A deflação (queda de preços) do grupo alimentação e bebidas pode durar pouco no Brasil. É que, após o recuo de 0,51% no IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) de setembro, o segmento deve voltar a subir a partir de outubro, projetam economistas.
A expectativa é que as altas ao longo dos três últimos meses de 2022 sejam mais moderadas do que os avanços registrados no primeiro semestre.
Divulgada nesta terça (11) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a deflação de 0,51% em setembro veio bastante associada à baixa do leite longa vida, destaca o economista Daniel Karp, do banco Santander Brasil.
Os preços do produto recuaram 13,71%, após disparada em meio ao período de entressafra, que reduz a oferta disponível no mercado.
De acordo com Karp, a trégua do leite deve ter impacto menor em outubro. Os preços, sinaliza, estão se estabilizando nas gôndolas dos supermercados.
Assim, o IPCA de alimentação e bebidas deve ter uma elevação próxima de 0,3% neste mês, projeta o analista. "A queda do leite está parando na margem." Ele não vê perspectiva de nova deflação para os alimentos no restante do ano.
Marco Caruso, economista-chefe do banco Original, tem avaliação semelhante. Segundo ele, o segmento de alimentação e bebidas deve subir na faixa de 0,20% a 0,25% em outubro.
Essa perspectiva, diz, está mais associada a componentes sazonais e à base de comparação, com uma possível devolução de parte da queda verificada no mês passado.
Em 12 meses, a inflação acumulada pelo grupo foi de 11,71% até setembro. O avanço estava em 13,43% até agosto. "Os preços estão subindo menos, mas os níveis ainda estão altos", afirma Caruso.
A carestia de alimentos pressiona Jair Bolsonaro (PL) na corrida eleitoral deste ano. Em busca de votos para o segundo turno da disputa presidencial contra Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o presidente tenta melhorar sua aprovação junto aos eleitores mais pobres.
É justamente essa camada da população que sente mais a inflação da comida –e em que Lula possui ampla vantagem. Isso ocorre porque a compra de alimentos absorve uma fatia maior do orçamento das famílias mais vulneráveis.
O segundo turno das eleições está agendado para 30 de outubro. Bolsonaro ficou atrás de Lula no primeiro turno.
"Alimentação e bebidas têm muitas flutuações de preços, dependem bastante do ambiente internacional, das commodities", aponta o economista Reginaldo Nogueira, diretor-geral do Ibmec São Paulo e Brasília.
"Depois dos aumentos no começo do ano, dificilmente terão um crescimento tão acelerado. Também é difícil que voltem a ter queda. É mais provável que haja aumentos moderados", completa.
No primeiro semestre de 2022, a comida ficou mais cara em razão dos problemas de oferta com o clima adverso e dos impactos econômicos da Guerra da Ucrânia, entre outros fatores.
Em março e abril, por exemplo, a inflação de alimentação e bebidas chegou a rodar acima de 2% ao mês, segundo o IPCA.
A baixa em setembro (-0,51%) é a maior desde maio de 2019 (-0,56%). O grupo não recuava desde novembro de 2021 (-0,04%).
Além da trégua do leite, outro destaque no mês passado foi a redução do óleo de soja (-6,27%), conforme o IBGE.
A cebola, por outro lado, saltou 11,22%. No acumulado de 12 meses, o produto disparou 127,3% até setembro. O IBGE associa a carestia a fatores como a redução da área de plantio.
Em termos gerais, o IPCA recuou 0,29% em setembro. Foi o terceiro mês consecutivo de deflação. Mais uma vez, a queda foi puxada pela redução da gasolina.
É o terceiro recuo consecutivo do índice. Também é a maior baixa para setembro na série histórica desde o início do Plano Real, em 1994.
O IPCA já havia caído 0,36% em agosto e 0,68% em julho. Uma sequência de três meses de deflação não era verificada desde 1998.
Analistas consultados pela agência Reuters, porém, projetavam uma queda mais forte em setembro, de 0,34%. Segundo instituições financeiras, o IPCA deve voltar para o campo positivo em outubro, após os efeitos mais intensos dos cortes tributários sobre os combustíveis. O IPCA do mês só será divulgado em 10 de novembro, após o pleito.
No acumulado de 12 meses, o índice de inflação perdeu fôlego, mas segue em alta. O avanço foi de 7,17% até setembro, o menor desde abril de 2021 (6,76%). O acumulado estava em 8,73% até agosto deste ano.
Dos 9 grupos de produtos e serviços pesquisados, 4 tiveram queda no mês passado, apontou o IBGE. Apesar de recuar menos (-1,98%) do que em agosto (-3,37%), o segmento de transportes teve novamente o principal impacto para a deflação. A contribuição foi de -0,41 ponto percentual em setembro.
Comunicação (-2,08%) e alimentação e bebidas (-0,51%), ambos com -0,11 ponto percentual, vieram na sequência. O grupo artigos de residência também recuou (-0,13%).
Do lado das altas, destacam-se vestuário (1,77%), com a maior inflação do mês, e despesas pessoais (0,95%), com a principal pressão positiva (0,10 ponto percentual).
"De modo geral, o pior momento da inflação ficou para trás. Parte se deu pelas desonerações de impostos que o governo fez e parte veio pelo contexto internacional", avalia Caruso, do banco Original.
O combustível recuou 8,33% no mês passado, ainda sob efeito do teto para cobrança de ICMS (imposto estadual) e dos cortes de preços nas refinarias da Petrobras.
Segundo analistas, essas medidas até podem gerar impactos residuais na inflação da categoria em outubro. Porém, o petróleo vem dando sinais de retomada nos últimos dias no mercado internacional.
Essa situação pressiona a Petrobras, já que as cotações da commodity servem como parâmetro para a política de preços da estatal.
Em outras palavras, a valorização do petróleo abre espaço para aumentos por parte da companhia. Resta saber se a estatal tomará essa decisão às vésperas do segundo turno.
Na abertura do mercado desta terça, o preço médio da gasolina nas refinarias brasileiras estava R$ 0,31, por litro, abaixo da paridade de importação. O conceito simula quanto custaria importar o combustível. O cálculo é da Abicom (Associação Brasileira de Importadores de Combustíveis).
Karp, do Santander, projeta uma volta do IPCA para o campo positivo em outubro, após os três meses consecutivos de deflação. A alta deve ficar em torno de 0,3%. O banco Original também prevê uma alta na casa de 0,3%.
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