por Rojane Marta/VG Notícias
A Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso obteve liminar favorável para suspender o Inquérito Civil aberto pelo Ministério Público Federal em Sinop com o objetivo de tabelar a cobrança de honorários advocatícios.
Com a decisão do Juiz Federal Murilo Mendes, o Ministério Público Federal fica impedido de intervir na relação entre cliente e advogados no que se refere ao valor acordado à titulo de honorários até a apreciação do mérito.
O objetivo do MPF era limitar o valor de 30% quando somados os valores contratuais e os sucumbenciais (valores que quem perde a disputa judicial tem que pagar – ex.: custas processuais) nas demandas previdenciárias, sejam elas administrativas ou judiciais.
Confira a decisão na íntegra:
JUSTIÇA FEDERAL DE MATO GROSSO
SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SINOP
JUÍZO DA 2a VARA E JEF ADJUNTO
PROCESSO N. : 1949-95.2013.4.01.3603
CLASSE: 2100 - MANDADO DE SEGURANÇA INDIVIDUAL
IMPETRANTE: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SECCIONAL MATO GROSSO
IMPETRADO: PROCURADOR DA REPÚBLICA EM SINOP/MT
DECISÃO
A Ordem dos Advogados do Brasil impetra Mandado de Segurança contra ato do Procurador da República com atuação neste Município. Diz a inicial, em síntese, que: 1) o MP fez instaurar inquérito civil para apurar alegadas cobranças indevidas de honorários advocatícios em ações previdenciárias; 2) não explica o órgão ministerial, no entanto, que consistiriam os direitos coletivos que pretende defender com a instauração do procedimento; 3) nos contratos quota litis, não há ilegalidade no estabelecimento de percentual superior a trinta por cento. Pede liminar para que ordem judicial determine o trancamento do inquérito civil em curso.
É o relatório.
É impertinente, aqui, a alegação de ilegitimidade ativa do Ministério Público. Legitimidade é conceito de natureza processual. É no processo - e somente nele - que terá lugar eventual discussão acerca de sua adequação. O que se cuida neste mandado de segurança é saber se a instauração do inquérito civil, tal como feita e nos limites propostos, está dentro das atribuições constitucionais do Ministério Público.
O Ministério Público Federal, depois de instaurado procedimento avulso para apuração de excessos na cobrança de honorários advocatícios em matéria previdenciária, decorrido o prazo legal, o transformou em inquérito civil público. E, após as tramitações de praxe, expediu comunicado recomendando aos advogados que, nas demandas previdenciárias, fosse respeitado o limite máximo de 30%, "quando somados os valores contratuais e de sucumbência". Isso para fazer valer o quanto decidido pelo TED de São Paulo, cuja orientação teria sido seguida pelo TED do Mato Grosso.
Com todo o respeito aos bons propósitos que inspiram a ação ministerial, a recomendação feita não passa de simples recomendação, sem eficácia alguma do ponto de vista jurídico. A Constituição Federal dá o mesmo estatuto institucional ao Ministério Público e à Advocacia. Isso não é de graça. Não é por outra razão, aliás que o Estatuto da Ordem dispõe, em seu artigo 6°, que "não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do ministério público". O que a lei fez foi apenas concretizar a vontade constitucional, evitando, desse modo, ingerência de um órgão essencial à justiça em outro. A recomendação não tem eficácia porque destituída de força coercitiva. Se o profissional não "observar" a recomendação, o que resta ao Ministério Público? Assim como seria despropositada uma recomendação da Ordem ao MP, parece-me que essa recomendação dirigida à entidade representativa da advocacia não faz sentido algum.
Diz o Ministério Público que a OAB do Mato Grosso tem entendimento, firmado pelo seu Conselho de Ética, de que a cobrança deve ser limitada a 30%. Pois, se assim é, ao tomar conhecimento dos contratos que excediam esse limite, o caso era de enviar à Ordem as reclamações recebidas para que a classe decidisse o que fazer, sem prejuízo da instauração de inquérito criminal caso entendesse o parquet que ali havia indícios de práticas delituosas. E assim, desse modo simples, tudo se resolveria dentro dos limites do sistema institucional, sem intervenção ou ingerência não permitida pelo texto constitucional. A OAB apuraria infração administrativa acaso ocorrida. E o MP, de sua parte, apuraria o que enxergasse de possível ilícito criminal.
Mas o assunto não se esgota aí. O Ministério Público, com a sua atuação, pretende regular, de modo abstraio, a matéria relacionada com honorários advocatícios. De minha parte, não tenho a menor dúvida de que isso é tarefa do legislador. Aplica-se ao caso, portanto, integralmente, o princípio da legalidade. Honorários são, indiscutivelmente, matéria de lei, tanto os judiciais quanto os sucumbenciais. Tome-se o seguinte exemplo: um advogado patrocina uma causa que tramita há seis anos e cujo valor atrasado gira, por suposição, em torno de sessenta mil reais. Pode receber, segundo o Ministério Público, vinte mil, pouco importando se foi ao fórum ou deixou de ir. Outro defende um cliente que tem um ano de diferenças para receber, mas atuou de modo diligente, empenhou-se na coleta das provas. As diferenças, também por suposição, ficariam em dez mil. Teria o último advogado, de acordo com a lógica ministerial, o direito de receber três e poucos reais. Pode parecer estranho falar em reserva legislativa se a própria OAB, por uns dos seus Conselhos, já fixou o percentual. Nada há de incongruente. O que há aí é uma questão interna, regulada pela classe no exercício de sua autonomia. Não seria incomum nem ilegítimo que um filiado qualquer, não concordando com o limite estabelecido, fosse a juízo em defesa de prerrogativas que entendesse desrespeitadas pelos Conselhos.
Portanto, além de pretender usurpar função legislativa o critério apontado não se sustenta sequer do ponto de vista lógico. Para que o estatuto constitucional de cada qual seja respeitado, o melhor é que, detectando o juiz, em cada caso concreto, situação de abuso, comunicar à Ordem e ao Ministério Público, para que cada qual exerça a sua função institucional, um apurando eventual infração ética, e outro eventual infração criminal.
É da jurisprudência, de resto, o entendimento segundo o qual "tendo conhecimento do percentual de honorários advocatícios e reputando-o ilícito, ao juiz é facultado comunicar o fato que reputa ilícito aos órgãos competentes para sua apuração e para a aplicação da penalidade prevista em lei (OAB para penalidade administrativa e MP para ilícito penal em tese) Isso porque, para tanto, deve-se garantir ao advogado o devido processo legal (TRF/4, AG 3788242, 03.05.2010).
Defiro, portanto, a liminar, para suspender, até ulterior deliberação, a tramitação do inquérito civil.
Intime-se.
Notifique-se.
Sinop/MT, 17 de abril de 2013.
MURILO
Juiz Federal Substituto o^ 1a Vara de Sinop
em exercício da titularidade plena na 2a Vara de Sinop
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