O ano de 2023 começou como terminou 2022: um cenário de caos em termos tributários. Isto porque, as Cortes Superiores seguem com uma inclinação parcial em favorecer a fazenda pública, em detrimento dos contribuintes, gerando um desequilíbrio de forças.
Na prática, o que temos presenciado é a quebra do Art. 2º da nossa Constituição, que preceitua que "são poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. O que se percebe nitidamente é que o protagonismo do Supremo Tribunal Federal (STF), em matéria tributária, tem prevalecido.
Isto é reflexo da inércia dos demais poderes. Temos um legislativo fraco na criação e alteração de leis e que não privilegia o debate público sobre as questões fiscais. Contamos ainda com um Executivo inchado e lento no cumprimento da legislação.
Destarte, muitas questões que deveriam ser debatidas e decididas pelo Congresso Nacional acabam sendo regulamentadas pelo Supremo Tribunal Federal. Como por exemplo, na semana passada, quando o STF rompeu com toda uma tradição jurisprudencial e protagonizou a quebra da coisa julgada tributária.
Pelo entendimento predominante, o contribuinte que discutiu a cobrança de um tributo na Justiça e teve a ação encerrada, transitada em julgado a seu favor o que o autorizou a deixar de pagar determinado tributo, perderá esse direito se, tempos depois, o Supremo pré-julgar o tema e decidir que a cobrança é devida.
Isto porque, o que era inconstitucional passa a ser constitucional. Anteriormente, e a coisa julgada, nas relações de trato sucessivo, só seriam interrompidas de forma automática se fosse publicada nova lei que tornasse prejudicado o fundamento jurídico utilizado pela decisão transitada em julgado; ou se a fazenda pública utilizar-se do instrumento jurídico da ação rescisória quando cabível.
Do ponto de vista prático, para o empresário brasileiro a segurança jurídica, considerada como um princípio constitucional protegido pela Carta de 1988 em matéria tributária, não existe mais, pois sempre o STF poderá revisar seu entendimento. Na mesma linha de intervencionismo, o ministro Luiz Fux, em decisão monocrática de caráter liminar, permitiu que os Estados voltassem a cobrar ICMS sobre as tarifas de TUST e TUSD, nas contas de energia elétrica, ainda que legislado pelo Congresso Brasileiro a não incidência.
Ainda que seguindo à risca a regra constitucional da Lei Complementar para tratar de base de cálculo de ICMS, o ministro Fux, infelizmente, decidiu atropelar a Constituição se valendo de um único argumento: perda de arrecadação pelos Estados.
A decisão liminar a favor do Fisco foi concedida não sob fundamento em direito propriamente dito, mas sim porque estes entes tiveram perdas bilionárias à sua arrecadação, em função das reduções de alíquotas praticadas em 2022, com a Lei Complementar 194, que reduziu as alíquotas de energia elétrica em todos os Estados Federados.
O que teremos a partir de agora é um período de total insegurança jurídica, pois uma decisão em favor do contribuinte será sempre provisória. E aproveito para parafrasear o cantor e compositor Renato Russo: “Que país é esse?”.
Pascoal Santullo Neto ([email protected]) é contador e advogado tributarista, sócio do escritório Silva Cruz & Santullo Advogados Associados*
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