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Política Terça-feira, 30 de Maio de 2017, 11:54 - A | A

Terça-feira, 30 de Maio de 2017, 11h:54 - A | A

"barriga de aluguel"

Desembargador nega HC a ex-comandante da PM e o mantém preso

Lucione Nazareth/ VG Notícias

ex-comandante geral da Polícia Miltar, coronel Zaqueu Barbosa

ex-comandante-geral da Polícia Militar, coronel Zaqueu Barbosa

O desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ/MT), Paulo da Cunha, negou pedido de habeas corpus ao ex-comandante-geral da Polícia Militar, coronel Zaqueu Barbosa, e o manteve preso preventivamente.

Zaqueu foi preso na semana passada acusado de supostamente comandar o esquema de grampos ilegais no Estado, por meio do esquema "barriga de aluguel".

A defesa do coronel ingressou com HC alegando que o ex-comandante da PM não representa risco as investigações, e que sua prisão foi decretada sem abertura de inquérito policial para apurar o caso dos grampos ilegais.

Em decisão proferida nesta terça-feira (30.05), o desembargador Paulo da Cunha aponta que a Corregedoria da PM instaurou, em 15 de maio, um inquérito policial para apurar os fatos após os grampos ilegais serem noticiados nacionalmente no programa Fantástico, da Rede Globo.

O magistrado cita que em 17 de maio a Corregedoria informou ao juiz Marcos Faleiros sobre a decisão do inquérito policial, e que após analisar todos os fatos, Faleiros proferiu decisão no dia 23 de maio pela prisão de Zaqueu e também do cabo Gerson Luiz Correa Junior, por envolvimento nos grampos.

Cunha relata em sua decisão que o ex-comandante da PM e o cabo Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior podem atrapalhar as investigações (destacando trechos da decisão de Faleiros).

“O Coronel Zaqueu e o CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior já exerceram funções dentro do GAECO, Comando Geral e na Casa Militar. Ambos têm influências no próprio GAECO, Casa Militar e na cúpula da PM, o que facilita, e muito, o encobrimento das provas do crime”, diz trecho extraído da decisão.

Diante dos fatos, o magistrado descartou os argumentos da defesa, negando o habeas corpus ao coronel Zaqueu.

“Sendo assim, em cognição sumária, não há manifesta ilegalidade ou teratologia no decreto constritivo, mas situação legítima que demanda o resguardo da ordem pública, ante a gravidade concreta da conduta supostamente criminosa. Ante o exposto, indefiro o pedido de liminar”, diz outro trecho extraído da decisão do magistrado.

O ex-comandante da PM seguirá preso no Batalhão de Operações Especiais (BOPE) em Cuiabá.

Íntegra da decisão:

GABINETE DO DES. PAULO DA CUNHA

HABEAS CORPUS CRIMINAL (307) 1005072-75.2017.8.11.0000

IMPETRANTE: FLAVIO JOSE FERREIRA

IMPETRADO: JUIZO DA 11ª VARA CRIMINAL DA COMARCA DE CUIABÁ

Vistos etc.

Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, interposto pelo advogado Flávio José Ferreira, em benefício de Zaqueu Barbosa, apontando como autoridade coatora o Juízo da Décima Primeira Vara Criminal Especializada de Justiça Militar da Comarca de Cuiabá/MT.

Narra que o paciente teve a prisão preventiva decretada, sob a acusação de ser o mandante de ordens militares para execução de interceptações telefônicas clandestinas, com finalidades espúrias, mediante a inserção de números telefônicos de supostos alvos em investigações diversas, a fim de que fosse obtida a chancela judicial.

Relata que ao decretar a custódia cautelar, o magistrado singular apontou a existência de indícios do cometimento, em tese, dos crimes capitulados nos artigos 169; 228; 246; 305; 308, § 2º; 311; 312; e 319, todos do Código Penal Militar, além do delito de organização criminosa [Lei n. 12.850/2013].

Sustenta, no entanto, a ilegalidade do decreto cautelar, baseando nas assertivas que (a) a prisão preventiva não poderia ser decretada de ofício, antes mesmo da instauração de inquérito policial; (b) não estão presentes os requisitos autorizadores da medida constritiva; (c) o paciente não representa qualquer risco ao deslinde processual, por estar na reserva remunerada da Polícia Militar.

Postula, ao final, a concessão de liminar para que seja imediatamente cessada a coação à liberdade do paciente, com a expedição de alvará de soltura.

Alegando inviabilidade técnica, o impetrante, nos moldes do artigo 11, § 5º, da Lei n. 11.419/2006, apresentou fisicamente a petição protocolada sob o n. 63324/2017, contendo em anexo DVD, com vídeo de audiência de custódia e 03 (três) arquivos em formato PDF.

É o essencial.

1 - Quanto aos documentos apresentados na forma física, recebo-os e determino à Secretaria da Primeira Câmara Criminal que proceda ao processamento, na forma do artigo 11, § 5º, da Lei n. 11.419/2006, não sem antes tentar anexá-los digitalmente ao feito.

2 – Com esta consideração inicial, passo à análise do pedido de liminar:

2.1 - Em que pese inexista previsão legal de liminar em sede de habeas corpus, a jurisprudência tem admitido a sua concessão, sendo necessário, para tanto, manifesta necessidade e urgência. Ou seja, o constrangimento ilegal deve estar evidenciado de forma indiscutível na impetração e nos elementos probatórios contidos nos autos. No entanto, não é este o caso discutido no presente remédio constitucional.

2.2 – Alega o impetrante que a prisão preventiva não poderia ser decretada de ofício, antes mesmo da instauração de inquérito policial.

2.2.1 - Contudo, compulsando os autos, resta claro que o Inquérito Policial foi instaurado no dia 15/05/2017, por meio da Portaria n. 4/IMP/CORREGPM/2017, da lavra do Corregedor Geral da Polícia Militar, Cel. PM. Alexandre Correa Mendes, o qual designou como encarregado e delegou às atribuições de Polícia Judiciária Militar ao Cel. PM. Denézio Pio da Silva.

Em 17/05/2017, o Corregedor Geral da Polícia Militar, Cel. PM. Alexandre Correa Mendes, por meio do Ofício n. 418/CICP/G.C.E/CORREGPM/2017, informou à Sua Excelência o Dr. Marcos Faleiros da Silva, Juiz de Direito Titular da 11ª Vara Criminal Especializada da Justiça Militar da Comarca de Cuiabá, a instauração do inquérito policial, por meio da portaria supramencionada.

Por vez, a prisão preventiva combatida no writ foi decretada em decisão do dia 23/05/2017, portanto, após, a instauração do inquérito policial militar.

2.2.2 - Não se ignora o fato de que o Cel. PM. Denézio Pio da Silva declinou da designação e delegação que lhe foi conferida pela Portaria n. 4/IMP/CORREGPM/2017. Contudo, embora não se possa indicar, neste instante, o responsável pela condução do inquérito, também não se pode negar sua existência.

Ademais, é cediço que a instauração de inquérito policial é dispensável para a propositura de ação penal, quiçá à decretação de prisão cautelar, especialmente em hipóteses similares a verificada nestes autos, em que a notícia criminis chegou ao conhecimento do magistrado singular acompanhada de vasta documentação – relatórios de interceptações, cópia de decisões judiciais, dentre outros -, a qual, aliás, instrui este habeas corpus.

2.2.3 – Superada à formalidade da instauração de inquérito, discute-se, ainda, a legalidade da decretação de prisão cautelar pelo magistrado, ex officio, durante a fase investigatória.

No direito processual brasileiro muito se debate acerca dos modelos processuais inquisitivo e dispositivo, em especial após a edição da Constituição Federal de 1988. A celeuma se avoluma porque grande parte da legislação penal e processual penal (p. ex., Código Penal, Código Penal Militar, Código de Processo Penal e Código de Processo Penal Militar), embora tenham sofrido reformas durante os anos, foram editados em momento anterior à atual Constituição Federal, essencialmente democrática.

Dentre as questões mais controvertidas, está a forma de atuação do juiz no processo, havendo quem defenda uma postura mais contida [agindo somente quando provocado] ou mais proativa [como, p. ex., na prolação de decisões de ofício].

O certo é que – embora não esteja imune a críticas e ao controle de constitucionalidade – o direito processual brasileiro é híbrido, possuindo disposições que se aproximam do processo penal dispositivo, como também normas incompatíveis com tal sistema.

No caso específico da legislação militar, a própria Constituição da República conferiu tratamento diferenciado [e mais rígido], permitindo, p. ex., prisão administrativa [art. 5º, inc. LXI, da CF] e restringindo o cabimento do habeas corpus [art. 142, § 2º, da CF].

No tema das prisões cautelares, o artigo 254 do Código de Processo Penal Militar dispõe que “a prisão preventiva pode ser decretada pelo auditor ou pelo Conselho de Justiça, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade encarregada do inquérito policial-militar, em qualquer fase dêste ou do processo (...)”.

Embora anterior à Constituição Federal de 1988, não compreendo que a norma do artigo 254 do CPPM seja incompatível com a ordem jurídica vigente. Pelo contrário, visualizo perfeita conformidade entre tal disposição e o tratamento mais severo conferido pela atual Constituição aos militares, os quais estão regidos por princípios jurídicos distintos dos civis, tendo por fundamentos a hierarquia e a disciplina.

Não desconheço, igualmente, que o Código de Processo Penal possuía dispositivo legal similar [admitindo a decretação de prisão preventiva de ofício na fase inquisitorial], o qual foi reformado pela Lei n. 12.403/2011.

Porém, mesmo na legislação processual comum, permanecem vigentes normas que autorizam a prisão cautelar de ofício, quando no curso da ação penal [art. 311 CPP] e nas hipóteses de conversão de prisão em flagrante em preventiva [art. 310, inc. II, CPP].

Sob outra ótica, embora atualmente reformado o Código de Processo Penal pela Lei n. 12.403/2011, antes da referida norma, a jurisprudência sempre admitiu como válida a prisão preventiva de ofício pelo juiz.

Neste sentido:

“EMENTA: HABEAS CORPUS. INDEFERIMENTO DE PRISÃO PREVENTIVA. POSTERIOR RETRATAÇÃO APÓS A INTERPOSIÇÃO DE RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. NÃO INTIMAÇÃO DA DEFESA PARA CONTRA-ARRAZOAR. POSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO, DE OFÍCIO, DA PRISÃO PREVENTIVA. ORDEM DENEGADA. Como a prisão preventiva pode ser decretada até mesmo de ofício (CPP, art. 311), não se sustenta a tese de que a defesa deveria ter sido intimada para contra-arrazoar recurso em sentido estrito interposto pela acusação de decisão que, em um primeiro momento, indeferiu a custódia do paciente, sendo irrelevante o fato de a segregação provisória ter-se operado em sede de juízo de retratação (CPP, art. 589). Ordem denegada.” (STF, HC 96445, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 08/09/2009)

“CRIMINAL. HC. HOMICÍDIO QUALIFICADO. PRONÚNCIA. BENEFÍCIO DE AGUARDAR EM LIBERDADE O JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. ANTERIOR DECRETAÇÃO DE REVELIA. PRISÃO PREVENTIVA. CUSTÓDIA CAUTELAR. POSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO A QUALQUER TEMPO PELO JUIZ. NECESSIDADE DA CUSTÓDIA DEMONSTRADA. RÉU FORAGIDO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM DENEGADA.

I. Hipótese em que o Magistrado singular decretou a prisão preventiva do paciente, após verificar a sua condição de réu revel, tornando sem efeito a anterior concessão do benefício de aguardar em liberdade o julgamento do Tribunal do Júri.

II. Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal pode ser decretada a prisão preventiva do réu pelo Juiz, de ofício, ou a requerimento da parte acusatória ou da autoridade policial. (...)
V. Ordem denegada.” (STJ, HC 31.719/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 25/05/2004)

Por derradeiro, também é certo que não se pode estender à legislação processual penal militar a regra atualmente vigente no artigo 311 do Código de Processo Penal, pois a aplicação da legislação processual comum somente tem espaço quando houver omissão, conforme dispõe o artigo 3º do CPPM.

Esta é orientação uníssona do Supremo Tribunal Federal. Confira-se:

“INTERROGATÓRIO – PROCESSO PENAL MILITAR – ESPECIALIDADE. Ante a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal ao processo militar, impõe-se observar a especialidade, ou seja, o interrogatório na fase prevista no Código de Processo Penal Militar, não incidindo a norma geral.” (STF, HC 128179, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 02/05/2017)
“Habeas corpus. 2. Penal e Processual Penal Militar 3. Furto de fuzis pertencentes ao Exército (art. 240, §§ 4º e 5º, do Código Penal Militar.). 4. Prisão preventiva. Necessidade de garantia da ordem pública. Manutenção dos princípios da hierarquia e disciplina militares. Fundamentação idônea que recomenda a medida constritiva. 5. Instituto da menagem. Incabível. Ausência do requisito objetivo exigido: pena cominada ao delito superior a 4 anos. 6. Aplicabilidade das medidas cautelares previstas na Lei n. 12.403/2011 na Justiça Militar. Não incidência. Princípio da especialidade. 7. Ausência de constrangimento ilegal. Ordem denegada.” (STF, HC 135047, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 27/09/2016)

Logo, não havendo omissão, mas disposições legais em sentidos opostos, deve prevalecer a legislação especial, na qual se admite a decretação da prisão preventiva de ofício pelo juiz, a qualquer tempo, pois inexistente incompatibilidade com a Constituição da República.

2.3 – No que concerne aos requisitos autorizadores da prisão preventiva, previstos nos artigos 254 e 255 do Código de Processo Penal Militar, compreendo, em primeira análise, que a decisão combatida expôs suficientemente situação concreta que confere respaldo à grave e excepcionalíssima medida adotada.

A decisão combatida está firmada nos seguintes pilares:

“Trata-se Inquérito Policial Militar, Portaria nº. 4/IPM/CORREGPM/2017, no qual noticia a suposta prática fraudulenta de escuta telefônica militar clandestina, denominada de “Barriga de Aluguel”, com envolvimento de integrantes da Polícia Militar, notadamente do Cel PM RR Zaqueu Barbosa e CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior, supostamente em nome do Núcleo de Inteligência da PMMT.

A denúncia tornou-se pública mediante notícia veiculada na Rede Globo de televisão – programa “Fantástico”, no dia 14.05.2017, bem como nos sites de notícias do Estado de Mato Grosso, por conseguinte, este magistrado verificou indícios do envolvimento não só do Cel PM RR Zaqueu, apontado como mandante das ordens de ações militares de interceptações telefônicas, e quem mantinha contato pessoal com magistrados para viabilizar os grampos clandestinos , como também do CB PM Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior, responsável por formalizar os pedidos, prorrogações e relatórios de inteligência dos grampos militares ilegais à Justiça, conforme noticiado no site G1.globo.com e outros sites de notícias .

O suposto esquema de grampos clandestinos militares, feito por alguns Policiais Militares, tinha a finalidade de espionagem política, escuta de advogados no exercício de sua função, jornalistas – cujo sigilo da fonte é constitucional, desembargadores, deputados – com foro de prerrogativa, médicos – cuja relação com o paciente também é sigilosa, inclusive de “amantes” de poderosos, e estima-se que foram grampeados ilegalmente entre 80 e 1000 terminais, não se sabendo ao certo.

Conforme documentos apresentados na imprensa, ocorriam interceptações militares ilegais utilizando-se da técnica conhecida como “barriga de aluguel”, consistindo na obtenção de ordem judicial de interceptação telefônica induzindo o Ministério Público e o Poder Judiciário a erro mediante criação de uma “estória” escondida em investigações de delinquentes verídicos, inserindo no rol de alvos criminosos, civis e servidores públicos ocupantes de posto estratégicos para fins exclusivos de obtenção de informações ao arrepio da lei.

Tal situação foi denunciada pelo Secretário de Segurança Mauro Zaque de Jesus e pelo adjunto, Fábio Galindo Silvestre, ao Governador do Estado, conforme ofício divulgado na imprensa com o seguinte conteúdo:

Em referência ao ofício 3026/2015/GAB/SESP, encaminhamos documentação complementar que, em razão da permanência no tempo, sinaliza pela possível existência de um “escritório clandestino de espionagem” montado no seio do Poder Executivo do Estado de Mato Grosso, com o objetivo de obter informações estratégicas ao arrepio da lei.

Foi realizada checagem preliminar da documentação mediante confrontação dos dados dos alvos fictícios apontados nos relatórios e suas identidades reais. De fato, emergem indícios que o conteúdo da documentação seja verdadeiro.

Isto posto, em razão da enorme gravidade do fato, e por se tratar de questão de Estado, encaminhamos a documentação anexa (4volumes) para ciência e providências que entender cabíveis.

Tais condutas revelam fortes indícios de autoria e materialidade de fatos criminosos de gravidade concreta a atentar não só contra aos bem jurídicos tutelados no Direito Penal Militar, como também aos direitos e garantias individuais inegociáveis consolidadas na Constituição da República; na Declaração Universal de Direitos do Homem – art. 12; Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos – art. 17; e Convenção Americana sobre Direitos Humanos – art. 11, § 2º; sujeitando-se o Estado ao risco de ser réu em Processo Internacional em razão da grave violação do RIGHT OF PRIVACY, com práticas que remontam aos tempos sombrios do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS), utilizado na Ditadura Militar para censurar e reprimir movimentos políticos e sociais contrários ao regime de situação no poder, de forma a sustentar aqueles que se encontram no poder.

Com efeito, há indícios da prática do crime do art. 169 do CPM:

Art. 169. Determinar o comandante, sem ordem superior e fora dos casos em que essa se dispensa, movimento de tropa ou ação militar:

Pena - reclusão, de três a cinco anos. Grifei

A interceptação telefônica militar é um instrumento à disposição da auditoria militar para apuração de crimes militares. Qualquer outra interceptação deve ser provocada pela Polícia Civil. O Coronel Zaqueu, ao determinar, anuir e/ou aquiescer em ação militar clandestina de interceptação na cidade de Cáceres/MT, em usurpação de função pública, fora dos casos previstos no CPPM, pode ter cometido o tipo penal do art. 169, porque o seu superior hierárquico, o Governador do Estado Pedro Taques, emitiu nota negando que tenha autorizado qualquer prática de ação militar de interceptação.

Interceptações telefônicas militares são práticas militares de inteligência que se enquadram no termo ação militar. Quando se tratam de tropas dos Policiais Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares a ação militar é mais ampla, abrangendo a parte beligerante e também a parte de inteligência militar, tais como a atuação do Serviço Reservado ou Velado, ou seja, policiais militares infiltrados sem farda, também conhecida como P2, cuja função é levantar em campo informações.

Ainda, inclusive com relação ao policial Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior, quem supostamente fazia relatórios falsos de grampos militares, necessária a melhor investigação porque existem indícios de vários crimes, dentre os quais: corrupção a pedido ou influência de outrem, descrito no artigo 308, §2º do CPM; falsidade ideológica, art. 312 do CPM; organização criminosa, Lei nº 12.850/13; divulgação de segredo, descrito no artigo 228 do CPM; prevaricação, descrito no artigo 319 do CPM; falsificação de documento, art. 311 do CPM; ou ainda, a depender da conclusão das investigações, poder-se-á apurar eventual prática do crime de concussão, art. 305 do CPM, e extorsão indireta, art. 246 do CPM.

Insta salientar que a gravidade CONCRETA dos fatos, já mencionada acima que, além de transgredir a Constituição e tratados internacionais, houve a utilização da máquina estatal para fins de espionagem de jornalistas, políticos, desembargadores, etc., ofendendo a democracia e comprometendo as investigações de crimes graves que acontecem no Estado de Mato Grosso, bem como aviltando a credibilidade da Polícia Militar e de órgãos de inteligência importantes, tais como o GAECO.

Repita-se, nesse caminhar, temos que a prisão preventiva do Cel PM RR Zaqueu Barbosa e do CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior é medida necessária para a garantia da ordem pública diante da gravidade dos fatos que revelam a perigosa violação de direitos e garantias fundamentais, qual seja, a violação da intimidade, em prol de interesses privados escusos, com violação de dever legal e atuação fraudulenta que induziu o erro ao Poder Judiciário do Estado de Mato Grosso, uma vez que a determinação ocorreu em pedido de inquérito policial, nos quais foram inseridos números de pessoas diversas dos verdadeiros investigados, por interesse próprio ou de outrem.

Ademais, a existência de interceptações telefônicas militares clandestinas no estado, monitoradas pela Polícia Militar é grave, geradora de intranquilidade e insegurança absoluta, colocando em xeque futuras investigações idôneas por parte da polícia, manchando a imagem da Polícia Militar do Estado de Mato Grosso, por violação dos princípios basilares da caserna, quais sejam, a hierarquia e disciplina, previstos no artigo 42 da Constituição Federal.

Ainda, o Coronel Zaqueu e o CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior já exerceram funções dentro do GAECO, Comando Geral e na Casa Militar. Ambos têm influências no próprio GAECO, Casa Militar e na cúpula da PM, o que facilita, e muito, o encobrimento das provas do crime. Importante salientar que o CB Gerson continua trabalhando na Casa Militar, e tem acesso ao software e hardware de interceptação militar, o que facilita ingressar no sistema para consumir, apagar e/ou destruir provas/indícios de crime. Aqui a prisão preventiva é necessária por conveniência da instrução criminal.

Por fim, a prisão preventiva aqui é necessária por força do art. 255, “e”, CPPM, porque as práticas supostamente efetivadas pelo Coronel Zaqueu e pelo CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior prejudicaram sobremaneira a Polícia Militar e o Poder Judiciário, comprometendo perante a sociedade o controle da criminalidade, ao perpetrarem escutas militares de jornalistas, deputados, desembargadores e até “amantes”, ao arrepio da lei. Veja:

Art. 255. A prisão preventiva, além dos requisitos do artigo anterior, deverá fundar-se em um dos seguintes casos:

(...)

e) exigência da manutenção das normas ou princípios de hierarquia e disciplina militares, quando ficarem ameaçados ou atingidos com a liberdade do indiciado ou acusado.

O Auditor Militar pode determinar a prisão preventiva militar, de ofício, dos indiciados por força dos seguintes dispositivos legais militares:

CPPM

Art. 254. A prisão preventiva pode ser decretada pelo auditor ou pelo Conselho de Justiça, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade encarregada do inquérito policial-militar, em qualquer fase dêste ou do processo, concorrendo os requisitos seguintes:

a) prova do fato delituoso;

b) indícios suficientes de autoria. – grifei

CPPM

Art. 18. Independentemente de flagrante delito, o indiciado poderá ficar detido, durante as investigações policiais, até trinta dias, comunicando-se a detenção à autoridade judiciária competente. Êsse prazo poderá ser prorrogado, por mais vinte dias, pelo comandante da Região, Distrito Naval ou Zona Aérea, mediante solicitação fundamentada do encarregado do inquérito e por via hierárquica. – grifei
Lei 8.457/92.

Art. 30. Compete ao Juiz-Auditor:

III - manter ou relaxar prisão em flagrante, decretar, revogar e restabelecer a prisão preventiva de INDICIADO, mediante despacho fundamentado em qualquer caso. – grifei
Vejamos que a Constituição da República, em razão da gravidade das ações militares, mitiga os direitos fundamentais dos militares em caso de prisão militar, tanto a preventiva quanto transgressão militar, conforme o artigo 5º, inciso LXI da Constituição Federal:

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei; - grifei

Assim, presentes os requisitos e fundamentos acimas expostos, DECRETO A PRISÃO PREVENTIVA MILITAR do Cel PM RR Zaqueu Barbosa e do CB Gerson Luiz Ferreira Correa Júnior.”
Como se vê, a decisão está baseada na presença da materialidade delitiva, somada à existência de indícios de autoria, além da necessidade de resguardar a ordem pública e a manutenção das normas e princípios de hierarquia e disciplina militares.

A doutrina pátria compreende que a gravidade abstrata do crime não se presta à justificativa da prisão preventiva. Contudo, a gravidade concreta da conduta supostamente criminosa é fator de aferição do risco à ordem pública.

Afinal, todo crime é grave e, em certa medida, abala a ordem pública. Todavia, a gravidade do delito que autoriza a prisão preventiva é aquela incomum aos delitos da mesma espécie, aferível a partir da forma de execução ou circunstâncias diferenciadas, as quais revelam a periculosidade do agente ao meio social a que está inserido.

Neste compasso, os fatos em apuração na origem e citados no decreto constritivo, revelam verdadeiro Estado Policial, com finalidade espúria e altamente reprovável, atentatórios ao regime democrático de Direito e à independência entre os Poderes.

Na atuação jurisdicional, comumente tenho repelido prisão preventivas decretadas para garantir a credibilidade da justiça e das instituições constituídas. Porém, a hipótese dos autos, me faz relembrar um caso peculiar em que o Pleno do Supremo Tribunal Federal, diante de expressivo e singular desrespeito ao Poder Judiciário, validou prisão preventiva decretada sob este fundamento.

Refiro-me ao Habeas Corpus n. 80717-SP, em que se discutia a legalidade de prisão preventiva imposta a magistrado aposentado, acusado de desvio milionário em detrimento de órgão do Poder Judiciário.

Guardadas as devidas proporções, se naquele caso a credibilidade do Poder Judiciário esteve abalada, quem dirá na hipótese dos autos, em que o Ministério Público e o Poder Judiciário foram, em tese, induzidos a erro, com a finalidade de se obter a invasão de privacidade de diversas pessoas, algumas inclusive com prerrogativas de foro, para atender interesses pessoais ilícitos.

Sendo assim, em cognição sumária, não há manifesta ilegalidade ou teratologia no decreto constritivo, mas situação legítima que demanda o resguardo da ordem pública, ante a gravidade concreta da conduta supostamente criminosa.

Ante o exposto, indefiro o pedido de liminar.

Intimem-se.

Solicitem-se informações.

Após, vista à Procuradoria Geral de Justiça.

Cuiabá, 30 de maio de 2017.

Desembargador PAULO DA CUNHA

Relator

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