por Gaudêncio Torquato*
A área da justiça social vive um ciclo de avanços. A razão tem sido a demonstração da sociedade organizada em querer participar do processo decisório. E esta vontade se expressa nos novos polos de poder, representados por sindicatos, federações, associações, setores, grupos e movimentos. Esse microuniverso de forças emite sinais de que deseja ver suas demandas atendidas. E ter maior acesso à justiça. Trata-se de uma vertente da democracia direta.
De pronto, emerge uma questão: por que isso ocorre, se temos um sistema representativo que funciona bem, Senado representando Estados, Câmara Federal e Assembleias estaduais representando o povo? Resposta: a comunidade nacional abandona, aos poucos, sua letargia e passa a criar tubas de ressonância que fazem eco na esfera política.
Um alerta. Os poderes constitucionais, sob pena de serem execrados pela opinião pública, precisam incorporar o espírito do tempo, o animus animandi dos grupamentos sociais. Nem todas as demandas poderão ser atendidas, mas novos passos precisam ser dados pela representação política, na linha do que sugere o profeta Zaratustra, de Friedrich Nietzsche: “novos caminhos sigo, uma nova fala me empolga. Não quer mais o meu espírito caminhar com solas gastas”.
Dito isto, faço a primeira constatação. O maior avanço institucional dos últimos tempos, no Brasil, se dá na esfera do poder judiciário e, especificamente, na seara da justiça do trabalho. Constato. O Tribunal Superior do Trabalho inseriu em sua pauta a defesa dos direitos humanos, em sua plenitude, inserindo na mesa de debates, as questões inerentes à discriminação de gêneros, cores/raças (há intensa polêmica sobre o conceito de raças), a comunidade Lgbtquia+, plataformas digitais e as novas formas de trabalho, enfim, o discurso da contemporaneidade.
A roda civilizatória, como se sabe, só gira quando um dirigente das estruturas do poder a faz movimentar. Tem sido assim na história da nossa Justiça do Trabalho.
Passamos vexames no passado colonial e imperial, quando o índio e o negro foram submetidos ao trabalho escravo. Até que, no final do século XVII, o marquês de Pombal, aboliu a escravidão indígena e, em 13 de maio de 1888 -, tardiamente, é oportuno frisar -, a princesa Isabel aboliu a escravidão negra.
De maneira lenta e gradual, os mecanismos da justiça apareceram, como a Lei de Locação de Serviços, em 1879; o Conselho Nacional do Trabalho, em 1923; também nesse ano, a Lei Eloy Chaves, que deu início à previdência social e estabilidade aos ferroviários, a partir de 10 anos de serviço; a Lei de Férias, sancionada em 1925 pelo presidente Artur Bernardes; o Código de Menores, sancionado pelo presidente Washington Luís, em 1926; a sindicalização em massa e a criação de um amplo conjunto normativo na ditadura Vargas; a instalação da Justiça do Trabalho, em 1941 e a CLT, em 1943.
Ajustes foram feitos nas Constituições – 1934/1937- até chegarmos à Constituição de 1946, que integrou a Justiça do Trabalho ao Poder Judiciário, tirando-a das asas do Executivo. A Constituição de 1988 consolidou a estrutura do TST e, nos anos mais recentes, aperfeiçoamentos foram realizados, com ampliação da competência da Justiça do Trabalho, mudanças na CLT, requisitos para provimento de cargos, entre outros dispositivos.
Hoje, vemos o Tribunal Superior de Trabalho elegendo como foco a pluralidade, a diversidade, a inclusão de grupos historicamente afastados das ferramentas da Justiça. E essa boa nova ocorre porque a alta corte da Justiça do Trabalho concordou em adotar o ideário de um juiz plenamente identificado com o painel social da atualidade: Emmanoel Pereira.
Trata-se de um potiguar despojado de vaidades, de linguagem direta, longa vivência nas searas da justiça, desde seu histórico de mais de duas décadas na Advocacia. Um juiz magnânimo, cuja conversa exprime valores, como coragem, dever, compromisso, articulação e, sobretudo, sapiência, que mais do que conhecimento, é a palavra balizada pelo bom senso e cuidadoso exercício de hermenêutica jurídica. Lembro a lição de Francis Bacon (Ensaios, 1597): o juiz deve preparar o caminho para uma justa sentença, como Deus costuma abrir seu caminho elevando os vales e abaixando montanhas”.
Este é um lema que parece inspirar o TST na aplicação da justiça social.
*Gaudêncio Torquato é jornalista, escritor, professor titular da USP e consultor político Twitter@gaudtorquato
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