O repórter Marcos Uchoa estava em Paris, pegou um voo para Barcelona e conversou com Daniel Alves na noite deste sábado (4), sobre a polêmica da banana.
Marcos Uchoa: Daniel, acho que você não podia imaginar que aquele teu gesto pudesse ter a repercussão que teve, né? Hoje, no jornal, a Serena Willians, grande tenista americana, comentando que se necessita muita coragem para fazer o que o Daniel Alves fez. Você imaginava que a repercussão fosse mundial?
Daniel Alves: Quando eu cobrei, caiu aqui na minha frente e o meu gesto foi pegar e comer. Mas sem pensar no que aquele gesto ia causar. Tentando dar uma resposta inteligente a um ataque e acabou tendo essa repercussão toda.
A campanha contra o racismo começou logo depois do jogo, quando Neymar publicou na internet uma foto com uma banana. E embaixo dela a hashtag: #somostodosmacacos.
Uma hashtag é mais do que um rótulo de uma foto. É um comando. É um movimento que quer começar.
#somostodosmacacos se espalhou. No boca a boca. Como um vírus. Viralizou. Em poucas horas, milhares de pessoas, tinham sido contaminadas.
“Todo mundo entrou nesta onda porque gente, somos todos macacos, por favor. E não me venha com ‘chorumelas’”, diz a atriz Luana Piovani.
“Sobre o racismo, a premissa de que somos iguais. E somos mesmo, independente da cor da pele, é uma máxima que não dá para se discutir”, afirma o apresentador Luciano Huck.
“Somostodosmacacos” tinha mesmo tudo para ser um fenômeno, segundo Jonah Berger, que escreveu um livro sobre como as coisas se espalham pela internet. “As pessoas compartilham quando a ideia faz bem para a imagem delas. A coisa legal da campanha #somostodosmacacos é que é algo em que todo mundo acredita”, analisa Jonah Berger.
Na televisão, a causa da banana ganhou espaço. E só depois se descobriu que havia algo por trás.
Antes mesmo de Daniel Alves comer a banana, uma agência de propaganda já tinha criado a frase "somostodosmacacos" a pedido de Neymar.
“Quando aconteceu com ele no campo do Espanhol a gente conversou em fazer uma campanha para ir contra o racismo. Mas a gente não esperava que essa situação fosse acontecer outra vez. Que fossem no estádio com uma banana para jogar em alguém”, conta Daniel Alves.
“Todo mundo comprou a briga. E não deixa de ser uma campanha positiva porque a gente não aguenta mais essa história de preconceito. Então poderia ser uma coisa só muito legal”, diz a atriz Luana Piovanni.
“Se eles tiveram ou não ajuda para esta reação, a mim não incomoda nem um pouco. A gente vê o mundo inteiro discutindo isso. Jogadores do mundo todo. Pessoas do mundo inteiro falando sobre isso”, afirma Fátima Bernardes.
“Eu acho que hoje o acesso à internet está muito, muito grande. Qualquer coisa que se publique na internet, gera uma especulação, gera um debate. Porque não utilizar para fazer algo diferente e criar uma conscientização de que somos todos humanos, somos todos iguais e que vivemos no século XIX e isso não teria mais que existir”, afirma o jogador Daniel Alves.
Não é a primeira vez que uma ação de internet aparentemente espontânea foi planejada. E nem vai ser última. No ano passado, muita gente se engajou no #vemseanpenn.
A campanha era para promover o encontro do ator do filme Colegas, Ariel Gondemberg, com o ídolo, o americano Sean Penn.
Repórter: Era um sonho antigo conhecer ele?
Ariel Gondemberg, ator: Era. Era sim porque além de ser ator sou muito fã dele, entendeu. Eu gosto muito dos trabalhos dele.
Mas agora o diretor Marcelo Galvão admite que a campanha servia também para promover o filme.
“Essa ideia ela veio de uma ideia publicitária e a gente nunca deixou isso aparecer porque o mais importante era o sonho mesmo, porque o sonho era verdadeiro”, diz o diretor Marcelo Galvão.
É difícil não ser simpático à causa de Ariel ou discordar do discurso antirracismo da campanha “somos todos macacos”, mas a regra é sempre ficar atento às origens de um hashtag.
“Desconfie das coisas que você vê na internet porque muito o que está ali é planejado, é uma mensagem que tem por interesse ser persuasiva com relação ao cidadão, ao eleitor”, afirma Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade.
Enquanto isso, a campanha “somostodosmacacos” segue gerando debates acalorados.
“Hoje, no mundo, acontece uma catástrofe, todo mundo se sensibiliza e tal. Mas depois, acabou. Então, eu não gostaria que isso acontecesse. Porque é algo sério”, diz Daniel Alves
Agora, até os amigos e parentes do rapaz que jogou a banana no campo protestam na Espanha. O caso sacudiu a pequena e pacata cidade de Villareal.
"Foi uma coisa errada, mas não houve intenção", diz um rapaz.
"Para nós, como estrangeiros, ficou parecendo que os espanhóis não nos querem. Foi um gesto feio", diz um estrangeiro.
"Para mim, foi um ato de racismo", acredita uma mulher.
Mas quem é esse rapaz? David Campayo, de 26 anos, trabalha em uma empresa de porcelana da cidade.
No Centro de Treinamento do Villareal, o rapaz que jogou a banana no campo trabalhava de forma voluntária. Ele ajudava a treinar jovens das categorias de base. O clube quer desvincular sua imagem do gesto de racismo e, por isso, uma das medidas que tomou foi dispensar os serviços do rapaz.
David também perdeu a carteira de sócio e foi proibido de entrar no estádio El Madrigal, onde o Villareal joga.
Um dia depois do jogo, David foi detido e levado para uma delegacia. Prestou depoimento e foi liberado. Ele pode pegar até três anos de cadeia por injúria racial.
“Tem que haver uma punição. Mas eu não acredito que tenha que pagar o mal com o mal. A gente tem que educar. Você não pode combater assim. Banindo do futebol, tirando o emprego. Porque de repente é um pai de família e tem que sustentar a família de alguma forma. São os fortes que perdoam”, afirma Daniel Alves.
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