Chips dos telefones celulares trocados, famílias fugindo soturnamente na madrugada e um pequeno hospital com metade do quadro de funcionários desfalcado do dia para a noite.
Esse é o cenário da baiana Teofilândia (194 km de Salvador), pequena cidade mobilizada em busca do paradeiro de 22 moradores que, num bilhete de bolão, acertaram as seis dezenas da Mega-Sena da Virada e irão dividir um prêmio de R$ 56 milhões.
Os sortudos são (ou eram) colegas de trabalho no único hospital local. Fizeram um bolão e dividiram o prêmio. Quatro deles, que apostaram R$ 10, ficarão com R$ 4,3 milhões cada. Os outros 18, que colocaram R$ 5 no bolão, receberão R$ 2,1 milhões.
O bilhete já foi retirado na agência da Caixa do município vizinho de Serrinha. Desde então, os felizardos fecharam as portas de suas casas e deixaram Teofilândia, com rumo desconhecido.
A fuga dos milionários virou de ponta-cabeça a rotina no município de 22 mil habitantes, no sertão baiano.
O movimento na casa lotérica mais que dobrou e a prefeitura recebeu inúmeros pedidos de emprego de aspirantes aos cargos ocupados pelos ganhadores no hospital.
Pior para os outros funcionários do hospital: muitos reclamam porque não conseguem mais barganhar no comércio da cidade vizinha.
"Lá fora, acham que todos ficamos milionários", disse o agente comunitário de saúde Cristiano Cordeiro.
Anteontem, ele era um dos 14 apostadores que enchiam o pequeno saguão da casa lotérica Rubi quando a Folha esteve no novo point local.
Indiferentes ao dito segundo o qual o raio não cai duas vezes no mesmo lugar, preenchiam bilhetes da Loto Fácil, Quina e Mega-Sena. A lavradora Maria José Santos, 37, apostava pela primeira vez. "Se Deus foi bom com eles, vai ser comigo também."
Com arrecadação anual de R$ 40 milhões, inferior ao valor do prêmio, a cidade vê nos novos milionários uma chance de prosperidade e quer a volta dos conterrâneos.
"Seria uma bênção se o dinheiro do prêmio fosse gasto na cidade, com novos empreendimentos", diz o prefeito Adriano de Araújo (PT).
A falta de postos de trabalho é o principal problema da cidade, o que faz com que 42% da população viva abaixo da linha da pobreza -renda per capita de até R$ 140.
Até o momento, apenas um funcionário sortudo pediu exoneração. Quatro tinham contrato até 2013, três estão em férias, seis pediram licença e oito estão sem trabalhar.
"Ligo, mas os telefones só dão caixa postal. Soube que eles trocaram de chip", afirma o motorista do hospital Antônio Matos, 41.
A prefeitura contratou temporários e remanejou funcionários de postos de saúde para o hospital. O salário médio é de R$ 1.100.
PARA A PRÓXIMA
Antônio de Jesus, motorista da unidade de saúde, estava na lista do bolão -mas viajou antes de pagar sua parte do acordo e ficou de fora.
"Estou numa boa. A sorte não me procurou desta vez, paciência. Ganhei experiência para a próxima", diz.