por Leomar Daroncho *
O ano inicia com muitas notícias sobre a crise econômica e com a informação de que os bancos teriam proposto ao governo que autorize a utilização da multa rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS como garantia para a concessão de crédito consignado aos trabalhadores da iniciativa privada. A medida estaria sendo estudada pelo Ministério da Fazenda, como alternativa para aquecer a economia.
Esse mecanismo de incentivo ao desenvolvimento econômico, altamente interessante para as instituições financeiras devido ao baixo riscos, apresenta limites e não pode ser a solução de todos os problemas do mercado interno.
O empréstimo consignado com desconto em folha de pagamento teve substancial impulso a partir da na Medida Provisória n.º 130/2003, que deu novo regramento ao instituto, no contexto de um pacote de estímulos à economia brasileira, naquela época. Assim, visou à eliminação de riscos por meio do desconto em folha de pagamento, o que também contribuiria para a diminuição das taxas de juros.
Já abordamos aqui os riscos do empréstimo consignado para o trabalhador. A modalidade de empréstimo de fácil acesso caiu no gosto dos brasileiros sedentos pelo consumo, especialmente os aposentados e os servidores públicos. Já discutimos aspectos da Lei nº 10.820, de 2003, alterada pela Lei nº 13.097, de 2015, que ampliou os limites de comprometimento da renda. Assim, tornou-se possível comprometer até 35% da remuneração disponível, sendo 5% destinados exclusivamente para a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito. Também nesse caso uma medida de interesse das instituições financeiras.
A novidade da proposta em discussão é alcançar não apenas os salários, atingindo também a multa rescisória do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Por isso, entra num caminho ainda mais preocupante.
Independentemente da discussão dos estudiosos acerca da natureza do FGTS, o fato é que a verba, na perspectiva do trabalhador, cumpre a função primordial de viabilizar o pagamento da indenização por tempo de serviço ao empregado demitido sem justa causa. Trata-se de dinheiro que, em regra, proporcionará um alento financeiro à família do trabalhador demitido, num dos momentos mais traumáticos para quem tem no trabalho a fonte de subsistência.
Se os sinais do superndividamento das famílias brasileiras já são preocupantes, a perspectiva de turbinar o consumo comprometendo essa reserva mínima que visa resguardar a família do trabalhador demitido parece avançar em demasia a marca da prudência.
E a discussão ocorre num cenário em que o desemprego passou a assombrar o ambiente econômico e os trabalhadores. Dados oficiais indicam que em 2015 perdemos cerca de 1,5 milhão de postos de trabalho formais, com Carteira de Trabalho.
As projeções para o mercado de trabalho em 2016 também não são boas. Além disso, aumentou o tempo de recolocação dos desempregados no mercado de trabalho. Levantamento recente indica que para 46% dos desempregados esse tempo de busca de um novo emprego já varia de 31 dias a seis meses.
Esse é justamente o momento em que a indenização do FGTS seria mais importante.
A prévia análise do impacto de medidas econômicas é sempre muito complexa. Nossa história recente, todavia, mostra que raramente os bons propósitos se concretizam. As mazelas sociais das aventuras e dos improvisos econômicos, infelizmente, tendem a nos acompanhar.
O comprometimento do FGTS dos trabalhadores, num momento de grave crise, tem o óbvio potencial de proporcionar lucros a quem empresta a baixo risco e, na outra ponta, dificultar a vida dos candidatos ao desemprego.
*LEOMAR DARONCHO é Procurador do Trabalho em Mato Grosso
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