tribunais Pátrios:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE EXONERAÇÃO A PEDIDO, POR VÍCIO DE VONTADE. PEDIDO DE REINTEGRAÇÃO AO CARGO ANTERIORMENTE OCUPADO. TUTELA DE URGÊNCIA INDEFERIDA. Embora os atos administrativos sejam dotados de presunção relativa de legitimidade, estes podem ser ilididos mediante prova de sua desconstituição. Não obstante, no presente caso, inexiste prova suficiente para a caracterização de um juízo de probabilidade do direito afirmado, o que poderá ser melhor apreciado após a oportunização do contraditório e a instrução probatória. Indeferida a tutela de provisória de urgência, uma vez que ausentes, neste momento processual, todos os requisitos exigidos pelo artigo 300 do CPC/2015. AGRAVO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 71006974620, Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública, Turmas Recursais, Relator: Mauro Caum Gonçalves, Julgado em 28/09/2017)
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA - EX-SERVIDOR PÚBLICO - MUNICÍPIO DE ARCEBURGO - EXONERAÇÃO A PEDIDO - VÍCIO DE VONTADE - INCAPACIDADE - NÃO COMPROVAÇÃO. 1 - A exoneração a pedido do servidor é ato voluntário e acarreta a resolução do vínculo com a Administração Pública; 2 - Para a desconstituição do ato administrativo de exoneração realizada a pedido pelo servidor deve haver demonstração de que tenha ocorrido defeito por vício de consentimento capaz de macular a vontade do servidor. (TJMG - Apelação Cível 1.0432.15.001019-2/001, Relator(a): Des.(a) Renato Dresch , 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 13/12/2018, publicação da súmula em 19/12/2018)
APELAÇÃO CÍVEL - REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO ADMINISTRATIVO - SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - PEDIDO DE EXONERAÇÃO DE CARGO PÚBLICO EFETIVO - ALEGAÇÃO DE PRÁTICA DO ATO EM PLENO QUADRO DE SURTO PSIQUIÁTRICO - INSUFICIÊNCIA DE PROVAS - ÔNUS - ARTIGO 373, I, DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - PERÍCIA PRECÁRIA - DEMAIS PROVAS QUE NÃO TRAZEM A SEGURANÇA DE QUE O AUTOR, NO DIA EM QUE REQUEREU SUA EXONERAÇÃO, ERA INCAPAZ DE FAZER A DECLARAÇÃO DE VONTADE - SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA - REFORMA. Nos termos do art. 373, I e II, impõe ao autor o ônus fundamental da prova de seu direito, e, ao réu, o ônus de demonstrar qualquer fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, de modo que, não tendo o autor, no caso em questão, se desincumbido de comprovar que era inteiramente incapaz, à época da assinatura do termo, para manifestar a vontade de se exonerar do cargo ocupado, impõe-se a reforma da sentença que julgou procedente o pedido inicial, mormente tendo em conta a precariedade da prova pericial produzida, por médico que não é especialista no assunto, o que também se verifica em relação aos demais documentos médicos e prova testemunhal produzida. No reexame necessário, reformada a sentença, prejudicado o apelo voluntário. (TJMG - Apelação Cível 1.0071.13.005752-5/001, Relator(a): Des.(a) Judimar Biber , 3ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 31/01/0019, publicação da súmula em 06/02/2019)
As razões do Agravante permeiam apenas o âmbito das alegações, despidas, por hora, de comprovação da relação efetiva do quadro clínico do ex- Conselheiro do TCE/MT e a renúncia, inclusive, porque, entre o ato (2014) e a judicialização da questão (final de 2018), há considerável lapso temporal.
Forte nessas razões, INDEFIRO o pedido de liminar vindicado por Humberto Antônio Bosaipo.
Intime-se o Agravado para contraminutar o Agravo, facultando-lhe a juntada da documentação que entender necessária para o julgamento do Recurso.
Comunique-se ao Juízo da causa.
Após, encaminhem-se os autos à Procuradoria-Geral de Justiça.
Intime-se. Cumpra-se.
Cuiabá/MT, 1º de março de 2019.
Desa. MARIA EROTIDES KNEIP
Relatora em substituição legal
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