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Política Sexta-feira, 15 de Março de 2024, 15:19 - A | A

Sexta-feira, 15 de Março de 2024, 15h:19 - A | A

CURIOSIDADE NO MUNDO DA PESCA

Proibição da pesca em MT pode beneficiar empresa falida de Mauro Mendes; veja

Coincidência ou não, é o próprio Mauro Mendes o autor da Lei Nº 12.197/2023, aprovada pela ALMT

Edina Araújo/VGN

As investidas do governador Mauro Mendes (União) contra pescadores de baixada Cuiabana e de todo Mato Grosso ocorrem anos depois dele ter registrado mais um dramático episódio em sua vida empresarial: a falência de uma empresa dedicada a produzir e comercializar peixes amazônicos e do Pantanal, produto encontrado em abundância nos rios do Estado. (Os documentos estão em PDF no final da matéria. Alguns documentos são pesados pelo volume de páginas). Porém, o internauta pode clicar no link azul na matéria.

Voltada ao negócio de peixes “exóticos”, visando atrair o mercado estrangeiro e de outros Estados, a Nativ - Indústria Brasileira de Pescados Amazônicos (IBPASA) S/A entrou com pedido de recuperação judicial em 2014, com dívidas de R$36 milhões. Documentos obtidos pelo VG Notícias mostram que até 2014 , Mendes possuía participação acionária na empresa, através da Bimetal Participações LTDA.

Coincidência ou não, é o próprio Mauro Mendes o autor da Lei Nº 12.197/2023, aprovada na Assembleia Legislativa de Mato Grosso (ALMT) e que visa justamente proibir a comercialização dos peixes que a Nativ planejava produzir e comercializar.

Antes da proibição, em 2021, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico (Sedec-MT), produziu um diagnóstico sobre a aquicultura em Mato Grosso. O estudo evidenciou como a indústria do pescado concorre no Estado e perde para os pescadores artesanais: cerca de 60% do peixe consumido aqui tem origem “clandestina”, segundo o relatório.

“O que coloca as indústrias locais em desvantagem comercial, ocasionando um descompasso na utilização frigorífica, com uma ociosidade aproximada de 48% dos frigoríficos operantes”, diz trecho do documento da Sedec-MT.

A Secretaria segue investindo pesado no setor da aquicultura e piscicultura. Em agosto de 2023, a secretaria afirmou que aportaria R$2,3 milhões em um estudo realizado pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). A ideia do estudo seria justamente melhorar o potencial da piscicultura no Estado, que já foi o primeiro produtor de peixes do Brasil em 2013, e hoje ocupa a 5° colocação.

Enquanto Mato Grosso dá as costas para os pescadores e abraça a piscicultura, a antiga empresa de Mendes começa a se reerguer dando sinais de vitalidade. Em 2023, a Nativ aumentou o capital social em R$32 milhões e agora aguarda receber um aporte do Fundo de Investimentos Alqueire M7 Capital, ligado ao Banco BTG Pacutal. A previsão mais recente era de um investimento de R$ 11 milhões.

Se tudo der certo, a Nativ poderá sair de uma bancarrota que deixou sua planta frigorífica localizada em Sorriso, a mais de 400 km de Cuiabá, completamente inativa. Situação na qual foi colocada pelos seus próprios acionistas e investidores, entre eles Mauro Mendes.

Os investimentos de Mendes na piscicultura - O bilionário Mendes acreditou no potencial da empresa desde 2006, quando a companhia foi fundada por Pedro Furlan Uchoa Cavalcanti, um jovem ricaço de 29 anos, bisneto do fundador da Sadia, Attilio Fontana, que queria sair da aba da família endinheirada e trilhar seu próprio caminho no mundo dos negócios.

Além de Mendes, Pedro associou-se a investidores do Grupo Doux, uma espécie de Sadia da França. Pensando em ficar perto de onde poderia obter ração (60% do custo da produção de peixes vem daí), Pedro Furlan mandou construir o frigorífico em Sorriso, rota da soja, matéria prima essencial da ração do pescado e, ao mesmo tempo, um município abundante em água.

Furlan e seu grupo logo perceberam que a coisa não seria tão fácil. Com pouquíssimo mercado em Mato Grosso, muito em razão do hábito do mato-grossense de pescar ou consumir o peixe vindo de pescadores, a Nativ enfrentou uma impiedosa crise financeira, mesmo comercializando 70% dos seus produtos para outros Estados.

Até o ano de 2014, porém, os acionistas estavam empolgados com a empresa. Mendes é um exemplo disso. Em 2006, ano de fundação, Mauro Mendes já era diretor estatutário do grupo. Em 2008, quando se candidatou pela primeira vez a prefeito de Cuiabá, ele possuía cerca de R$400 mil em cotas de capital na Nativ Pescados.

Em 2010, quando foi candidato a governador, o valor das cotas era de R$2 milhões. Naquele mesmo ano, Mauro Mendes foi um dos membros do Conselho de Administração que autorizou um empréstimo de R$ 40 milhões.

Em 2012, quando finalmente conseguiu se eleger prefeito, Mendes não apresentou ter participação societária na empresa. Entretanto, uma ata do Conselho de Administração de 2012 aponta que Mauro Mendes subscreveu mais de 200 mil ações na Nativ Pescados naquele ano, mantendo seu percentual de participação na empresa.

Ainda, em 2012, dois anos antes do pedido de recuperação judicial, a empresa dava sinais de dificuldades financeiras. Foi quando ocorreu uma renúncia coletiva dos membros do Conselho de Administração, órgão responsável por referendar decisões de uma companhia.

Mauro Mendes e a renúncia coletiva - Segundo Mauro Andrieski, administrador judicial responsável pelo relatório que apontou falhas na administração da empresa, membros do conselho de administração deixaram a sociedade no período em que a dívida começou a crescer vertiginosamente, em meados de 2010. Mauro Mendes, conforme ele, estava na lista daqueles que “abandonaram o barco”.

Em 2010, o conselho de administração da Nativ Pescados possuía nove pessoas, entre elas o atual governador Mauro Mendes e Gilberto Meireles Xandó Baptista, atual presidente da JBS Brasil, escolhido para liderar o grupo em 2022. Após uma renúncia coletiva, restaram apenas três conselheiros, sendo o principal Pedro Furlan, bisneto do fundador da Sadia.

Para Mauro Andrieski, a renúncia coletiva em período de aumento da dívida é fator incomum. “Fizemos o levantamento dos dirigentes da empresa no período de aumento de passivo que antecedeu o pedido de recuperação judicial, o que nos remeteu a ata de Assembleia Geral realizada em 07/10/2010”, diz trecho do relatório do administrador da recuperação judicial. “Durante esta gestão, estranhamente, houve uma renúncia coletiva dos membros do conselho, tendo permanecido apenas três membros”, completou.

No relatório, elaborado para encontrar as falhas na administração, Mauro Andrieski enfatiza que a identificação dos responsáveis pela empresa no período de evolução das dívidas é essencial. Cita, além disso, que o fato de ter restado um único responsável, o empresário Pedro Furlan Uchoa Cavalcanti, também é motivo de apuração. Em todas as atas do conselho, as contas de Pedro Cavalcanti foram aprovadas sem ressalvas, mesmo com sinais de desequilíbrio.

“A identificação dos agentes acima listados é de suma importância para que possamos apurar os responsáveis pelos atos de gestão durante a evolução do débito que levou à bancarrota da empresa, pois, apesar do decreto de falência ter sido fundado na paralisação das atividades, a contabilidade revela uma completa falta de equilíbrio financeiro, em vista de que em nenhum momento a produção atingiu um nível de equilíbrio com os custos, despesas administrativas e financeiras”, afirmou o Andrieski.

Para resolver o problema, Andrieski propõe ao juiz responsável pelo caso que determine aos sócios e conselheiros envolvidos na falência da Nativ a apresentação de bens para fazerem frente às dívidas da companhia. O que acabou não ocorrendo e, com isso, Mauro Mendes não foi responsabilizado.

Apesar de Mendes ter saído do Conselho de Administração, a Bimetal continuou com ações da Nativ. Em 2014, ano em que a empresa entrou com pedido de recuperação, a Bimetal possuía 5,9% das ações da companhia. Antes, em 2012, o total era de 10% das ações.

Dívida milionária com a Bimetal - Mauro Mendes não só saiu ileso do processo de recuperação judicial, a despeito dos apontamentos do administrador judicial, como também o nome de sua empresa também passou a constar como uma das credoras da Nativ Pescados. Em 2016, quando o plano de recuperação da Nativ foi aprovado, a Bimetal Participações, empresa do então prefeito de Cuiabá, constava como uma das credoras, tendo a receber na época R$3,4 milhões.

Em 2010, Mauro Mendes declarou à Justiça Eleitoral ter investido R$ 2.043.296,00 na companhia, mesmo período em que ele entrou no Conselho de Administração.

Segundo ata de reunião da Nativ Pescados de 2012, a Bimetal Indústria e Comércio de Produtos Metalúrgicos Ltda subscreveu 285.715 ações através de Mauro Mendes, então representante da empresa.

No último balanço disponível no processo de recuperação judicial, o grupo da Nativ Pescado diz dever R$4,9 milhões à empresa da família Mendes. Ao todo, as dívidas da Nativ Pescados somam mais de R$50 milhões atualmente. No mesmo ano de 2023, a Nativ aumentou o capital social em R$32 milhões.

Não pagamento de imposto - Há muitos anos, a empresa de pescados nativos é amplamente beneficiada com a isenção fiscal concedida pelo governo de Mato Grosso. A ex-empresa do governador está enquadrada no Programa de Desenvolvimento Industrial e Comercial de Mato Grosso (Prodeic) desde 2006.

Em 2018, o benefício chegou a ser suspenso pela Secretaria de Estado de Fazenda (Sefaz-MT). Antes, em 2016, a Nativ teve o pedido de renovação por mais dez anos negado pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento e Comércio (Sedec). Uma das razões para a Sedec negar na época a renovação do benefício foi a ausência de lucro da Nativ entre 2006 e 2016. Além disso, a empresa também não teria comprovado a geração de ao menos 171 empregos, condição necessária para ter acesso ao crédito fiscal. Na época, a Nativ gerava apenas 70 empregos.

A reportagem do não conseguiu encontrar atos, em Diário Oficial, que reconduziram a Nativ Pescados na lista de beneficiados do Prodeic. A empresa, no entanto, aparece na relação do Prodeic publicada no Portal da Transparência do governo estadual, com o mesmo CNPJ, mas sem a palavra “nativ” na razão social.

Graças aos programas de benefício fiscal, o crédito fiscal da Nativ é maior que sua dívida, chegando a R$ 108 milhões, e apontado como um ativo da companhia.

Ex-sócios da Nativ e o negócio do peixe - Dois ex-sócios da Nativ Pescados continuam ligados ao assunto “peixe” ou piscicultura. Um deles é o próprio Mauro Mendes, autor da lei que proibiu a pesca e que tenta, até hoje, viabilizar a legislação proibicionista no Supremo Tribunal Federal (STF) diante de protestos e reclamações de pescadores e ribeirinhos.

Estes grupos alegam que terão seus modos de vida afetados e perderão sua profissão ao longo dos próximos anos. Para eles, a verdadeira razão para a escassez de peixe no Pantanal e em Mato Grosso, não é a pesca e sim a construção de hidrelétricas nos rios.

Ao mesmo tempo em que Mauro trava uma batalha histórica contra uma das maiores tradições da baixada cuiabana, a pescaria, o seu ex-sócio e atual presidente do Grupo JBS, Gilberto Meireles Xandó Baptista, avança sobre esse mercado considerado promissor.

Em 2021, a JBS comprou a Huon US$ 314 milhões, a segunda maior empresa de aquicultura de salmão da Austrália. Agora, a ideia é expandir a produção de carne de peixe em todo o mundo. Para isso, a JBS deverá contar com a expertise de Gilberto Xandó Baptista, que foi investidor da Nativ Pescados desde pelo menos 2010, até a renúncia coletiva do Conselho de Administração.

A relação de Mauro e Gilberto Xandó é antiga e também próxima. O governador foi convidado pelo diretor da JBS para visitar um frigorífico da empresa em Diamantino, em novembro do ano passado.

Outro lado - A reportagem do , entrou em contato com todos envolvidos, mas não obteve êxito até o fechamento da matéria. Porém, o espaço segue aberto para manifestações a qualquer tempo.

 

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