Autor de um relatório criticado publicamente pela presidente Dilma Rousseff, o ex-diretor da área internacional da Petrobras Nestor Cerveró prestou depoimento no Senado nesta quinta-feira (22.05), ao longo de quase três horas, a uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) praticamente esvaziada. Dos 13 integrantes do colegiado criado para investigar denúncias contra a estatal do petróleo, apenas três senadores, todos da base aliada, compareceram à audiência convocada para sabatinar o responsável pela operação de compra da refinaria de Pasadena, no Texas (EUA).
Em março, a Presidência da República divulgou nota oficial na qual afirmava que a compra da refinaria norte-americana foi realizada com base em documento "técnica e juridicamente falho" porque omitia duas cláusulas que, se conhecidas, "seguramente" não seriam aprovadas pelos conselheiros da Petrobras. À época em que foi discutida a transação, a presente Dilma Rousseff ocupava a chefia da Casa Civil do governo Lula e comandava o conselho de administração da estatal.
Agendada para as 10h15, a sessão da CPI começou pontualmente nesta quinta. Cerveró, no entanto, passou os primeiros 15 minutos da audiência prestando esclarecimentos somente para o presidente da comissão, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), e para o relator, senador José Pimentel (PT-PE).
Integrante da base governista, a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) foi a única parlamentar que não compõe a mesa diretora da CPI que compareceu ao depoimento. Ela chegou atrasada à audiência, mas chegou a substituir Vital na condução da sessão em um momento em que ele teve de se ausentar. Com exceção dos três senadores, apenas assessores e jornalistas ocupavam as cadeiras do plenário.
Donos das maiores bancadas do Senado, PMDB e PT dividem os principais assentos da CPI e comandam a condução dos trabalhos. Em razão da maioria expressiva de governistas no colegiado, a oposição decidiu boicotar a comissão.
Os oposicionistas defendem a instalação de uma CPI mista, composta por deputados e senadores, para apurar as suspeitas contra a Petrobras. Como os aliados da presidente Dilma Rousseff na Câmara costumam ser menos fiéis ao Palácio do Planalto do que os do Senado, a oposição acredita que poderá aprofundar as investigações com a presença de deputados federais na comissão de inquérito.
Na semana passada, durante o primeiro depoimento da CPI, o ex-presidente da Petrobras Sergio Gabrielli também foi ouvido apenas por parlamentares aliados ao governo. Na avaliação da oposição, os parlamentares governistas se limitaram a fazer perguntas “amigáveis” ao ex-dirigente da petroleira.
O ex-diretor repetiu o que disse na Câmara dos Deputados no mês passado e negou que tenha tido a intenção de “enganar” a presidente Dilma Rousseff, que chefiava o conselho de administração da Petrobras na época da aquisição de Pasadena, em 2006.
Nestor Cerveró admitiu que era o responsável pelo resumo executivo que serviu de base para o Conselho de Administração aprovar a compra da planta norte-americana.
Uma das cláusulas foi a Put Option, que determinava que, em caso de desacordo entre os sócios, a outra parte seria obrigada a adquirir o restante das ações. A segunda era a Marlim, que garantia à empresa belga Astra Oil, sócia da Petrobras no negócio, um lucro de 6,9% ao ano.
O executivo confirmou que as duas cláusulas não constavam no resumo porque se tratavam de “detalhes contratuais”. Para Cerveró, ainda que o conselho tivesse tido conhecimento da Put Option e da Marlim, a negociação seria “certamente” aprovada.
“É um detalhe que a gente não coloca num resumo porque senão deixaria de ser um resumo e passaria ser o contrato. Não foram colocadas porque não tem interferência nos critérios para aprovação do conselho”, alegou.
Questionado sobre quem seria o “responsável” pela compra da planta de refino, Cerveró respondeu: “todos nós”. Ele voltou a dizer que a decisão foi colegiada e aprovada sem “nenhum tipo de ressalva” por nenhum integrante do conselho ou da Direitoria Executiva.
“Não estou querendo me isentar de culpa, pelo contrário, quero assumir, sou corresponsável por essa decisão”.
'Carro velho'
Durante o depoimento desta quinta, o relator José Pimentel fez perguntas em bloco sobre a compra da refinaria de Pasadena, efetuada quando Cerveró chefiava a área internacional da petroleira. Não houve réplica às respostas do ex-diretor.
Indagado sobre as condições físicas da refinaria, o antigo dirigente da petroleira classificou a planta de Pasadena como um “carro velho” que havia sido modernizado. Ele ressaltou, entretanto, que há 40 anos não são construídas refinarias nos Estados Unidos, entre outros motivos, devido à dificuldade de se obter licenças ambientais para esse segmento. O ex-diretor disse que no território americano, em razão das restrições burocráticas, é mais fácil comprar uma planta antiga e adequá-la às necessidades da empresa.
“Quanto a carro velho eu posso até concordar porque não tem carro novo no refino norte-americano. Mas carro obsoleto, não. É um carro velho, mas totalmente modificado ao que há de mais moderno no mercado de refino”, destacou Cerveró.
De acordo com o ex-diretor da área internacional, a estratégia da Petrobras era duplicar a capacidade da refinaria para a produção de 200 mil barris de petróleo por dia, além de adequá-la ao processamento do óleo pesado brasileiro. Como o planejamento nunca saiu do papel, Cerveró disse que não é possível avaliar se Pasadena foi um “bom negócio”. “Não tem como ser avaliado porque tinha uma alta rentabilidade prevista”, justificou.
A exemplo do que havia defendido Sérgio Gabrielli no depoimento da semana passada, Nestor Nestor Cerveró defendeu que, apesar de ter passado por dificuldades, atualmente a planta do Texas é "lucrativa".
“Hoje, felizmente, devido a uma mudança no ciclo das refinarias – elas mudam o cenário de lucratividade – Pasadena, graças a uma disponibilidade de petróleo leve proveniente de óleo xisto americano, tem tido margens e resultados significativos. Essa é a informação que eu tenho”, ressaltou o ex-diretor.
Quórum
A ausência da maioria dos integrantes da comissão impediu que fosse votado requerimento apresentado pelo líder do PT, Humberto Costa (PT-PE), para convocar o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, preso pela Operação Lava Jato, da Polícia Federal.
Questionado nesta quinta pela senadora Vanessa Grazziotin sobre o envolvimento de Paulo Roberto Costa na aquisição da planta de refino de Pasadena, Cerveró disse que o ex-diretor de Abastecimento não teve participação no processo na operação. Conforme o ex-dirigente da área internacional, a atuação de Paulo Roberto se limitou à segunda fase do negócio, conforme afirmou, porque sua área era a responsável pela comercialização das refinarias.
“Ele teve participação na definição da estrutura administrativa da trading. Ele indicou as pessoas, mas não participou a negociação da compra”, respondeu Cerveró.
Na próxima terça (27), a CPI do Petrobras irá ouvir a presidente da Petrobras, Graça Foster. Já na quinta-feira (29), os senadores irão tomar o depoimento do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) José Jorge e do substituto de Cerceró na diretoria internacional da Petrobras, Jorge Zelada.
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