Alberto Scaloppe*
Em pouco mais de um ano o Brasil viu a liberação de agrotóxicos atingirem números alarmantes, questionamentos dos dados de desmate pelo próprio governo, esvaziamento da representação da sociedade civil em colegiados como o Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, bem como viu esvaírem-se recursos internacionais para o Fundo da Amazônia para iniciativas de proteção ao meio ambiente.
Há um desmonte da política ambiental do Estado impede que exerça seu papel de controle e fiscalização de proteção ambiental impondo riscos econômicos que ao agronegócio, economia preponderante do nosso Estado, em face das exigências de mercados importadores de commodities. Não obstante muitos setores socioeconômicos alimentem a retórica conspiratória de que países desenvolvidos defendam a preservação ambiental do Brasil em detrimento do desenvolvimento econômico do país, bem como a indecorosa proposta do ministro de Meio Ambiente, Ricardo Salles, de desburocratizar as normas ambientais a “toque de boiada”, aproveitando-se de um momento trágico para o Brasil e para o mundo Tudo isto tem reflexos comerciais nada favoráveis para o Brasil. Tudo clara e tristemente prejudicial ao nosso Estado e à própria economia agrícola e pecuária.
Somada a desastrosa política diplomática, que tem demandando esforços incomensuráveis de alguns setores para a preservação das relações comerciais, com os mercados importadores dos produtos brasileiros, notadamente as de commodities.
A estratégica de desconstrução das normas jurídicas ambientais pelo Governo Federal confere mais esforços responsáveis do Poder Judiciário para assegurar o regime jurídico ambiental da Constituição Federal e normas infraconstitucionais de proteção ambiental. Teses recentes sobre imprescritibilidade dos danos ambientais e a potencial fixação de entendimento jurisprudencial pelo Supremo Tribunal Federal relativo aos limites territoriais da coisa julgada nas Ações Civis Públicas, são manifestações de proteção constitucional social, político, jurídico ambiental, pelo Poder Judiciário.
Destaca-se que a fixação de limite territorial da coisa julgada em sede de Ação Civil Pública para a proteção ambiental, se confirmada, conforme regula o Art. 16 “A sentença civil fará coisa julgada erga omnes (para todos), nos limites da competência territorial do órgão prolator, exceto se o pedido for julgado improcedente por insuficiência de provas, hipótese em que qualquer legitimado poderá intentar outra ação com idêntico fundamento, valendo-se de nova prova” (Lei 7.347/1985, com a redação dada pela Lei 9.494/1997) fortalecerá as demandas das entidades associativas de caráter civil para a provocação do judiciário para sanar problemas ambientais regionais.
A evidência dos impactos da indecorosa estratégica ministerial mencionada – e do próprio governo federal - está nos canhões, que passaram a mirar a ministra da Agricultura Tereza Cristina, designando-a como “senhora desmatamento”, justamente quem representa o agronegócio, que tem o mister de fomentar e defender o setor que representa a atividades preponderantes à economia do nosso Estado e do Brasil.
O presidente do Banco Central já advertiu que grandes investidores internacionais estão começando a exigir garantias ambientais, e indicando que os bancos já são responsáveis subsidiários dos danos ambientais. Outra barreira ambiental que o brasil irá enfrentar é do parecer de assuntos econômicos e tributários da Câmara dos deputados dos Estado Unidos, que se opôs a expansão de relações comerciais do seu pais com o Brasil em razão das políticas econômicas do atual governo.
É preciso romper com alguns pensamentos extremados e desconexados. Em uma audiência pública, na Assembleia Legislativa de Mato Grosso com a temática preservação das nossas fontes de agua, enquanto um debatedor falava sobre as possibilidade de preservação e o valor da água para a vida, e impactos econômicos, um dos que assistiam murmurou que, “isto só se conseguiria no mundo comunista”, para justificar a contínua exploração insustentável da água.
A globalização da crise sanitária e ambiental irá promover cada vez mais a importância do Meio Ambiente e sua preservação para a manutenção das relações econômicas e sociais. O desenvolvimento sustentável deve ser cada vez mais pauta capitalista em detrimento da busca incessante por medidas de manutenção e expansão das taxas de lucro.
O valor agregado da sustentabilidade, mediante, por exemplo, protocolos de preservação ambiental, são caminhos sem volta para as relações comerciais. São exigências que outrora eram difíceis de serem fiscalizadas. Hoje são difundidas pela comunicação na internet, redes sociais e aplicativos de mensagens instantâneas, expondo empreendedores e empresas à cobranças públicas de compromissos ambientais.
A plausibilidade da globalização das discussões ambientais é diametralmente oposta à política ambiental do Governo Federal, que já encontra caminho tortuoso para melhorar o fomento em investimentos públicos ao agro, como o plano safra, deixando-o praticamente estagnado, com alta de apenas 0,28%. Assim o Estado avoca responsabilidade quanto as dificuldades do setor para os próximos anos. Quando o Estado fechar as contas da atual crise-econômica sanitária, ficará mais difícil aumentar os financiamentos públicos para o setor, pois outros ambientes da economia, também importantes, demandarão a atenção do poder público.
O acesso a crédito pelo agro está intrinsicamente ligado à responsabilidade socioambiental dos empreendimentos em razão da responsabilidade subsidiárias dos mercados internacionais e das organizações cedentes de crédito. Ademais o enfraquecimento dos órgãos de proteção ambiental, e a fomentação do desmonte das normas ambientais contribuem para a judicialização da proteção ambiental, sobrecarregando o Poder Judiciário, onerando os negócios jurídicos e criando uma nova burocratização da discussão ambiental.
Neste cenário, o meio ambiente deve deixar de ser bandeira de “comunista” para ter a mesma importância das commodities que impulsionam o Estado, pela sua importância transindividual para as presentes e futuras gerações, bem como para a valoração do produto comprometido com políticas socioambiental.
O crescimento econômico não é mais antagônico à preservação ambiental, são dois lados da mesma moeda, pesos de uma mesma balança que é a vida, o que um vírus desconhecido está nos fazendo prestar mais a atenção.
*Alberto Scaloppe é advogado no Scaloppe Advogados Associados em Cuiabá
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