Ricardo Teixeira é um craque. Ele foi presidente da Confederação Brasileira de Futebol, a CBF, por 23 anos, entre 1989 e 2012. Nos últimos quatro anos como cartola, acumulou ainda o cargo de presidente do Comitê Organizador Local da Copa. Nesse mesmo período, Teixeira movimentou em suas contas R$ 464,56 milhões, como ÉPOCA revelou no dia 1º. Quase meio bilhão de reais. É uma bolada digna de um grande time de futebol – o Flamengo, por exemplo, faturou R$ 347 milhões em 2014. A fortuna movimentada por Ricardo Teixeira foi rastreada pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf. A descoberta do Coaf foi incluída num inquérito da Polícia Federal do Rio de Janeiro. Em janeiro, nesse inquérito, a PF indiciou Teixeira por lavagem de dinheiro, evasão de divisas, falsidade ideológica e falsificação de documento público, conforme revelou a reportagem do site de ÉPOCA. Os investigadores convenceram-se de que ele cometera esses crimes numa operação de compra de um apartamento. Teixeira pagou R$ 720 mil pelo imóvel – mas o preço real era de R$ 2 milhões.
Agora, um documento obtido por ÉPOCA mostra uma nova linha de investigação. Trata-se de uma carta que aponta Teixeira como sócio oculto de duas empresas, em parceria com um personagem notório do mundo da bola: Sandro Rosell, ex-presidente do Barcelona. É a primeira vez que aparecem evidências de um laço societário entre Teixeira e Rosell. Trata-se de um evidente conflito de interesses. Teixeira chegou a presidir a CBF enquanto Rosell era o dirigente da Nike que cuidava do contrato com a entidade. O empresário Cláudio Honigman, parceiro de Teixeira e Rosell, completa o trio. Rosell e Honigman também foram indiciados pela Polícia Federal em janeiro, no caso do apartamento e outras operações.
Os três, segundo a PF, atuavam em conjunto. A carta, apreendida em 2011 pela Polícia Civil do Distrito Federal, foi encontrada no computador de Vanessa Precht, sócia de Rosell. O documento integrou uma investigação no Distrito Federal por causa de um jogo da Seleção Brasileira em Brasília. Em 2008, o governo local contratou uma empresa que tinha Rosell como sócio para promover o evento. A PF do Rio pediu aos colegas que compartilhassem as informações. O material foi parar no inquérito que indiciou Teixeira, Rosell e Honigman no começo do ano.
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A carta não tem data ou assinatura. O destinatário é Sandro Rosell. Os investigadores sabem que o remetente é um especialista do mercado financeiro. Ele participou das negociações que menciona e diz que tomou um tombo da turma de Teixeira, Rosell e Honigman. O documento detalha a compra de uma corretora chamada Alpes, em 2008, por algo entre R$ 22 milhões e R$ 25 milhões. Foi uma operação para esquentar o dinheiro da turma, segundo a PF. Na compra da Alpes, segundo o ex-sócio da turma, Teixeira, Rosell e outros dois parceiros ficariam responsáveis por 32% da corretora. Tudo às escondidas, de modo que ninguém soubesse da parceria entre Teixeira, que presidia a CBF, e Rosell, que foi o dirigente da Nike responsável pelo contrato da marca com a CBF. De acordo com o documento, Cláudio Honigman, que atualmente está foragido, brigou e rompeu com o resto do grupo. O autor da carta relata então que Sandro Rosell foi pessoalmente à casa de Teixeira informar sobre a intenção de tirar Honigman do negócio. O denunciante narra que Teixeira recebeu a parte que lhe cabia. Conta que teve de pagar a entrada de um imóvel que o grupo comprou em um shopping do Leblon e o descreve: o valor (R$ 646 mil), o tamanho do escritório (506 metros quadrados), a quantidade de salas (três) e o andar (4º).
A turma não pagou ao investidor o dinheiro que lhe devia. Por isso, o autor ameaçou entregar o verdadeiro dono do negócio: Ricardo Teixeira. Escreve o denunciante, atropelando o bom português e a pontuação: “Me liga o Cláudio novamente me pedindo em nome do Sandro Rosell, para eu assinar pois se não o Inácio iria botar na Justiça. E envolveria o nome do Ricardo Teixeira, através da mulher dele, dona da empresa que ele tinha colocado para ser sócio no percentual do Ricardo, na empresa dona das salas justamente para não aparecer o nome do Ricardo Teixeira”. Uma reportagem da Folha de S.Paulo, de 2013, mostra que uma das empresas de Rosell pagou R$ 2,8 milhões a uma empresa da então mulher de Ricardo Teixeira, Ana Carolina Rodrigues, justamente na venda de salas comerciais no Shopping Leblon, em 2011. Em outras palavras, as informações narradas na carta são corroboradas por documentos comerciais e bancários.
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Por duas vezes, o autor da carta, indireta e confusamente, cita outra possível sociedade oculta de Ricardo Teixeira: na Brasil 100% Marketing. No papel, é meramente uma empresa de marketing esportivo, cujos donos eram Cláudio Honigman e Sandro Rosell. Ela promovia amistosos da Seleção Brasileira. “O Ricardo Teixeira estaria em Londres para uma reunião sobre a corretora, pois neste momento Cláudio e Sandro falaram que tinham convidado Ricardo para reunião de sócios neste novo negócio, fora a Brasil 100, onde eles já eram sócios no futebol através dos dois.” Em outro trecho, o autor volta a mencionar a Brasil 100% Marketing –desta vez, revelando a razão da briga de Honigman com o resto da turma. “Conversei durante 15 minutos com Sandro e ele veio me perguntar o que tinha havido, pois ele agora estava achando a história do Cláudio muito estranha já que ele tinha descoberto que o Cláudio tinha dado um desfalque na Brasil 100, empresa dele, do Ricardo Teixeira e do Cláudio Honigman.”
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Tanto a Alpes quanto a Brasil 100% Marketing são citadas no inquérito da Polícia Federal finalizado no início deste ano. Agora, cabe ao Ministério Público Federal decidir se oferece denúncia contra os envolvidos. O advogado de Sandro Rosell, Antenor Madruga, disse que “toda atuação de Sandro Rosell no Brasil foi estritamente legal e ele explicará qualquer dúvida nas instâncias apropriadas, como tem feito em todas as oportunidades”. Madruga ressaltou que Rosell foi absolvido na ação de improbidade promovida pelo Ministério Público do Distrito Federal pelo jogo da Seleção. Pessoas próximas a Rosell disseram a ÉPOCA que a negociação na Alpes não prosperou. Ricardo Teixeira e Cláudio Honigman não foram localizados. A Alpes Corretora disse que não tem relação com o caso e que Honigman é ex-funcionário. À PF, a corretora afirmou que nunca fez negócios com Teixeira.
Como é a primeira vez que aparecem evidências de um laço societário entre Teixeira e Rosell, isso pode agravar o peso das acusações contra os dois. Indica que eles agiam em sintonia. As informações da carta e do inquérito da PF mostram que Teixeira era não só beneficiário, como operador do esquema. Em miúdos, mostram Teixeira cruzando, cabeceando, defendendo, apitando. E comemorando gols que rebaixaram o futebol brasileiro.
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