O sorriso largo e cativante, e o olhar direto e franco são algumas das características de uma menina de oito anos, moradora de Realengo. Outra particularidade de Adrielly Pacheco é a generosidade e o senso de solidariedade. Em fevereiro passado, em vez de pedir aos pais uma festa de aniversário, com direito a bolo e refrigerantes, a jovem preferiu comemorar a data com pessoas desconhecidas, oferecendo de presente quentinhas para os moradores que vivem nas ruas do bairro da Zona Oeste.
A ideia da menina de trocar a festa de aniversário em uma lanchonete de 'fastfood' pela ajuda ao próximo começou durante as idas e vindas que ela costuma fazer no caminho entre sua casa e a Escola Municipal Stella Guerra Duval, também em Realengo. Afinal, no trajeto, a menina sempre se deparava com moradores de rua, em especial com Dona Ednalva, que não sabe dizer quantos anos tem, mas há três vive na Rua Capitão Teixeira.
Segundo Adrielly, o desejo de ter uma festa de aniversário solidária também passou a tomar forma e se concretizar após assistir vídeos de pessoas que costumam ajudar os mais necessitados. "Eu via vídeos na internet onde um menino dava dinheiro, roupas, comida. Eu passava para ir para a escola e via aquela mulher e os amigos dela. Eu disse que queria dar comida para aquelas pessoas", explica a menina, que, em um primeiro momento, já tinha até pensado no que iria servir na quentinha. "Macarrão com carne moída, meu prato predileto", conta.
O cardápio, no entanto, foi feijoada, doada pela proprietária do hostel onde a mãe da menina, Luciana Pacheco, trabalha. Em 10 de fevereiro, dia do aniversário de Adrielly, foram servidas 50 quentinhas para os moradores de rua. "Eu falei para minha mãe que neste ano queria de presente dar 50 quentinhas e conseguimos", vibra.
Caçula da família, Adrielly sonha em ser professora para poder ajudar e ensinar as crianças. Enquanto não torna o desejo em realidade, ela quer abrir mão das festas de aniversário em favor dos moradores de rua. "Quero fazer isso todo ano. Prefiro trocar o bolo e dar comida", afirma.
Samba e brincadeiras
Apesar de ter pedido para não ter festa, Adrielly teve o bolo de aniversário e a data foi comemorada. "Antes de sairmos para a distribuição das quentinhas, teve bolo com direito a toda família cantar o parabéns pra você. Afinal, era o aniversário dela e não poderíamos deixar de comemorar", lembra a mãe.
Criada pela avó Ana Lúcia Pacheco desde os quatro meses, por necessidade da mãe ter que trabalhar, a menina é o xodó da casa. Ana Lúcia conta que até hoje fica emocionada pela decisão da neta. "Fiquei emocionada, não acreditei. Ela adora festa, adora dançar. Eu falei para a mãe dela, se é isso que ela quer, então faz. Até hoje não acredito na escolha de Adrielly. Ela estava feliz, chorei muito naquele dia. Hoje, quando vejo o que aconteceu com os alunos de uma escola de São Paulo, penso nela, a gente fica com medo do que possa acontecer", conclui.
Menina de hábitos simples, os oito anos de Adrielly estão presentes nas brincadeiras de pique e com a boneca favorita, a Lulu. Ela também gosta de cozinhar e aprendeu com a irmã, Marcelly, a preparar arroz e farofa. Vaidade também não falta. Em um brecho próximo da casa, ela costuma comprar roupas e sapatos. Mas a grande paixão é, sem dúvida, o samba. Não poderia ser diferente, com pai e um tio músicos. A música preferida é 'Bororó', do grupo Fundo de Quintal.
Decisão surpreendeu os pais
Mais de um mês após a data de aniversário da Adrielly, os pais da menina ainda se dizem surpresos pela decisão. Luciana Pacheco conta que achava, no início, que tudo não passasse de invenção.
"Ela começou com a ideia em dezembro dizendo que não queria ir a shopping ou cinema, queria entregar quentinhas. No princípio meu marido e eu ficamos sem entender, um pedido desse de uma criança que estava fazendo oito anos. Decidimos fazer macarrão com carne moída. Mas na véspera do aniversário dela teve uma festa com feijoada no hostel que trabalho. Eu comentei com a proprietária e ela doou a feijoada.Nunca imaginei em distribuir comida na minha vida", diz.
Para o pedreiro, músico e pai de Adrielly, Ricardo Soares, a ideia da menina foi surpreendente e maravilhosa."Foi uma atitude bacana, porque o maior prazer não foi ir lá só para dar comida, foram as coisas que aconteceram, como perguntarem qual igreja a gente pertencia e eu explicava que era aniversário da minha filha, até o pessoal cantar o "Parabéns" para minha filha", conta Ricardo que pensa em fazer ações deste tipo mensalmente.
Músico ajudou catadora e dependente químico
O músico Carlos Cavanha, amigo da família da menina não pensou duas vezes em deixar um compromisso de trabalho para participar da ação promovida por Adrielly. "Ela me disse assim: tio preciso de você para no dia do meu aniversário quero distribuir comida para pessoas carentes. Não levei a sério. Quando chegou mais próximo ela começou a cobrar, eu tinha esquecido. No sábado me ligaram eu fui ajudar. Ela deu uma lição de vida para muita gente. Um gesto de grandeza dela. Isso tocou a gente", conta.
Entre no grupo do VGNotícias no WhatsApp e receba notícias em tempo real (CLIQUE AQUI).