Seis anos após o assassinato de Juliene Anunciação Gonçalves, de 20 anos, no bairro CPA II, em Cuiabá, o inquérito ainda está em andamento no Ministério Público de Mato Grosso. Na época o crime chocou pela brutalidade. Juliene foi morta em maio de 2012 por enforcamento e teve seu corpo nu dependurado em uma área pública conhecida como “Campo do Botafogo”, na região do bairro CPA 3, na Capital.
Na época do assassinato, o inquérito chegou a ser concluído em menos de um mês, quando foi decretada a prisão em flagrante do principal suspeito, o vendedor Antônio Rodrigo Silva dos Santos, de 34 anos, que teve o cuidado de simular um suicídio. No entanto, sua liberdade foi concedida logo em seguida e até hoje o crime segue sem punição.
Com a soltura de Antônio Rodrigo Silva dos Santos, a investigação foi reaberta mas, apesar das diversas diligências e perícias realizadas, bem como a conclusão de relatório da delegada responsável pelo caso, Anaíde Barros, da Delegacia de Homicídio e Proteção à Pessoa (DHPP), não há ainda oferecimento de denúncia por parte do Ministério Público. O inquérito foi concluído e encaminhado para o MP em dezembro de 2016, e ainda está em análise por ser considerado um crime complexo.
O advogado da família, Alberto Scaloppe, que recentemente assumiu o caso, explica que está acompanhando o andamento do inquérito de perto, em busca de respostas para a família. “Entendemos que o Ministério Público esteja buscando uma investigação mais aprofundada. Estamos acompanhando o caso de perto como assistentes, na busca por respostas a esse crime brutal que já completou seis anos”, afirma.
A mãe de Juliene, Marlene Anunciação, atribui a demora ao fato de se tratar de uma mulher, negra e pobre. “Caiu no esquecimento. Eu vou no Ministério Público e a única coisa que me dizem é que estão dando encaminhamento, chamando as testemunhas. Mas com todo esse tempo, nada ainda foi resolvido. As pessoas já não se lembram mais, e a única pessoa que tem que conviver com essa dor sou eu”, afirma.
Em Cuiabá, a morte de Juliene virou símbolo da luta contra a violência e assassinato de mulheres, com manifestações no chamado #MaioJuliene. Em um dos protestos, foram colocadas cruzes em frente ao Monumento Ulisses Guimarães, na Avenida Historiador Rubens de Mendonça, na capital, com os nomes de mulheres vítimas de homicídios em Mato Grosso.
O caso - Em 2012, após ter saído de uma casa de festas acompanhada de dois amigos, sendo um deles seu primo, e aceitado carona de Antônio Rodrigo Silva dos Santos, a jovem foi enforcada com um pedaço de fio elétrico, teve a calça amarrada ao pescoço em simulação a suicídio e seu corpo dependurado em área pública. Segundo consta no Inquérito Policial, a motivação do crime teria sido a recusa da jovem em fazer sexo com o suspeito.
Na época, a polícia localizou o celular de Juliene e um pedaço de fio elétrico semelhante ao usado no crime dentro do veículo de Antônio Rodrigo Silva dos Santos. A roupa e o sapato do vendedor usados no dia do crime teriam sido lavados, conforme divulgado pela Polícia Civil, aumentando as suspeitas de autoria do assassinato.
Feminicídio - O caso do assassinato da Juliene Anunciação enquadra-se no crime identificado como feminicídio. Trata-se da tipificação do crime de ódio onde mulheres são assassinadas pelo simples fato de serem mulheres, movido por razões de gênero.
Um estudo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostrou que em 2017, 2.795 ações foram registradas pedindo a condenação de um agressor enquadrado nessa modalidade de crime (uma proporção de oito casos novos por dia) ou uma taxa de 2,7 casos a cada 100 mil mulheres. Em 2016, haviam sido registrados 2.904 casos novos de feminicídio.
Em 2015, a Lei nº 13.104/15 foi sancionada pela ex-presidente Dilma Rousseff, alterando o Código Penal para incluir o feminicídio como modalidade de homicídio qualificado. No entanto, ainda hoje não é considerado crime hediondo.
Em 2012, quando o assassinato de Juliene foi cometido, a Lei nº 13.104/15 ainda não havia sido sancionada, o que impediu de aplicá-la ao caso. Segundo o artigo 5º da Constituição Federal, que traz os princípios de legalidade e anterioridade penal, não pode haver crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia comunicação legal. O mesmo artigo determina ainda que a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.
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