O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, julgou procedente, em parte, ação cível originária proposta pelo Governo de Mato Grosso, e determinou que a União exclua o Estado, em relação ao Convênio 701334/2008-SPDCAR/SEDH/PR, do sistema Cauc/Siafi/Cadin ou qualquer outro cadastro restritivo.
O Convênio que gerou a negativação do Estado é referente à construção de uma unidade socioeducativa em Várzea Grande, para atender adolescentes infratores. A obra está abandonada pelo Estado.
Segundo consta da decisão, o Estado não poderá ser incluso em cadastro restritivo até que ocorra a finalização de procedimento de tomada de contas especial no convênio citado.
Conforme consta nos autos, para a execução do plano de trabalho avençado, o valor previsto totalizou R$ 7.506.116,45, dos quais 5.400.000,00 seriam decorrentes de repasse único da União, e R$ 2.106.116,45 provenientes de contrapartida do Governo de Mato Grosso.
No entanto, após quatro prorrogações de prazo por meio de termos aditivos, a validade do convênio encerrou em 17.12.2014. O Estado aduz que a Coordenação-Geral do Sistema Nacional de Medidas Socioeducativas, depois de analisar a prestação de contas do convênio, concluiu, em parecer, que não seria possível receber a obra como executada, mesmo que tenha sido parcialmente implementada.
O Governo de Mato Grosso esclareceu nos autos que coordenador-geral de Convênios da Secretaria de Gestão da Política de Direitos Humanos informou que a Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente reprovou integralmente a prestação de contas do convênio e, que, em consequência, foi solicitada a devolução, no prazo de 45 dias, da quantia de R$ 6.468.325,58, sob pena de apuração de responsabilidade e posterior instauração de tomada de contas especial.
O Governo de Mato Grosso alega, ademais, afronta aos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, uma vez que pode ter seu nome incluído no Cauc/Siafi/Siconv sem a realização do processo administrativo concernente à tomada de contas especial. Sustenta também violação ao princípio da proporcionalidade, pois a medida adotada seria desproporcional à finalidade pública almejada. Argumenta, ainda, que a inadimplência apontada pela União é imputável exclusivamente às administrações estaduais anteriores, em respeito ao princípio da intranscendência das sanções.
Além de afirmar que a inscrição no Cauc ou Siconv o impedirá de firmar outros convênios, além de receber repasses daqueles ainda em andamento.
Em 22.10.2015, houve o deferimento do pedido de antecipação de tutela para impedir a inserção do Estado do Mato Grosso no Cauc/Siafi/Siconv, concernente ao Convênio 701334/2008-SPDCAR/SEDH/PR. Dessa decisão, a União interpôs agravo regimental, requerendo, em síntese, a revogação da antecipação de tutela deferida. Em sua contestação, a União sustenta a regularidade da inscrição no Cauc, esclarecendo que está obrigada a realizar essa providência por força da Lei de Responsabilidade Fiscal. Arguiu, ainda, que o ato não foi praticado de forma desproporcional, porquanto a prestação de contas do convênio foi reprovada pela área técnica. Alegou, também, que ao caso não se aplica o princípio da intranscendência subjetiva das sanções e ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos requeridos na inicial e pela condenação sucumbencial do autor.
Já a Procuradoria-Geral da República emitiu parecer pela improcedência do pedido, sustentando que a inclusão da inadimplência no Cauc tem caráter meramente declaratório e não desrespeita o princípio do devido processo legal. Concluiu, ainda, ser inaplicável o princípio da intranscendência subjetiva das sanções ao caso ora examinado.
Porém, o ministro entendeu que: “no que se refere à violação dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, entendo que os argumentos se mostram suficientes para o provimento parcial da ação cível originária, a fim de determinar que a União retire ou não inclua, em cadastros restritivos, o Estado de Mato Grosso em relação ao Convênio 701334/2008-SPDCAR/SEDH/PR”.
Conforme Gilmar Mendes, a jurisprudência do STF firmou posicionamento no sentido de que a inscrição em cadastro de inadimplentes que repercuta no repasse de verbas imprescindíveis para a continuidade de projetos nos entes estaduais e municipais deve ser precedida de tomada de contas especial.
“Em outras palavras, primeiro a União, por meio de seus órgãos constitucionalmente instituídos, deve proceder à tomada de contas especial, pois somente após o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa, é que se permite a inscrição dos demais entes federativos em cadastros restritivos” cita o ministro.
Portanto, para o ministro, “pendente de conclusão a tomada de contas especial, não pode a União proceder à inscrição do Estado de Mato Grosso no Cauc/Cadin/Siafi/SICONV, uma vez que, ao assim atuar, viola o princípio constitucional do devido processo legal, conforme amplamente decidido por esta Corte em inúmeros precedentes”.
Mendes ainda destaca em sua decisão que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) não deve ser aplicada de forma limitada ao mandato dos gestores do Poder Executivo, haja vista ser antirrepublicano e incoerente ao Estado de Direito a hipótese de se apagar o passado por simples mudança de governante, no mínimo, a cada quatro anos.
“Em outras palavras, a LRF não se destina ao mandatário, mas ao mandante (povo), em proteção ao Estado, evitando desgovernos que dilapidem as contas públicas. A União, ao firmar convênios com os demais Entes Federados, não transfere recursos a governantes específicos, mas, sim, à correspondente pessoa jurídica de direito público, que passa a ser responsável pela execução do objeto desses convênios e pela consequência jurídica de eventual inadimplemento. Importante salientar que, ao mesmo tempo em que o gestor não pode ser pessoalmente responsabilizado por irregularidades cometidas outrora pelo ente federativo, este deve suportar as sanções decorrentes de sua atuação ilegal, seja no passado remoto ou próximo, ou mesmo no presente, como corolário do princípio republicano” diz trecho extraído da decisão.
Com isso, o ministro decidiu: “Ante o exposto, por tratar-se de posicionamento reiterado desta Corte (art. 21, § 1º, do RISTF): julgo procedente, em parte, a presente ação cível originária para determinar a exclusão do Estado de Mato Grosso, em relação ao Convênio 701334/2008-SPDCAR/SEDH/PR, do sistema Cauc/Siafi/Cadin ou qualquer outro cadastro restritivo até que ocorra a finalização do respectivo procedimento de tomada de contas especial; declaro prejudicado o agravo interposto pela União; e condeno a União ao pagamento dos honorários advocatícios no valor de R$ 3.000,00”.
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