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Saúde Quinta-feira, 17 de Julho de 2014, 14:35 - A | A

Quinta-feira, 17 de Julho de 2014, 14h:35 - A | A

Intoxicação por inseticida.

Brasileiro esquece tudo a cada 4 dias, e anotações são sua memória

A cada quatro dias, Otávio Aparecido Costa Sanches, 54, esquece de tudo o que viveu. O morador de Lins, no interior de São Paulo, recorre a centenas de anotações em agendas para não deixar que momentos vividos e pessoas importantes passam em branco. A fa

uol.com

Imagine se você tivesse, de um momento para o outro, todas as suas lembranças apagadas da memória. E, pior, se isso se repetisse a cada quatro dias. Essa é a vida de um morador de Lins, interior de São Paulo, que tem sua memória "apagada" nesse curto espaço de tempo. Otávio Aparecido Costa Sanches, 54, recorre a centenas de anotações em agendas para não se esquecer de momentos vividos e pessoas importantes. Isso por possuir uma lesão no cérebro causada por intoxicação por inseticida.

Foi em uma das agendas, por exemplo, que ele anotou a existência do filho mais novo, que é casado e que não vive mais na mesma cidade que ele. "Eu sei que ele é meu filho porque os outros dizem, mas não me recordo como ele é", lamenta o homem, que não tem na memória nenhum momento da infância e da juventude do filho.  Dessa forma ele também se refere a um dos irmãos e aos pais, de quem simplesmente diz não se lembrar da existência.

Como anotar os fatos que ele julga interessante se tornou uma rotina para Sanches, ler diariamente essas anotações para mantê-las guardadas na memória também faz parte do seu dia a dia. São quatro agendas com páginas repletas de informações.

"Levo minha mulher no trabalho acompanhado do meu filho mais velho que vive aqui com a gente. Quando volto para casa, vou ler minhas anotações, estudar noções de história, geografia, matemática e regras de trânsito", conta. O aposentado estuda e revisa suas anotações por cerca de seis horas todos os dias. O curioso é que o que levamos anos para aprender, Sanches tem facilidade.

O problema de memória começou a ser notado por familiares em 2004 quando, ao voltar do trabalho, Sanches disse não se lembrar de ter passado por algum lugar ou ter realizado certas tarefas. A mulher dele, Sueli da Silva Costa Sanches, 54, conta que o fato determinante para que o marido procurasse um médico veio no dia em que ele se esqueceu de um amigo de infância.

"Nesse dia me assustei, não conseguia acreditar que ele não se lembrava desse amigo, apesar da minha insistência, levei-o até a casa da pessoa, mas mesmo assim ele não se lembrou, entrei em pânico", narra.

Sanches passou por consulta com um médico da cidade de Lins e foi diagnosticado com Alzheimer. O inconformismo da família com o diagnóstico, fez com que o homem fosse levado até o Ceatox (Centro de Assistência Toxicológica) da Unesp (Universidade Estadual Paulista) de Botucatu (SP). Isso porque, além do esquecimento, o aposentado apresentava claros sintomas de intoxicação, como vermelhidão e coceira pelo corpo, perda de apetite, insônia, nervosismo e depressão.

Os resultados dos exames no Ceatox apontaram, além de intoxicação por exposição excessiva a organofosforado, substância encontrada em inseticidas, uma lesão no lóbulo temporal direito do cérebro. Com o diagnóstico, Sanches foi afastado da função que exercia de agente de controle de pragas no Centro de Controle de Vetores da Prefeitura de Lins.

O aposentado conta que ele fazia o manejo e a aplicação de inseticidas, mas que não eram disponibilizados EPIs (equipamentos de proteção individual). "A gente aplicava o mata-mato [proibida para a venda atualmente] sem qualquer proteção com a roupa do corpo. Ganhamos uma botina depois, mas por muito tempo [fazíamos o serviço] com calçado que vinha de casa", conta. Todas essas informações ele traz em suas agendas.

"Desde 2004 até agora, foram 18 médicos e 14 diagnósticos diferentes", lamenta Sanches. A aposentadoria só veio em 2013, com um novo diagnóstico de Alzheimer, doença neurodegenerativa, apontada como a possível causa dos esquecimentos.

Sem um diagnóstico preciso e sem aceitar o Alzheimer, a família vê a situação de Sanches piorar com o passar dos anos. Em 2011, por exemplo, Sanches se esquecia dos momentos vívidos a cada sete dias, agora segundo notou a mulher do aposentado, o período se encurtou, os esquecimentos acontecem atualmente a cada quatro dias.

Sanches vem sendo acompanhado por médicos neurologistas do Hospital das Clínicas (HC) de Botucatu.  Procurados os profissionais envolvidos no caso preferiram não dar entrevista sobre o caso. Em nota a entidade apenas informou que o aposentado possui um prejuízo de memória retrógrada.

"Paciente com episódios de ausência, prejuízo de memória retrógrada (não recorda nada que ocorreu além de 7 dias atrás), apresentando rastreio toxicológico do Ceatox com possível intoxicação por organofosforados (trabalhou com controle de pragas, usando inseticida). Tem relato de lembrar-se ocasionalmente de pai e mãe."

Luta na Justiça

Em busca de auxílio para o tratamento, a família do aposentado ingressou com um processo administrativo na Prefeitura de Lins, pedindo que o município custeasse o tratamento do ex-servidor. Os pedidos foram negados e, assim, a disputa foi parar na Justiça.

O advogado de Sanches pediu inicialmente uma revisão no valor da aposentadoria, que era por invalidez. Para o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), o segurado sofre de Alzheimer. Inicialmente o advogado solicitou a diferença salarial que está prevista no estatuto dos funcionários públicos, que diz que em caso de uma doença grave o funcionário tem direito a equiparação. Agora, o pedido foi refeito, e o advogado pediu o auxílio com vencimentos no valor integral.

Procurada pela reportagem do UOL, a Prefeitura de Lins informou que os pedidos de auxílio com o tratamento foram negados porque a legislação municipal vigente não cita em seu histórico o mal de Alzheimer. Assim, foi solicitado que Sanches passasse por perícia médica para constatar que a doença foi decorrência do trabalho exercido, mas ele não compareceu nas duas datas marcadas.

A família de Sanches se defende. De acordo com a família, a prefeitura não tem competência para esse tipo de convocação, apenas o INSS e a Justiça durante o processo podem solicitar a realização de perícias.

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