A justiça de Mato Grosso mandou a afastar imediatamente o secretário estadual de Saúde, Mauri Rodrigues, do cargo. A determinação é do juiz Luís Aparecido Bertolucci Júnior, titular da Vara Especializada de Ação Civil Pública e Ação Popular da Comarca de Cuiabá.
O magistrado acatou uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Estadual (MPE), onde Mauri é acusado de não cumprir várias decisões judiciais que determinava a regularização dos repasses destinados à saúde para vários municípios que estão atrasados.
De acordo com a decisão publicada no Diário Eletrônico da Justiça, desta quinta-feira (10.10), Mauri terá que se afastar do cargo até comprovar que já regularizou os repasses da saúde aos municípios do interior que estão em atraso há vários meses.
Caso descumpra a decisão e continue à frente da Secretaria Estadual de Saúde, Mauri terá que pagar multa diária no valor de R$ 20 mil a ser descontada do seu patrimônio pessoal.
O juiz cita ainda, que nos últimos dias foi distribuída uma ação civil pública por atos de improbidade administrativa contra o atual secretário Mauri pelo descumprimento de ordens liminares.
Outro Lado - O Governo do Estado informou que o procurador-geral adjunto, Nelson Pereira dos Santos, irá acompanhar o caso e deve apresentar um recurso assim que o Estado receber o comunicado oficial da decisão, o que deve ocorrer ainda nesta sexta (11.10).
Veja a decisão na íntegra:
A fim de evitar repetições desnecessárias e proporcionar visualização sistêmica do até agora processado, inicialmente reporta-se às decisões de fls. 2327/2328 e 3864/3865, cabendo, ainda, destacar os principais atos processuais ocorridos após esta.
Às fls. 3874/3879, o Ministério Público Estadual aviou recurso de embargos de declaração da decisão lançada às fls. 3864/3865, o qual foi rejeitado por meio da decisão de fl. 3884.
O Estado de Mato Grosso, mediante petição de fl. 4031, juntou aos autos vasta documentação oriunda da Secretaria de Estado de Saúde por meio da qual informou que “50% dos débitos com os Municípios, relativos ao ano de 2012 (...) foram quitados no dia 26.03.2013 (sic)” e “que o restante do débito, relativo aos meses de outubro de 2012 e novembro de 2012 será pago em parcelas previstas para os meses de outubro e novembro do corrente ano (sic)”.
O Ministério Público Estadual novamente, agora mediante petição de documentos de fls. 3885/4030, requer providências para o descumprimento da medida liminar e noticia o descaso do Estado de Mato Grosso em cumprir as decisões emanadas por este Juízo. Por fim, informa que não há mais provas a serem produzidas.
É o relato do necessário. Decido.
Por incrível que pareça, a presente Ação Civil Pública tem por objetivo compelir o Estado de Mato Grosso a cumprir sua obrigação constitucional de prestar assistência à saúde população, ou seja, obrigar o Estado que está investindo milhões de reais em um evento esportivo (Copa do Mundo de 2014) a simplesmente cumprir a Constituição Federal, no que alude à assistência e preservação da vida e da saúde de seus integrantes.
Por meio da decisão liminar de fls. 642/649, initio litis, foi constatado o descaso do Estado de Mato Grosso em efetuar o repasse dos valores devidos às Secretarias de Saúde dos municípios que integram o presente ente federativo e mediante as decisões de fls. 691/694 e 2041/2045 foram bloqueados da conta única do Estado e transferidos para os Municípios de Cuiabá e Várzea Grande o montante de R$ 24.912.359,42 (vinte e quatro milhões novecentos e doze mil trezentos e cinquenta e nove reais e quarenta e dois centavos).
Irresignado com a decisão desta Especializada, o Estado de Mato Grosso aviou recurso de Suspensão de Antecipação de Tutela, de modo que o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, sob o fundamento de que o “Estado de Mato Grosso está cumprindo o seu papel no repasse dos valores à saúde (sic)”, suspendeu a antecipação da tutela deferida neste feito, que determinou o bloqueio de valores (fls. 2434/2437).
A despeito do teor da decisão do órgão superior, nada pode ser feito por este Juízo em relação aos valores bloqueados, pois estes já haviam sido transferidos para as Secretarias de Saúde dos Municípios de Cuiabá e Várzea Grande, entretanto aquela decisão impediu que esta Especializada efetuasse novos bloqueios e transferências.
A par desses fatos, o Ministério Público Estadual continuou instruindo o feito com informações e documentos noticiando o descumprimento da medida liminar e o Estado de Mato Grosso juntando centenas de outros documentos, asseverando que a decisão liminar estava sendo cumprida.
Por meio da decisão de fls. 3864/3865, foi constado o descumprimento da medida liminar e determinou-se a intimação pessoal do Secretário Estadual de Saúde para comprovar o cumprimento da medida liminar, sob pena de afastamento do cargo e multa pessoal. As medidas extremas foram adotadas em razão de, conforme acima citado, o Tribunal de Justiça ter impedido o bloqueio da conta do Estado de Mato Grosso para sanar a desídia nos repasses.
A fim de atender essa determinação, conforme já mencionado, o Estado de Mato Grosso, por meio da petição de fl. 4031, juntou aos autos vasta documentação oriunda da Secretaria de Estado de Saúde mediante a qual informa que “50% dos débitos com os Municípios, relativos ao ano de 2012 (...) foram quitados no dia 26.03.2013 (sic)” e “que o restante do débito, relativo aos meses de outubro de 2012 e novembro de 2012 será pago em parcelas previstas para os meses de outubro e novembro do corrente ano (sic)”.
Desse contexto, está patente nos autos que, diferentemente do entendimento do Tribunal de Justiça ao deferir a suspensão da liminar, o próprio Estado de Mato Grosso assume que ainda não efetuou os repasses atinentes às Secretarias de Saúde dos Municípios de Mato Grosso do ano passado e mais, chega a confessar que os repasses dos meses de outubro e novembro de 2012 estão previstos para serem pagos neste ano!
Somados a esses acontecimentos, salienta-se que é público e notório o caos que predomina sob a área da Saúde nesta Unidade da Federação, sendo desnecessário alongar-se sobre o descompromisso dos atuais gestores sobre o assunto.
A veracidade dessa assertiva pode ser constatada nas inúmeras ações, com pedidos liminares, que desaguam diariamente nas Varas de Fazenda Pública desta Capital e nas comarcas do interior, que objetivam internações, cirurgias e medicamentos. Nesta própria Especializada existem dezenas de ações relacionadas à desídia do Estado de Mato Grosso com a saúde da população. Destaca-se, inclusive, o fato de, nos últimos dias, ter sido distribuída uma ação civil pública por atos de improbidade administrativa em face do atual Secretário Estadual de Saúde, pelo descumprimento de ordens liminares.
A Constituição Federal não oportunizou aos gestores públicos a escolha entre a saúde de sua população e a realização de obras para um evento esportivo ou mesmo de mobilidade urbana. Da mesma forma, não há opção entre o descongestionamento das principais ruas e avenidas desta Capital e o aumento de sepultamentos decorrentes do descaso com a saúde da população.
De que adiantará a população mato-grossense possuir o “meio de transporte urbano mais moderno do país”, se ao utilizá-lo para chegar a uma das Unidades de Saúde, não encontrará atendimento ou mesmo o mínimo de profissionais e medicamentos que lhe garantam a saúde e a vida.
É totalmente desarrazoado que a população que não tenha condições de arcar com um plano de saúde, custeie com a vida, a construção de “uma arena moderna” destinada ao lazer daqueles que, felizmente, não dependem do Sistema Único de Saúde gerenciado pelo Estado de Mato Grosso.
Nessa trilha, sendo injustificável o descumprimento da decisão liminar e, sobretudo, por ainda estarem pendentes de repasses valores relativos ao ano de 2012 para a saúde dos municípios mato-grossenses e, diante dos recursos utilizados para eventos (Copa do Mundo e mobilidade urbana), que são insignificantes diante da vida e saúde da população, determino:
a)- O imediato afastamento do Sr. Mauri Rodrigues de Lima do cargo de Secretário de Estado da Saúde, até que seja comprovado nos autos, de forma irrefutável, o cumprimento da medida liminar, a ser instruído, inclusive, com informações do Conselho de Secretarias de Saúde deste Estado, acerca da regularização do repasse mensal destinado à saúde dos municípios. Para o caso do Sr. Mauri Rodrigues de Lima permanecer praticando atos privativos de Secretário de Estado de Saúde, este incidirá em multa diária no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), que pesará sobre seu patrimônio pessoal;
b)- Em razão do descumprimento, até este momento, da ordem judicial, aplico, nos termos do art. 14, § 5º do Código de Processo Civil, a pena de multa no valor de vinte por cento do valor da causa, que incidirá sob o patrimônio pessoal do Sr. Mauri Rodrigues de Lima, a qual será executada nos moldes deste dispositivo legal;
c)- Intimem-se, pessoalmente, o Sr. Mauri Rodrigues de Lima, Secretário Estadual de Saúde, e o Governador do Estado de Mato Grosso, Silval Barbosa, acerca desta decisão;
d)- Nos termos do art. 398 do Código de Processo Civil, intime-se o Réu para, querendo, manifestar-se acerca dos documentos juntados às fls. 3890/4030 e os autores dos de fls. 4031/4713;
e)- A despeito do teor da certidão de fls. 3552/3553, certifique se todas as comarcas responderam ao ofício mencionado na decisão que decidiu pela conexão das ações civil públicas similares a esta neste Estado;
f)- Em razão da relevância dos fatos tratados nestes autos, insira no mandado que o Oficial de Justiça responsável pelo cumprimento deverá priorizar sua efetivação e, se necessário, com estrita observância ao disposto nos artigos 227 e seguintes do Código de Processo Civil;
g)- Após, retornem os autos conclusos.
Intimem-se e cumpra-se.
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