O governo federal publicou ontem a medida provisória em que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) regulamenta o aumento de 30% para 35% do limite do empréstimo consignado — aquele que é descontado direto na folha de pagamento. A operação parece oportuna: ao mesmo tempo em que há um crescimento na oferta de crédito, este mês os aposentados e pensionistas correm o risco de não receber, pela primeira vez em nove anos, o adiantamento de parte do 13º salário. Apesar de a medida poder aliviar o bolso de quem contava com a renda extra, especialistas alertam que é preciso cuidado para não se endividar.
O novo limite é válido para trabalhadores no regime CLT, aposentados, pensionistas e servidores públicos. De acordo com o texto, publicado no Diário Oficial da União, os 5% ampliados só poderão ser usados para pagamento de compras com o cartão de crédito. Para o economista Andrew Storfer, da Associação Nacional dos executivos de Finanças, Administração e Contabilidade, o ideal é evitar qualquer tipo de tomada de empréstimo.
“Ainda que os juros do empréstimo consignado sejam menores que os do cartão de crédito ou do cheque especial, eles ainda assim são altos”, explica. “A tendência é a renda estacionar ou até diminuir, e, portanto, é desaconselhável assumir dívidas e comprometer a renda”.
Para Daniel Souza, professor de Economia do IBMEC, o uso do consignado só é válido para quitar despesas com juros mais altos, como o do cartão de crédito ou do cheque especial, ou em casos que envolvem despesas com saúde que seriam pagas com o adiantamento do 13º. “Gastar esse dinheiro com viagens, reforma da casa ou presentes é mau negócio”.
Aposentado há três anos,Fernando Iacovo, de 61, lamenta o atraso na liberação do 13º. “Não acho válido aproveitar essa ampliação da margem consignável e comprometer a parcela do 13º que ainda não entrou e não se sabe quando vai entrar”, comenta.
A decisão de não pagar o adiantamento de 50% do 13º de beneficiários do INSS não foi divulgada oficialmente. A medida foi tomada em meio a conflitos entre os ministros da Previdência Social, Carlos Gabas, e da Fazenda, Joaquim Levy, que não quis assinar o pagamento. A notícia não foi bem recebida por quem contava com o dinheiro extra já neste mês.
O aposentado Josef Holcman, 82, acredita que o problema foi provocado por falta de planejamento. “Esse atraso pega muitas pessoas de surpresa. A falta de dinheiro afeta principalmente os menos favorecidos”, lamenta.
Número de devedores aumenta
Indicadores do Serasa Experian de Inadimplência do Consumidor mostram que o número de pessoas que deixaram de pagar suas dívidas aumentou 0,6% em julho comparado ao mês anterior.
Em relação ao mesmo período do ano passado, a alta é de 19,4%. Já no acumulado do ano até julho com o mesmo período do ano anterior, o índice subiu 16,8%.
O aumento foi provocado pela inadimplência com cartões de crédito, financeiras, lojas e prestadoras de serviço, com elevação de 3,5% e contribuição de 1,6 ponto percentual. Segundo economistas, o desemprego, a inflação e os juros altos têm comprometido o orçamento do consumidor.
Quando o empréstimo com desconto em folha vale a pena?
Confira as situações em que o uso do empréstimo consignado exige alguns cuidados:
Não opte pela modalidade de crédito para pagar despesas supérfluas, como a compra de um carro, uma televisão, roupas, presentes para familiares, viagens ou na reforma da casa. Ainda que o empréstimo consignado ofereça juros mais baixos que os do cartão de crédito ou do cheque especial, o momento é de conter gastos.
Saiba quando é interessante usar o consignado para reordenar o orçamento da casa:
O uso do empréstimo é recomendado em situações de sufoco e urgência. Nesse caso, vale a pena recorrer ao crédito para pagar dívidas correntes que têm juros mais altos, pagar impostos como IPTU e IPVA, ou na necessidade de conseguir dinheiro para custear emergências médicas, como tratamentos ou cirurgias.
Especialista orienta aposentado a ter cuidado com empréstimos feitos para ajudar terceiros:
O economista Andrew Storfer mostra que a maior parte dos consignados feitos por aposentados e pensionistas é feita para ajudar terceiros, como amigos ou familiares. Para ele, é preciso que o beneficiário esteja preparado para dizer “não” quando o caso não for urgente. É preciso reunir a família e conversar sobre as dificuldades.
Economista Carlos Cova: ‘Reserve pelo menos 10% do que ganha por mês’
“Faça uma análise dos seus gastos nos últimos seis meses e os coloque em uma planilha. Verifique os gastos obrigatórios. Dentre eles, identifique onde é possível poupar — controlar água, luz, telefone, mudar hábitos alimentares. A partir dessas medidas, comece uma poupança mensal para eventuais contingências (reserve ao menos 10% do que ganha por mês). Após poupar o equivalente a pelo menos dois meses de salário, aí sim avalie se vale a pena antecipar recursos por meio de crédito para algum gasto corrente, mas sempre usando no máximo uma prestação menor do que o valor que antes já estava habituado a poupar, e sempre guardando a diferença.”