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Artigos Terça-feira, 27 de Outubro de 2020, 11:12 - A | A

Terça-feira, 27 de Outubro de 2020, 11h:12 - A | A

Agno Vasconcelos*

A reforma necessária – administrativa ou tributária, qual deve ser a prioridade

Esta semana uma emissora de rádio de Cuiabá colocou uma enquete no ar: “qual reforma deve vir primeiro: a administrativa ou tributária”. O resultado de tal enquete não é o cerne deste artigo, mas principalmente se os cidadãos médios têm a noção do impacto de cada reforma em suas vidas.

A reforma administrativa proposta pelo Governo Federal intitulada PEC nº 32/2020 se trata de um projeto de emenda à Constituição que altera os artigos 37 e seguintes bem como de diversos dispositivos que tratam do funcionamento da Administração Pública. Na mensagem que acompanha a PEC constam vários estereótipos que caracterizam a linha liberal defendida pelo ministro Paulo Guedes: “Apesar de contar com uma força de trabalho profissional e altamente qualificada, a percepção do cidadão, corroborada por indicadores diversos, é a de que o Estado custa muito, mas entrega pouco.”(Grifo nosso).

Percebe-se no trecho que apesar de estar recheado de argumentos comuns não apresenta nenhum dado que respalde a argumentação. A esse respeito o Ministério da Economia mantém em sigilo os dados que referendaram o projeto. Isso deu causa a um Mandado de Segurança interposto no STF pela Frente Parlamentar em Defesa do Serviço Público que requereu as informações que deram sustentação à reforma sob pena de suspensão da tramitação da respectiva proposta. Resta, pois, demonstrado que a afirmação de que a PEC está respaldada por indicadores “diversos” não está comprovada até este momento.

Em outro trecho da mensagem está consignado o seguinte: “O país enfrenta, nesse sentido, o desafio de evitar um duplo colapso: na prestação de serviços para a população e no orçamento público. A estrutura complexa e pouco flexível da gestão de pessoas no serviço público brasileiro torna extremamente difícil a sua adaptação e a implantação de soluções rápidas, tão necessárias no mundo atual, caracterizado por um processo de constante e acelerada transformação”. (Grifo nosso).

Embora assinalado no texto não se vê a preocupação dos dirigentes atuais na boa prestação de serviços públicos para a população. Importante frisar que estamos em plena pandemia do Covid-19 e o governo central tem se atrapalhado constantemente em relação à orientação e, principalmente, quanto à estratégia para buscar soluções tanto em relação ao atendimento em saúde quanto à solução em assistência social aos mais necessitados. Por conseguinte, estamos de novo em um impasse criado pela demagogia indo de encontro à orientação científica, em relação à vacina chinesa. Insta mencionar que vacina não tem passaporte, o que importa para a maioria da população é se ela é eficaz ou não, previne ou não previne a doença. Desses desencontros sobressaem a presença do Congresso Nacional e dos entes federativos para solucionar os problemas não enfrentados pelo governo federal.

E a reforma tributária? Ainda capengando. O atual governo só apresentou até este momento uma proposta que prevê a criação da Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), unificando em um único tributo sobre bens e serviços o PIS e o Cofins, que seriam extintos, com alíquota estabelecida de 12%.[1] Tímida a proposta. Salienta-se que já se encontram em discussão no Congresso duas outras propostas mais robustas de reforma tributária: as PEC’s 45 e 110. A PEC-45, criada pelo Centro de Cidadania Fiscal e apresentada na Câmara dos Deputados, tem como base a fusão dos impostos ICMS, PIS e Confins, de competência federal, ICMS, ligado aos estados, e o ISS, cobrado pelos municípios. A junção seria realizada em um horizonte de dez anos por meio de um Imposto de Valor Agregado (IVA). Já a PEC 110 tem como base o texto do projeto PEC-293/2004 relatada pelo ex-deputado federal Luiz Carlos Hauly e aprovada em comissão especial da Câmara em 2018. Pela proposta seriam extintos oito tributos federais (IPI, IOF, CSLL, PIS, Pasep, Cofins, Salário-Educação e Cide-Combustíveis), o ICMS (estadual) e o ISS (municipal). Todos esses dariam lugar a um imposto sobre o valor agregado de competência estadual, chamado de Imposto sobre Operações com Bens e Serviços (IBS), e um imposto sobre bens e serviços específicos (Imposto Seletivo), de competência federal. A discussão em relação ao ICMS seria fundamental para rediscutir a Lei Kandir. A Lei Complementar nº 87/1996 conhecida como Lei Kandir regulamentou a aplicação do Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de Mercadorias e Prestações de Serviços de Transporte Interestadual, Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Apresentada pelo então ministro do Planejamento Antonio Kandir, teve como premissa a isenção do pagamento de ICMS sobre as exportações de produtos primários e semielaborados ou serviços, ela também previa a compensação pelas perdas decorrentes da isenção prevista em lei. Dessa maneira, essa lei sempre foi motivo de debates e reclamações dos Estados exigindo tal compensação, em razão de que todo ano deve ser estabelecido o valor a ser compensado e, principalmente, em virtude dos atrasos nos repasses aos entes da federação. [2]

Voltando à reforma tributária, as discussões devem ser mais demoradas, em parte porque o Governo Federal não apresenta a mesma agressividade demonstrada em relação à reforma administrativa, que se trata de uma resposta aos anseios liberais e atende à elite empresarial e financeira que alega que a sociedade paga um alto custo para manter as atividades estatais. Ressalta-se que o país estabeleceu no texto constitucional os impostos que cada ente deve instituir para suprir suas necessidades financeiras. Nesse contexto, no capítulo do Sistema Tributário Nacional, disposto nos artigos 145 e seguintes, estão previstas as competências tributárias de cada ente da federação. Nesse sentido o artigo 153 estabelece que compete à União a instituição de imposto sobre grandes fortunas, nos termos de lei complementar. A expectativa é que o imposto sobre grandes fortunas poderia arrecadar entre 40 e 100 bilhões por ano. Uma das propostas apresentadas neste ano em razão da pandemia é o projeto apresentado pela Senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) que institui o empréstimo compulsório sobre grandes fortunas no percentual de 0,5% a 1,00% para financiar as ações de proteção social para combater o impacto da pandemia do Covid-19 na economia[3]. Outra proposta foi apresentada pelo economista Pedro Humberto Carvalho, especialista em tributação e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), ele explica que um modelo possível para o Brasil seria instituir um imposto para o contribuinte que tem fortuna declarada superior a R$ 10 milhões. Dessa maneira a tributação seria feita com alíquotas que variem de 0,5% a 3%, o que poderia gerar uma arrecadação de R$ 40 bilhões provenientes de 70 mil contribuintes. O montante equivaleria a 0,5% do Produto Interno Brasileiro (PIB). Segundo Carvalho, esse tipo de imposto mitigaria o efeito regressivo do sistema tributário do país. Seria, assim, uma alternativa para se chegar à tributação dos brasileiros que realmente não pagam imposto de renda, porque ele cai abruptamente quando chega no 0,5% mais rico da população. Essa classe de contribuintes tem boa parte da sua renda isenta de imposto por causa da isenção sobre lucros e dividendos, afirma o economista. Segundo estudo da UNAFISCO – Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal) revela que o governo pode arrecadar até R$ 59,79 bilhões ao tributar lucros e dividendos[4]. Contudo, as propostas apresentadas no Congresso Nacional nesse sentido não avançam. Não é necessário fazer muito esforço para saber o porquê.

Por fim, se por um lado o Estado está gastando mal seus recursos, o que não é regra geral, pois temos entes da federação que tem feito um esforço fiscal muito grande sem prejudicar os serviços básicos à população; de outro lado temos uma perversa política tributária onde a maioria da população não conseguem escapar do fisco, enquanto os mais ricos e que possuem patrimônios milionários são isentos da contribuição para a manutenção dos serviços públicos essenciais e para a superação dos efeitos da pandemia. Cada cidadão deve fazer sua escolha levando em conta que ambas as reformas são necessárias, mas a tributária é primordial para se se fazer justiça fiscal. Simples assim.

*Agno Vasconcelos, 46, bacharel em economia e advogado, especialista em gestão pública, servidor público estadual da carreira de gestão governamental, é diretor-presidente da Associação dos Gestores Governamentais do Estado de Mato Grosso (AGGEMT).

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