O Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou um recurso apresentado pela defesa de Tapoalu Kamayura, acusada de tentativa de homicídio contra a própria neta, uma recém-nascida enterrada viva em 2018, na cidade de Canarana. A defesa solicitava que a ré fosse julgada por um júri indígena dentro da comunidade, alegando que a prática estaria ligada a costumes culturais. A decisão foi proferida pelo ministro Otávio de Almeida Toledo, que reafirmou que, por estar integrada à sociedade, a acusada deve ser julgada pelo Tribunal do Júri convencional, conforme prevê a legislação brasileira.
O pedido de júri indígena foi negado inicialmente pela 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), que entendeu não haver amparo legal para a formação de um tribunal composto exclusivamente por indígenas em uma comunidade indígena. A defesa recorreu ao STJ argumentando que a acusada deveria ser julgada por seus pares dentro da aldeia, respeitando os costumes e tradições de sua etnia.
No recurso, a defesa alegou que, mesmo sendo considerada uma indígena integrada, Tapoalu Kamayura deveria ser julgada dentro da comunidade por jurados indígenas, uma vez que o crime teria ocorrido dentro de um contexto cultural específico. O pedido, no entanto, foi rejeitado com base no princípio do juiz natural e da imparcialidade, previstos na Constituição Federal.
O ministro Otávio de Almeida Toledo destacou que a Constituição Federal determina que crimes dolosos contra a vida sejam julgados pelo Tribunal do Júri, conforme o artigo 5º, inciso XXXVIII. Além disso, ele citou a Lei nº 6.001/73 (Estatuto do Índio), que prevê a possibilidade de tratamento diferenciado para indígenas não integrados à sociedade, o que não se aplica ao caso da acusada.
A decisão também faz referência à Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que estabelece que os costumes indígenas devem ser levados em consideração no julgamento de crimes cometidos por indígenas. No entanto, o ministro ressaltou que essa regra deve ser compatível com o sistema jurídico nacional e os direitos humanos internacionalmente reconhecidos.
O STJ reforçou que a própria defesa admitiu que a acusada é indígena integrada, ou seja, está inserida na sociedade brasileira, tem conhecimento de seus direitos e deveres e, portanto, deve ser submetida ao mesmo processo penal aplicável a qualquer cidadão. Além disso, a decisão do Juízo da Subseção Judiciária de Barra do Garças, que analisou o caso anteriormente, já havia considerado que o crime não possuía cunho cultural, tratando-se de um delito comum.
A realização de um tribunal do júri exclusivamente indígena daria ensejo à criação de um Tribunal de Exceção, o que é vedado pela Constituição Federal, destacou o ministro na decisão.
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Com a negativa do STJ, Tapoalu Kamayura será julgada pelo Tribunal do Júri convencional, como qualquer outro réu acusado de tentativa de homicídio.
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