O Ministério Público do Trabalho em Rondonópolis obteve liminar em ação civil pública movida em face da unidade da Marfrig Global Foods S.A. de Paranatinga (a 378 km de Cuiabá). Com a decisão, o frigorífico está proibido de praticar qualquer ato antissindical ou anticoletivo, como a imposição de penalidades ou a dispensa, com ou sem justa causa, de trabalhadores que participarem de movimento grevista ou de atos de reivindicação.
O MPT iniciou sua atuação no caso após receber notícia da dispensa abusiva de 12 empregados que participaram de uma greve realizada na unidade em agosto deste ano para reivindicar o pagamento do valor máximo do prêmio produção. Para o MPT, além de ato antissindical, que desrespeita normas internacionais e constitucionais, a conduta do frigorífico pode ser caracterizada como um ato discriminatório. Isso porque todos os mais de 600 empregados da planta paralisaram suas atividades, mas somente esses 12 trabalhadores foram demitidos.
“O propósito da empresa, portanto, não foi punir trabalhadores por ato culposo, mas atentar contra a própria organização coletiva dos trabalhadores, dispensando alguns por justa causa para ‘dar o exemplo’, e, por conseguinte, enfraquecer e intimidar a coletividade de empregados. Como consequência da dispensa de alguns empregados, a empresa transmitiu mensagem a toda coletividade de trabalhadores, no sentido de que não aceita atos de reivindicação e que a consequência será a dispensa. Com isso, obteve a almejada intimidação e enfraquecimento da coletividade de trabalhadores”, explica o procurador do MPT Bruno Choairy.
Na decisão, a juíza da Vara do Trabalho de Primavera do Leste, Tatiana de Oliveira Pitombo, observou que o Supremo Tribunal Federal (STF) já pacificou o tema: a simples adesão à greve não constitui falta grave capaz de fundamentar demissão por justa causa. “Ressalte-se que tal direito é garantido constitucionalmente, ainda que sem participação sindical, pois a adesão de uma coletividade de empregados legitima o movimento paredista. Sendo assim, a dispensa motivada pelo simples exercício do direito de greve constitui grave violação da liberdade sindical”, asseverou.
Segundo a magistrada, a concessão da liminar ficou justificada “uma vez que a espera pela prolação da sentença neste feito e de seu trânsito em julgado acarretaria na possibilidade de novas despedidas pelo mesmo motivo, ou, ainda, a insegurança do trabalhador em exercer seu direito constitucionalmente garantido durante este lapso temporal”.
Questionada pelo MPT, a empresa não apontou os motivos que a levaram a dispensar apenas os 12 trabalhadores num universo de 600. Além disso, apesar de ter considerado a greve ilegal, o frigorífico sequer pleiteou, na Justiça do Trabalho, uma declaração de abusividade do movimento paredista.
O procurador Bruno Choairy pontua que, “ao dispensar aleatoriamente parte dos trabalhadores que, coletivamente, suspenderam a atividade, a empresa atinge simbolicamente o próprio senso de união e de ser coletivo dos trabalhadores. Segrega-se a coletividade para os fragilizar e enfraquecer a solidariedade entre os próprios operários. É a velha prática autoritária de dividir para conquistar".
O MPT também criticou na ação o fato da Marfrig ter agido de forma autoritária ao não dialogar com os trabalhadores para tentar solucionar o problema democraticamente, optando pelo “caminho unilateral da dispensa por justa causa de trabalhadores, como forma de impor seu poder econômico em prejuízo do direito de manifestação”.
Proteção
A Organização Internacional do Trabalho (OIT) adotou diversas Convenções que protegem a atuação coletiva dos trabalhadores. A Constituição Federal, seguindo o mesmo norte, além de reafirmar a liberdade sindical como forma de expressão e defesa coletiva dos interesses do trabalho, garante o direito de greve, com a ressalva de que cabe aos próprios trabalhadores a decisão sobre a oportunidade de exercer esse direito ou os interesses a serem defendidos.
O procurador Bruno Choairy citou na ação as interpretações dadas pelo Superior Tribunal Federal, Tribunal Superior do Trabalho e Tribunal Regional do Trabalho de Mato Grosso sobre a questão, e demonstrou que seguem o mesmo direcionamento: a greve é um direito fundamental que deve ser respeitado pelo empregador; a greve não configura delito e, portanto, não pode autorizar o empregador a praticar atos punitivos; o ato de reivindicação dos trabalhadores, ainda que informal e sem a participação do sindicato, não pode ser encarado como abusivo; a mera ilegalidade da greve não permite a dispensa por justa causa dos empregados que dela participam; a pretensão de enquadrar o movimento paredista como um ato faltoso revela conduta patronal antissindical.
Sobre os prejuízos causados por uma conduta antissindical, Choairy ainda observou que “Ou se permite a ação dos trabalhadores, devidamente organizados, em sindicato ou não, ou então deve ser sepultada a liberdade sindical da ordem jurídica, retornando-se assim ao século XIX, período em que a associação dos trabalhadores era proibida. (...) É esse o preço de se viver em um regime de liberdade de mobilização coletiva dos trabalhadores”.
Multas
Na liminar, a juíza Tatiana de Oliveira Pitombo estabeleceu multa de R$ 5 mil, por trabalhador atingido, caso sejam constatadas novas irregularidades.
Como a empresa deve dar ciência da decisão aos seus empregados, mediante a afixação em local próprio, a magistrada fixou multa diária de R$ 1 mil, até o limite de R$ 50 mil, para o não cumprimento dessa obrigação.
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