por Luiz Henrique Lima*
Às vezes, a renúncia à presidência é a inevitável consequência de uma crise. Às vezes, a renúncia à presidência é desejável e é a melhor solução para uma crise.
Às vezes, a renúncia à presidência não é um ato covarde ou uma confissão, mas um gesto de desprendimento e que revela grandeza d’alma.
Não é preciso ser culpado ou condenado para renunciar à presidência. Basta ser o principal responsável por uma organização abalada por denúncias e/ou ameaçada de prejuízos crescentes.
Renunciar, muitas vezes, não significa fugir, mas assumir responsabilidades. Renunciar, muitas vezes, não significa abandonar aqueles que lhe confiaram a liderança, mas, ao contrário, por eles demonstrar respeito e compaixão.
Renunciar muitas vezes não significa admitir uma derrota individual, mas abrir caminho para um recomeço coletivo.
Como demonstrou recentemente o primeiro-ministro da Grécia, renunciar à chefia do governo não significou renunciar ao seu passado, às suas conquistas e às suas convicções.
Também não significou renunciar ao futuro, descartando a possibilidade de novos desafios ou realizações.
Significou, apenas, que o líder democrático teve a lucidez de reconhecer que naquele momento a sua renúncia era a melhor alternativa possível para a crise governamental.
A essa altura, o leitor mais atento percebeu que não estou me referindo a hipóteses teóricas, mas a um caso específico e bastante atual. Com efeito, estou tratando da renúncia de Martin Winterkorn à presidência mundial da Volkswagen, anunciada quarta-feira.
Em breve síntese, a agência ambiental estadunidense acusou a multinacional alemã de utilizar um software que fraudava os resultados da emissão de gazes poluentes pelos veículos a diesel de sua fabricação.
A denúncia abalou a credibilidade da empresa perante seus consumidores e a opinião pública. O valor de suas ações caiu mais de 20%.
Em menos de uma semana, a Volkswagen admitiu o erro, divulgou informações mais completas sobre a dimensão do problema e o seu presidente comunicou que renunciava ao cargo.
No dia seguinte, as ações da empresa recuperaram 6% do seu valor.Extraem-se duas lições importantes desse episódio.
Primeira: a Volkswagen agiu com transparência e rapidez para evitar que a crise atingisse uma dimensão maior, ameaçando o futuro da empresa.
Exatamente o contrário do que fez no Brasil a Petrobras, que até hoje paga advogados para defender seus ex-dirigentes nos processos em que o TCU apura prejuízos bilionários em operações suspeitas. Negar a realidade e postergar o inevitável é a pior forma de tratar uma crise.
Segunda: a credibilidade é um ativo imaterial e intangível valiosíssimo para qualquer organização ou liderança na sociedade contemporânea.
A reputação de mentirosa ou fraudadora é mortal para a governabilidade e continuidade de suas atividades.
Quando pilhada num erro, melhor admitir a falha, pedir desculpas e deixar bem claro que o fato não se repetirá, mesmo que isso signifique sacrificar seu melhor executivo. Maquiagens e tergiversações não recuperam a confiança perdida.
A renúncia é sempre traumática e provoca sofrimento em quem renuncia e nos seus próximos que o consideram injustiçado, mas, às vezes, não renunciar pode ser um trauma muito maior e produzir sofrimento a muitos outros completamente inocentes e indefesos, o que seria de fato uma grande injustiça.
A renúncia à presidência de Martin Winterkorn deveria servir de exemplo a tantos outros dirigentes de organizações envolvidas em denúncias bilionárias e crises prolongadas, e cuja permanência no cargo é incompatível com a adoção de soluções que preservem ou recuperem a sua missão institucional e os seus interesses estratégicos.
Um exemplo? Joseph Blatter que renunciou ‘de mentirinha‘ à presidência da FIFA.
Outro caso? Marco Polo del Nero que pelo bem do futebol brasileiro deveria renunciar à presidência da CBF.
Mais um? Executivos presos sob gravíssimas acusações de corrupção e outros crimes que para salvá-las deveriam renunciar à presidência de suas empresas.
*Luiz Henrique Lima é conselheiro substituto do Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT)
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