O deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), presidenciável que está em segundo lugar nas pesquisas de opinião para as eleições de 2018, foi condenado pela juíza Frana Elizabeth Mendes, da 26ª Vara Federal do Rio de Janeiro, a pagar 50 mil reais de indenização por danos morais coletivos a comunidades quilombolas e à população negra em geral.
O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro (MPF-RJ), responsável pela ação, havia pedido indenização de 300 mil reais. O dinheiro será revertido para o Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos. Ainda cabe recurso.
A condenação se deu por conta de comentários racistas feitos por Bolsonaro em palestra no Clube Hebraica, no Rio de Janeiro, em 3 de abril. A convite da instituição judaica, Bolsonaro foi falar sobre questões políticas e ofendeu os quilombolas.
Além de afirmar que quilombolas e indígenas atrapalham a economia, o deputado disse que visitou um quilombo e que constatou que o "afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas". "Eu fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Não fazem nada! Eu acho que nem pra procriador ele serve mais", disse.
Na decisão, a juíza considerou que as declarações de Bolsonaro não estavam protegidas pela imunidade parlamentar. "A aludida prerrogativa de imunidade parlamentar não se estende a palavras, nem a manifestações do congressista, que se revelem estranhas ao exercício do mandato legislativo e que, além disso, ofendam, ridicularizem ou constranjam pessoas, grupos ou comunidades, como se verificou nas manifestações proferidas pelo réu, não só contra os grupos quilombolas, mas a outros, os quais, no entanto, não foram objeto de discussão nestes autos", afirmou a magistrada na sentença.
Frana Elizabeth Mendes acrescentou que Bolsonaro deveria "assumir uma postura mais respeitosa". "O réu não expôs simplesmente que discorda da política pública que prevê gastos com o aludido grupo, mas inegavelmente proferiu palavras ofensivas e desrespeitosas, passíveis de causar danos morais coletivos", escreveu a juíza. "Impende ressaltar que, como parlamentar, membro do Poder Legislativo, e sendo uma pessoa de altíssimo conhecimento público em âmbito nacional, o réu tem o dever de assumir uma postura mais respeitosa com relação aos cidadãos e grupos que representa, ou seja, a todos, haja vista que suas atitudes influenciam pessoas, podendo incitar reações exageradas e prejudiciais à coletividade", acrescentou.
Na sequência, a magistrada fez uma crítica ao comportamento dos políticos. "Ao alcançarem a tal almejada eleição ou nomeação, deveriam agir como representantes de Poder, albergando os anseios gerais da coletividade e, mesmo que suas escolhas pessoais recaiam em interpretações mais restritivas ou específicas, jamais devem agir de modo ofensivo, desrespeitoso ou, sequer, jocoso", afirmou. "Política não é piada, não é brincadeira. Deve ser tratada e conduzida de forma séria e respeitosa por qualquer exercente de Poder", afirmou.
Diante disso, decidiu a juíza, ficou evidente a "total inadequação da postura e conduta praticada" por Bolsonaro, que é "usual" e "ataca toda a coletividade e não só o grupo dos quilombolas e população negra em geral", o que a fez determinar que indenização deve ser revertida em favor do Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos.
No dia 6 de abril, integrantes do movimento negro, quilombolas e deputados federais protocolaram na na Procuradoria-Geral da República (PGR) representação contra Bolsonaro por "prática de racismo e violação da dignidade indígena e quilombola". Em entrevista coletiva, a deputada Benedita da Silva (PT-RJ), uma das signatárias do documento, ressaltou que o deputado do PSC utilizou a expressão "arroba", atualmente aplicada para a pesagem de gado e outros animais. Durante a escravatura, era também utilizada para negros e negras escravizados.
Em 10 de abril, os procuradores da República no Rio de Janeiro Ana Padilha e Renato Machado ajuizaram ação civil pública contra o deputado por danos morais coletivos. “Com base nas humilhantes ofensas, é evidente que não podemos entender que o réu está acobertado pela liberdade de expressão, quando claramente ultrapassa qualquer limite constitucional, ofendendo a honra, a imagem e a dignidade das pessoas citadas, com base em atitudes inquestionavelmente preconceituosas e discriminatórias, consubstanciadas nas afirmações proferidas pelo réu na ocasião em comento”, afirmavam os procuradores na ação.
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