O Pantanal mato-grossense está mais seco, com menos áreas alagadas e cada vez mais vulnerável à degradação. A constatação é de um estudo publicado em fevereiro de 2025 na revista científica Environmental Research Letters. Intitulado A ineficácia das políticas ambientais e de combate ao fogo na maior planície alagada do mundo, o trabalho foi desenvolvido por pesquisadores do Canadá e do Brasil, com participação de instituições como o Instituto Nacional de Pesquisas do Pantanal (INPP), a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e o Instituto Nacional de Áreas Úmidas (INAU).
A análise revela que as políticas ambientais atualmente em vigor não têm conseguido preservar a vegetação nativa, assegurar a disponibilidade de água ou conter os incêndios que atingem o bioma. A pesquisa examina legislações como a Lei Federal nº 12.651/2012 (novo Código Florestal) e o Decreto Estadual nº 774/2024, que autoriza a conversão de áreas de vegetação nativa em pastagens com gramíneas exóticas.
Segundo os dados apresentados, o Pantanal perdeu mais de 8 mil km² de áreas alagadas nos últimos 37 anos. Mesmo as Áreas de Preservação Permanente (APPs), protegidas por lei federal, vêm sofrendo redução. A substituição dessas zonas por gramíneas exóticas, somada ao uso de drenagem artificial, agrava o processo de seca. Regiões com esse tipo de intervenção apresentam menor taxa de evapotranspiração, prejudicando o ciclo hidrológico natural.
Outro ponto abordado é a ineficácia dos decretos que proíbem queimadas durante o período seco. O estudo mostra que, entre 2019 e 2022, apenas no ano de 2022 as áreas queimadas ficaram abaixo do esperado. Em 2020, por exemplo, os incêndios consumiram mais de 10 mil km², número quase sete vezes maior do que o registrado no ano anterior.
Queimadas aumentaram significativamente — com pico em 2020 — apesar dos decretos de proibição
O Decreto nº 774/2024, vigente no Estado de Mato Grosso, é duramente criticado por permitir o uso de reservas legais — áreas legalmente destinadas à conservação — para práticas de pecuária extensiva. A estimativa é de que até 15 mil km² de vegetação nativa possam ser convertidos em pastagens, o que faria com que a extensão de áreas de pastagem exótica se igualasse, proporcionalmente, à vegetação nativa remanescente.
Para os autores do estudo, a expansão descontrolada das pastagens, o uso de gramíneas não nativas e a pressão por atividades econômicas sem planejamento comprometem a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos do Pantanal. “As políticas atuais não asseguram a conservação do bioma. É necessário adotar medidas baseadas em ciência, promover o manejo sustentável e restaurar áreas já degradadas”, afirmam.
A pesquisa também chama atenção para o baixo investimento público em ações de prevenção e controle de incêndios. Enquanto bilhões de reais são destinados ao setor do agronegócio, apenas uma pequena fração é aplicada no combate ao fogo e nas ações contra as mudanças climáticas. Além disso, os pesquisadores cobram o retorno das atividades do Comitê Nacional de Zonas Úmidas, responsável pela implementação da Convenção de Ramsar no Brasil, inativo desde 2022.
Investimentos públicos em prevenção a incêndios são mínimos comparados ao que é destinado ao agronegócio
A conclusão do estudo é contundente: “O Pantanal está sob ameaça real e imediata, e políticas adaptativas, com monitoramento constante e decisões políticas alinhadas à ciência, são essenciais para proteger o bioma e garantir sua sobrevivência.”
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