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Artigos Segunda-feira, 30 de Janeiro de 2017, 10:21 - A | A

Segunda-feira, 30 de Janeiro de 2017, 10h:21 - A | A

opinião

O imponderável e as grandes interrogações

                                                                                                                                                               por Gaudêncio Torquato *

A morte do ministro Teori Zavascki cobre o país com um manto de tristeza. Primeiro, pelo imponderável que volta a acinzentar o nosso horizonte com sombras cheias de interrogações. Teremos um ministro com o senso do dever de Teori para dar o tom adequado às investigações da Operação Lava Jato? Nem bem líamos sobre sua disposição de abreviar férias para ler as delações dos 77 executivos da Odebrecht, missão que tomaria seu tempo nos próximos dias, e nos chocamos com a tragédia que ceifa sua vida. Discreto, compunha aquele figurino tão bem traçado por Francis Bacon: “os juízes devem ser mais instruídos que sutis, mais reverendos do que aclamados, mais circunspetos do que audaciosos. Acima de todas as coisas, a integridade é a virtude que na função os caracteriza‘.

Que juiz será tão comedido quanto Teori? Aquele jeito tranquilo, jamais denotando animosidade, funcionava como uma bússola na mais alta Corte. Foi um magistrado sobre o qual não reinavam dúvidas. Ganhava aplausos unânimes. Elevou seu perfil ao altar dos juízes classificados como “garantistas”, aqueles que tomam decisões acima de vinculações com grupos, partidos ou facções.

Teori ganhou respeito pela qualidade de seus votos. Guardava a maior coleção de delações de toda a história do Judiciário, sobre a qual se dedicará seu sucessor, possivelmente um ministro da 2ª turma. Por mais que este se comporte como um fiel seguidor das normas, haverá sempre quem queira fazer comparações com seu antecessor. Coisa compreensível. Porque Teori era, para a sociedade, o fiador-mor da Lava Jato. O novo relator da Lava Jato acabará levantando dúvidas sobre suas decisões. Se fosse Teori, isso seria feito assim ou assado?

O impacto mais forte ocorrerá na planilha da Operação Lava Jato. Façamos uma análise sobre possíveis ilações. Se o processo decisório nas mãos do novo relator abrir espaço para aliviar a situação de políticos, a inferência será imediata: “a Lava Jato mudou de rumo. A morte de Teori abre espaço para a absolvição de corruptos”. Outra hipótese: “se apenas alguns políticos forem condenados, é porque o novo relator decidiu aliviar a maioria dos implicados, acomodando as camadas do terremoto que ocorreria com a prisão de grande número de políticos”. Dessa forma, a Lava Jato seguiria seu rumo sob uma coleção de suspeitas.

A tendência na área política, como é sabido, é a de buscar um meio termo, algo como a possibilidade de atribuir penas menores para os implicados com recursos do Caixa 2 em campanhas. Há forte disposição para se aprovar um dispositivo que possa ampliar o raio de ação do caixa 2. Isso levaria partidos e atores a procurar se abrigar nesse esconderijo e escapar da zona perigosa da propinagem. Essa ideia também será lançada no “vácuo deixado por Teori”. Ou seja, tudo o que poderá doravante ocorrer acabará ganhando um selo de desconfiança, de complô. É oportuno lembrar que essa disposição está sendo gestada há tempos. Coisa que o ministro Teori Zavascki certamente teria de enfrentar caso continuasse entre nós.

Sem o ministro catarinense, o Brasil perde um baluarte na arena jurídica. Ele expressava domínio técnico das matérias sob sua responsabilidade, lia com tranquilidade os longos votos que produzia com convicção, e não se mostrava contrariado ante eventuais posições de colegas que confrontavam seu parecer. Teori era a extensão do conceito de uma Corte sem suspeita, grave, técnica, da qual fazem parte o ministro Celso de Melo e outros. Não foi objeto de polêmica, mesmo dando votos que possam ter provocado certo barulho, como as decisões que implicaram a prisão do senador Delcídio do Amaral e o afastamento do deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara.

O Poder Executivo, por sua vez, terá enorme papel na ordenação do equilíbrio no Supremo, a partir da nomeação do magistrado para o lugar de Zavascki. Terá de ser um nome acima de qualquer suspeita. As indicações já começaram em torno de perfis e as abordagens abrem duas posições: uma ala que defende a imediata nomeação do novo ministro, que abriga a ideia de o presidente Michel Temer aliviar a carga de pressões que continuará até o desfecho do caso; e o grupo que defende uma decisão não tão imediata, ou seja, após o término do recesso congressual. Este grupo receia que uma indicação tempestiva possa deixar o nomeado no vácuo, aguardando sob tiroteios a sessão da CCJ em que será submetido a uma bateria de perguntas dos senadores.

Ao Senado compete endossar ou negar a indicação do nome escolhido pelo presidente da República. É evidente que a passagem do indicado pelo confessionário dos senadores há de ponderar na decisão do presidente. Nesse momento, observa-se intensa preocupação com os desdobramentos da Operação Lava Jato. E por mais que esse tema seja considerado um tabu ­ com o cuidado para evitar ilação entre a posição do indicado e a continuidade das investigações ­ o processo de escolha ocorrerá sob esse pano de fundo. O universo da política apreciaria ver uma luz no fim do duto do petrolão.

O fato é que o processo será atentamente acompanhado pela Opinião Pública, onde os formadores de opinião exercem papel de destaque. Comentários, análises, pontuações e inferências de todos os lados já começam a se multiplicar. A disputa de interesses acende os polos de poder e faz emergir uma torrente de insinuações e suspeitas. Por isso, a escolha do novo ministro lembra a travessia sobre o fio que une duas montanhas. O presidente há de manter o equilíbrio sem cair no abismo, mesmo sob os solavancos na corda, a cargo de torcidas e grupos que se formam nos dois lados. Por isso, os critérios de competência, conhecimento técnico, apoio do meio jurídico, credibilidade e reconhecimento dos pares, a par da análise da composição da Alta Corte sob o prisma da representatividade regional, integram a planilha de valores que devem inspirar a escolha do nome.

A pergunta é pertinente? E se o novo relator foi designado pela presidente Carmen Lúcia e sob sorteio entre os ministros da segunda turma ou mesmo junto ao corpo inteiro do Supremo? As ilações e interrogações continuarão? A resposta é positiva. A Operação Lava Jato entra em um novo ciclo.

Que a lembrança do ministro Teori Zavascki sirva de lume.

Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor político e de comunicação.

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